vīgintī

107 20 7
                                    

Louis tenta ser delicado. Tenta levantar a questão da maneira mais natural possível. Mas as tentativas terminam em fracasso.

Não é inteiramente culpa sua. Pois no instante em que Harry vislumbra a aproximação do assunto ainda não discutido, ele trata de espantá-lo. Sem perder tempo. No minuto seguinte a conversa já se encaminhou para uma direção mais segura. Ele se adianta em preencher todas as brancuras de silêncios com a primeira trivialidade colorida que lhe pinta à mente.

Seu rosto evita, a árduos custos, o desconcertante olhar inquisitor de Louis quando o tema da conversa volta a orbitar em torno de si.

São esses os mecanismos que impossibilitam Louis de conseguir qualquer pista dos eventos de seu passado recente.

Ainda assim, não é o bastante.

Louis não desiste tão facilmente.

– Estou sendo um pé-no-saco, é verdade, mas eu não consigo simplesmente ignorar esse assunto, Harry - seu tom é manso, suave como veludo - Juro que tentei, mas não consigo. Deve parecer que tô só curioso, mas é mais que isso. Não sei explicar, mas sinto que preciso entender o que rolou contigo pra voltar a respirar bem novamente.

Ele prossegue, paciente e didático: – Primeiro perdemos a sra Dahlia, e logo em seguida é você quem evapora num piscar de olhos... Por que saiu daquele jeito? Tipo, foi um impulso repentino que você não conseguiu evitar e, quando se deu conta, já estava em casa? Ou foi premeditado? Você planejou sair? Já sabia que iria fazer isso na noite anterior.

Embora fosse evidente que Louis tem mais coisas a dizer, ele aguarda que Harry se pronuncie.

Se responder que sim. Harry estará admitindo que o enganou propositalmente. Pois na noite anterior à fuga havia prometido que contaria ao amigo o que havia de errado consigo.

- Foi um impulso - é a resposta que parece não exigir maiores explicações.

– Certo... Então por que não voltou? Com certeza o Diretor teria entendido.

Ele dá de ombros.

- Não dava, Louis. Seria constrangedor demais, não acha?!

Pelo canto de olho, Harry vê o amigo assentir e observar a rua por detrás do vidro diante deles. O sol caramelizado, ainda alto a oeste, se derrama em seu rosto formoso e peito magro.

Louis é uma presença que entra em sintonia com o clima de julho, emanando um frescor só dele. Frescor esse que não esmaece aos sopros gélidos que deixa escapar de vez em quando. Como agora, com esse assunto.

– Terminou? - indaga Harry, referindo ao copo de papel em sua mão. Louis concorda e Harry toma para si.

Despreocupadamente, Harry tira a tampa do seu copo no suporte entre eles e coloca o de Louis dentro dele. Tira a tampa do outro também. Os canudinhos são entrelaçados por diversos nós, ficando tão contorcidos a ponto que calharem inteiros dentro do recipiente. No fim, ele devolve as duas tampas ao devido lugar, uma sobre a outra.

Enquanto isso, o amigo divaga:

– Porque se foi planejado, algo tinha de estar acontecendo, não é? E se estava, deveria ser grave. Mas poderia ter sido também só uma percepção que se tornou clara com o tempo, não é? Aquela não era a vida que queria levar? Você ficou receoso com a formação? Preocupado? Com medo de não dar conta? Você teria desabafado com alguém se esse fosse o caso, huh?

Harry assente.

Se esse fosse o caso, sim.

– Pois é. Se esse fosse o caso, você teria procurado a ajuda do Diretor - conclui ele, nem um pouco convicto.

immaculate sin of the lovers • L.S.Where stories live. Discover now