Capítulo 29

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Capítulo 29

“But I'm only human
And I bleed when I fall down”

– Human, Christina Perri


Quando ele saiu pela aquela porta com a chave da mão, foi como se tivesse perdido parte de mim, como se me arrancassem a sangue frio o coração e o atirassem a leões. Eu não mereço isto, posso ter sido uma rapariga rebelde na adolescência, e nem sempre ter tomado as decisões mais corretas, mas nada do que fiz merece o castigo que estou a ter. Descobri que existem criaturas para além do ser humano, criaturas más que nos fazem ter pensamentos e sentimentos horríveis, mas com um aspeto angelical e perfeito. O seu exterior é o contraste do seu interior, os seus olhos exprimem dor, o seu rosto exprime indiferença, o seu toque é delicado, as suas palavras são bruscas. Perdi a minha mãe num incêndio, durante todo este tempo sempre desviei os meus pensamentos e memórias, mas agora que estou a sofrer, a minha mente faz questão de me colocar pior, fazendo-me sentir mais miserável. Lembro-me como se fosse ontem, eu e ela, estávamos a fazer as “pazes” após mais uma discussão entre mãe e filha, finalmente tinha recuperado de todos os problemas que tive na adolescência por causa do Damon.

Damon.

Nunca mais ouvi falar desse imbecil, felizmente. Eu era louca por ele, tudo o que ele fizesse era bonito para mim, tudo o que ele dissesse era como música para os meus ouvidos. Eramos felizes no começo, até ele me ter levado a conhecer os seus “amigos” e aí, a história mudou de rumo. Começaram os vícios, os ciúmes, as promessas… ele errava, eu errava, eu perdoava, ele não. Deitava-me abaixo sempre que tinha oportunidade de o fazer. As minhas amigas na altura, diziam-me “Lia, abre os olhos! Nem pareces tu! Ele está a mudar-te!” eu negava sempre, afirmando que estava igual, mas lá no fundo sabia que não o estava, só que não queria admitir isso. A coisa piorou quando descobri que ele me andava a trair com uma das miúdas do nosso grupo. Fiquei tão magoada, e quando o enfrentei foi pior. Ele bateu-me, não me deixou ir, eu queria acabar com a nossa relação mas ele não deixou e ameaçou-me. Fiquei com tanto medo dele, mas tanto. A partir desse dia, tudo mudou, perdi todos os meus amigos, ele não me deixava falar com eles, baixei as notas, ele obrigava-me a ir com ele e com os amigos às festas, e tinha que andar sempre com roupa que me tapasse o corpo, para que ninguém pudesse ver as marcas que ele lá deixava.

Estava farta, dele, das suas atitudes, de mim, de todos. Tomei a decisão que isto tinha que acabar, eu não podia deixá-lo fazer isto à minha vida, ele estava a destruir tudo em minha volta e eu de braços cruzados sem poder fazer nada. Pedi à minha mãe para me escrever em aulas de boxe e depois no Karaté, usando a desculpa que tinha que começar a fazer algum desporto. Aprendi a lutar, a defender-me, a exprimir a raiva, a sentir-me bem comigo mesma. Era a única rapariga a frequentar as aulas, no início foi estranho, mas logo me integrei com todos, eramos uma família.

Uma tarde, o Damon ia levar-me a uma festa na cidade vizinha, mas eu disse que não ia. Ao princípio ele riu-se na minha cara, gozou-me, e eu continuei com a minha expressão séria, sem demonstrar medo e insegurança. Certa altura ele irritou-se e quando estava prestes a tentar tocar-me, eu desviei-me. Rapidamente seguiu-me e eu ataquei-o. Ainda me lembro do seu rosto cheio de sangue, do olho negro e dos cortes, eu fui dura, queria que ele sentisse na pele o que eu sentia de cada vez que ele me batia. Foi ai que tudo parou, tornei-me tão fria, tão distante, longe de tudo e de todos. Era eu contra o mundo, e nesse dia, jurei que nunca mais iria deixar que um rapaz me magoasse. Mal sabia eu que anos mais tarde iria encontrar o Harry, e a dor que sinto agora, é mil vezes maior à dor que senti com o Damon.

Choro por causa da dor que sinto, do sofrimento que ele me causou, dos momentos que tivemos, das discussões. Choro por ele. Encontro-me fria como este inverno. Antes, era eu contra o mundo, agora, é o mundo contra mim. Nunca o vou perdoar, nunca mais o quero ver, nem sequer quero ouvir o seu nome. Ele que vá e não volte nunca mais, que fique com a chave e que faça o que quiser dela, porque eu vou seguir com a minha vida. Já estou assim há duas semanas, aqui trancada, cheia de memórias e sempre a chorar.

The Key ||h.s||Kde žijí příběhy. Začni objevovat