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- Eu tive um sonho, hã, ruim.

- Que tipo de sonho?

- É… Eu fazia… algo que não deveria fazer, nunca.

Do outro lado da mesa de mogno que reluz com uma camara impecável de verniz avermelhado,  o Padre o encara impassível. Espera que ele prossiga, mas é respeitoso ao demonstrar paciência ante a longa pausa que se segue.

-  Basicamente, nele eu fiz algo que vai contra a castidade - diz finalmente.

O homem faz que sim com a cabeça, mas a boca permanece fechada, em silêncio.

Harry se vê acrescentando: - Só que essa não é a pior parte.

- Qual é a pior parte, filho?

Por nunca ter sido chamado de filho por ele, 9 jovem meio que se desconcerta. Um frio encolhe o fundo do seu estômago.

- Bem… eu fiz algo muito, muito imoral.

Imagine só, a última coisa que ele quer é detalhar a sordidez que cerceou o sonho.

Nenhuma palavra se forma em sua mente, em sua boca.

Mas o Reverendo o encoraja a se explicar melhor.

- Que imoralidade tão ruim foi essa?

- Eu, é…

Parece que de repente Harry caiu numa plantação de urtigas. Seu corpo inteiro formiga, principalmente rosto e pescoço. Seus dedos esfregam o joelho tímida e nervosamente, coçando acima do hábito negro.

- Desculpa - pede num fio de voz - É que… o que aconteceu foi tão vergonhoso que não consigo nem verbalizar. Precisava me livrar desse farto logo, mas tive que juntar dias de coragem pra vir aqui.

O Líder concorda com a cabeça e murmura que o compreende. 

Aparentemente aceita que Harry não revelará o que aconteceu afinal. Mas ainda não dá o assunto por encerrado. Há mais perguntas a se fazer.

- Já teve sonhos desse tipo outras vezes? - Harry nega - Alguma vez antes você já se sentiu tentado a fazer o que fez nesse sonho?

Harry morde a parte interna da bochecha e as batidas do coração entraram em descompasso. Mal respira. Fita o rosto sardento do Orientador com os olhos brilhando de preocupação.

Sua resposta é um tímido manejo de cabeça.

Diante do seu desconforto, o homem tenta tranquilizá-lo. 

- Acho que não preciso dizer que não estou aqui cumprindo ordens da Justiça dos homens, então nada do que você disser vai ser usado contra você. 

Ele está sendo o intermediário para a Justica de Deus, diz. Irá absolvê-lo de qualquer que seja seu pecado, sem julgá-lo, sem menosprezá-lo pu subjulgá-lo por isso. 

- Entendo que pode ser difícil confiar em mim, pois sou o Orientador que você conhece a pouco tempo, mas você precisa. E não há nada o que temer, eu prometo. Só quero, ou melhor, preciso saber o que aconteceu pra te dar uma penitência justa. Entende isso?

- Sim, entendo.

O homem suspira - como se estivesse aliviado - e os cantos de boca fina se elevam num pequeno sorriso.

- Tenho que perguntar algo e preciso que me responda com sinceridade. Você, alguma vez, já praticou o que fez no sonho? Ou pretende fazê-lo?

A pergunta automaticamente leva Harry de volta para uma das últimas confissões que teve com Padre Julian. Trás de volta as mesmas sensações e emoções. A vergonha febrilmente gélida. A garganta se fechando, ficando tão apertada que torna-se incapaz de aceitar água ou oxigênio. O olhar recaído no próprio colo. Dedos agitados desejando ultrapassar a proteção da vestimenta para enterrar as unhas na pele e aliviar a coceira.

immaculate sin of the lovers • L.S.Where stories live. Discover now