XXI - Flecha flamejante

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— Não, longe de ser — Yashiro respondeu, afrouxando seu abraço no amigo. — Mitsuba provavelmente teria um ataque se, algum dia, tomasse uma forma que ele não considerasse bonita.

Eles dois se entreolharam, com meios sorrisos. Kou sabia que era Mitsuba. E ela também.

— Você sabe o que tem que fazer, não sabe? — Ela o auxiliou, até que o Minamoto conseguisse ficar de pé sozinho.

— Claro — Ele a observou e sorriu. — Minha amiga me ensinou.

Nene retribuiu o sorriso, orgulhosa. Kou era alguém adorável, mesmo que desgastado após uma purificação brutal. Por que?

Ele faria qualquer coisa pelo seu tão amado Sousuke.

— Sabia que você apareceria mais cedo ou mais tarde, Mitsuba — Kou caminhou lentamente, em passos curtos. Tanto pela dor que sentia quanto pela criatura à sua frente. Se fizesse algum movimento brusco, o corpo pegajoso atacaria com violência e ele não teria como proteger a si mesmo. — Ele fez isso com você, não é?

Os tentáculos começaram a se mover, inquietos com a aproximação e menção desagradáveis.

— Não cheguei a tempo, me perdoe — Seus olhos azuis foram de encontro ao grande olho rosado, localizado no centro do corpo. — Eu deveria tê-lo salvo antes.

Uma pequena boca se abriu em um lugar que Kou não soube identificar. Nada dizia, soltava apenas murmúrios de dor.

— Foi ruim demais? Me perdoe, Mitsuba! — Seus olhos já estavam úmidos. O peso da culpa em suas costas parecia querer esmagá-lo mais que nunca. — Jamais desejei que sofresse dessa forma! Sou seu sacerdote, não sou? Eu deveria te proteger!

Quando escutou isso, Yashiro apertou o punho em seu peito descompassado e seu olhar vacilou para Hanako, que estava no mesmo lugar. Não se movera e o conflito interno parecia tão grande que ele sequer piscara alguma vez.

"Sou seu sacerdote, não sou? Eu deveria te proteger!"

Sim, ela deveria proteger Hanako. Ela era sua sacerdotisa.

Seu coração deu uma batida angustiada. Queria estar com ele, encontrá-lo naquele momento, abraçá-lo e ajudá-lo a se sentir melhor.

Queria salvá-lo.

"Alguém tão egocêntrica como você não pode tratá-lo como um de seus bonecos, que você brinca de curar e tudo dá certo no fim, como num perfeito conto de fadas"

Uma lágrima quente desceu por sua bochecha.

Sim, Nene estava sendo egocêntrica. Desde que salvou Sumire, se sentia capaz de qualquer feito, incluindo salvar Hanako. Mas aquilo não era uma brincadeira e ela não podia lidar daquela forma.

Hanako não era um troféu.

Se ajoelhou e fixou os olhos nele, sem conseguir parar de chorar.

Hanako era o homem por quem estava apaixonada. Era seu confidente; Sua melhor companhia. Era quem agitava seu coração, assim como tinha o talento de acalentá-lo. Hanako lhe fazia sentir-se…

Fazia sentir-se…

Amada?

Retirou seu olhar de Hanako e pousou os olhos em Kou. Naquele momento, Kou acariciava a bochecha da cabeça de Mitsuba, que estava fixada naquela criatura. Agora, Mitsuba estava de olhos abertos; os que advinham do emaranhado de carne, fechados.

Kou a observou, sorriu e gesticulou um "Obrigado", que ela entendeu muito bem.

Nene assentiu, descendo a torre com pressa.

Hanako estava lá.

Suas pernas faziam um trabalho árduo, enquanto ela tentava chegar o mais rápido possível até ele. Passava pelas pessoas paralisadas, que estavam  translúcidas como água. O poder de Akane era realmente assustador.

Mas, havia um detalhe que não cogitou pensar: como chegaria até lá? Eles estavam flutuando!

Poderia ela flutuar também?

A ideia a animou e ela procurou um prédio próximo da praia. Mitsuba e Kou pareciam ter se entendido, de alguma forma. Não havia nada com que se preocupar, certo?

Subiu até o terraço, sentindo um arrepio percorrer-lhe o corpo.

Se Kou conseguia saltar, ela também conseguiria!

Aquela ideia era absurda.

Ao abrir a porta do terraço, uma ventania forte soprou seus cabelos. Nene pôs um braço em sua fronte, procurando proteger seus olhos das fagulhas de poeira que acompanhavam-na.

Caminhou em passos firmes até a grade, pulando-a. A altura fez sua cabeça girar momentaneamente, mas ela preferiu ignorar e continuar.

Seus pés se encaixaram perfeitamente no pequeno espaço entre a grade e uma consequente morte por queda. Aquele prédio era bem, bem alto.

Observou o profundo horizonte, onde a noite era impedida de avançar. As nuvens não se moviam, nem mesmo os insetos ousavam cantar sua fúnebre sinfonia do entardecer.

Os cabelos platinados de Yashiro esvoaçavam, apoiados pela brisa melancólica daquele momento crucial. E ela estava muito concentrada em seu objetivo para perceber mais.

— Vai pular?

De sobressalto, Yashiro grudou seu corpo na grade que segurava. Não havia percebido outra presença ali.

Encaminhou seus olhos à dona da voz serena e seu coração palpitou quando a imagem captada por eles foi a de uma mulher de cabelos esverdeados: a bonita moça do elevador.

— Te falta coragem? — Seu tom de voz era grave e sombrio; seus olhos fixos no horizonte. Vazios.

Nene engoliu em seco quando viu um arco flamejante, fabricado com energia espiritual, surgir nas mãos dela.

— Pule — Ela sussurrou.

Yashiro apertou firmemente a grade e a viu erguer o arco. Seus braços pálidos tinham dezenas de cicatrizes de pequenos e profundos cortes. Ela tinha uma aura tóxica.

— O que planeja? — Balbuciou, sem conseguir tirar os olhos da pele pálida alheia, marcada por um sofrimento angustiante.

— Me libertar.

Nene observou a direção a qual o arco apontava e seus olhos arregalaram, em choque.

A flecha flamejante tinha Hanako como alvo.

𝑂 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑟𝑎𝑡𝑜 - Hananene fanficOnde histórias criam vida. Descubra agora