Capítulo 19

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Jogou água fria no rosto e tentou secá-lo sem desfazer a maquiagem. Era o pior dia de sua vida. O pequeno esforço para melhorar os benefícios dos funcionários explodira no rosto dela.

Era preciso se concentrar para restabelecer a pul­sação e poder raciocinar.

Saiu do banheiro com o plano de admitir humil­demente que errara, apelando para o senso de jus­tiça dele deixar os eventos da noite anterior fora de questão.

Ao se aproximar da porta do escritório, ela ouviu risadas. Com uma pontada de ciúme, viu que eram os gerentes reunidos em frente ao elevador fazen­do brincadeiras com Sam. Todos comemoravam o brilho no sorriso dele. Mesmo Fletcher parecia ter sido atraído para o grupo.

Jamais se sentira tão excluída. Faria qualquer coisa para obter de Sam um sorriso como aquele de novo.

Ele a viu e seu rosto ficou inexpressivo.

— Aí está você. Entre aqui. Precisamos conversar.

Ela o acompanhou, trêmula. Parte queria se hu­milhar, beijar os pés dele pedindo perdão. Outra parte dela sabia que era um erro admitir que ele ti­nha vantagem.

Ele parou no meio da sala e a encarou. Estava bem próximo dela, mas parecia haver um abismo entre eles. Infelizmente o corpo dela não entendia o que a mente sabia, e formigou de desejo.

— Precisamos esclarecer algumas coisas. Você toma pílula?

Ela empalideceu.

— O quê?

— Vai fazer o papel de donzela inocente.

Ela se encolheu como se tivesse levado um tapa.

— Deixe-me lembrá-la, Eleanor, de que fizemos sexo sem proteção na noite de ontem. Acho difí­cil acreditar que uma mulher não esteja ciente dos riscos.

A sensibilidade dela foi atacada, mas a honra fe­minina exigia que se defendesse.

— Riscos de doenças, é o que quer dizer? Sim, estou ciente, e pretendo fazer exames na primeira oportunidade.

Ele contraiu um músculo do maxilar e ela soube que acertara.

— Devo entender então que você usa contraceptivo? Considerando a discussão que você empreen­deu, pareceu razoável supor quando saiu daquele jeito que... temia estar grávida.

Ela deu um sorriso frio.

— Não temo nada. Não há necessidade de se preocupar.

Era verdade. Uma gravidez era provavelmente a única coisa no mundo com a qual não se preocu­pava. Parará a pílula há dois meses, mas a chance de conceber era infinitesimal. Provavelmente ine­xistente.

Posso garantir que você não tem com que se Preocupar.

Provocado, Sam sentiu as mãos formigarem. Percebeu o brilho da incerteza nos olhos dela e apertou as mãos ao longo do corpo. Era proibido tocá-la.

— Minha única preocupação é com sua saúde e seu bem-estar. Queria assegurar a você que, se algo acontecesse, seria bem-cuidada.

Ellie imaginou quem cuidaria. Ele a acompanha­ria ou mandaria o motorista ou a empregada?

— Posso imaginar — disse ela com ironia.

— Posso imaginar o tipo de homem com quem se envolveu no passado para ter uma visão tão ruim deles.

Queria cobrir o rosto para se proteger dos insul­tos. Em vez disso, se afastou.

— Era tudo que queria dizer?

— Foi só o começo. Gostaria de lembrá-la de que não manda neste banco. Mais ainda, que aqui não é um local de testes para pautas femininas. O que seus chefes anteriores toleraram para poder ter o prazer de olhar para você diariamente não será tolerado aqui.

Ela engasgou com o insulto, mas esse era o tipo de briga com a qual sabia lidar. A adrenalina dela disparou e a coragem também.

— É claro que sei que você manda. Posso explicar o que houve, Sam. Eu sabia que você queria achar um assunto para conseguir a simpatia dos gerentes. A idéia da creche parecia ideal por ser controversa ao pensamento antiquado deles, mas sem ameaçar ninguém pessoalmente. Eu tinha a intenção de falar sobre isso com você ontem, mas com tudo o que aconteceu... — Sua voz ficou rouca quando a lembrança involuntária do ocorrido no estacionamento quase destruiu a confiança dela. — Lamento, mas não me lembrei.

Ela baixou os olhos e fez um gesto conciliatório.

— Talvez esteja certo. A idéia é ousada demais para os padrões deste banco.

Foi um golpe sutil, e ela prosseguiu com um olhar apelativo.

— Você disse que gostava de secretárias com ini­ciativa. Devo ter entendido errado o que você quis dizer.

Os olhos dele pareciam gelo.

— Essa não é a questão. Estamos falando sobre quebra de confiança, não é, Eleanor?

O sangue subiu ao rosto dela.

— E há a questão do vestido. Desde quando você sente a necessidade de vir trabalhar vestida com ta­manha vulgaridade?

Ela arfou, mas ele prosseguiu impiedosamente.

— Posso não saber tudo sobre moda, mas é óbvio que esse vestido não é apropriado para o ambiente de trabalho. Por que não está de terno?

— Meu terno está no Porsche. Ele fez silêncio.

— No Porsche. — O espaço entre eles ferveu. Ela teve visões do sexo desesperado com sabor de mares ia.

Os olhos dele se encheram de sombras, então se afastou.

— Seria um erro tentar tirar proveito do que aconteceu entre nós. Não quero uma secretária que anuncia seus atributos. Espero que minha secretária seja um exemplo de modéstia e elegância para o resto da equipe.

Ela ficou indignada. O belo vestido era modesto e elegante. Pensou no rombo em suas economias, em todas as privações que passaria, na espera, no sacrifício, e se rebelou.

—Este é um vestido caro com assinatura de uma estilista australiana famosa. É uma obra de arte. Tem até nome.

Ele se virou com um olhar irônico.

— É mesmo? Que nome é esse?

A pressão dela disparou, mas falou com tranqüi­lidade.

— Chama-se Flirty Noir.

— Perdoe-me. Uma prostituta francesa.

A ironiadele a magoou.

***    

Sonhos de Uma NoiteWhere stories live. Discover now