PNF - Capítulo 11

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[Miguel Sobral - São Paulo, 1998]

Eu fui impedido de ir ao colégio durante a semana que passou.

Em outras ocasiões eu acharia isso legal, me livraria de acordar cedo, das aulas chatas e podia dormir até mais tarde, mas não agora, e não junto com o que eu estava passando. Tudo tinha se transformado em uma grande confusão desde daquele dia, e depois disso, as coisas não ficaram nada boas. Eu mal podia sair do quarto pra fazer nada que não fosse beber água e comer, e quando saía, era supervisionado pelos meus pais a cada passo que eu dava. Como se eu fosse fugir, ligar pra alguém ou algo do tipo. Até mesmo a dona Lurdes foi colocada na jogada, sendo mandada de meia em meia hora pro meu quarto pra ver se estava tudo ok. Eu não poderia culpá-la, afinal, ela só estava fazendo seu trabalho e ainda me ajudava muito quando eles não estavam por perto.

Meu corpo inteiro doía e eu sabia que tinha uma marca horrível no meu rosto daquela noite, disso eu não consegui escapar, mas nada, nada, doía mais que ser mantido como um prisioneiro que fez algo muito grave. Eu tentei, juro que tentei conversar com meus pais nesses dias que se passaram, eu explicaria, contaria como tudo aconteceu e até inventaria algo se fosse necessário pra me livrar daquele castigo, mas eles nem ao menos quiseram me ouvir. Eu não sabia o que seria daqui pra frente, mas algo me dizia que as coisas só tendiam a piorar.

A porta do meu quarto fui se abrindo de repente, me fazendo parar com os pensamentos – já que a única coisa que eu fazia nos últimos dias era pensar – e eu vi a dona Lurdes entrar com um prato e eu copo de suco na mão.

—Trouxe algo pra você comer. – Anunciou lançando um sorriso e deixando tudo em cima da mesinha.

—Obrigado, mas não tô com fome.

—Você tem que comer, filho.

Sua voz era repreensiva e não deixava margens pra que eu recusasse, o problema é que minha garganta estava fechada e eu sabia que nada passaria por ali. Observei ela se sentar ali do meu lado na cama e me olhar com os olhos doces, a expressão cansada, porém sempre sorridente. Me chamou abrindo os braços e bateu na sua própria perna numa atitude convidativa, deslizei até lá sem pensar duas vezes e deitei minha cabeça no seu colo pra depois receber seus carinhos no meu cabelo. Com isso, eu não pude evitar que lágrimas escorressem pelos meus olhos.

—O que eles vão fazer comigo? A senhora não ouviu nada? – Choraminguei.

—Não muita coisa. Eles estão bem reservados esses dias. – Sua voz era suave – Mas aconteceram varias ligações pra sua tia Maria, até mais que o normal, eu estranhei.

Levantei a cabeça para encará-la, estranhando esse fato.

—Será que ela tá querendo voltar pro Brasil?

—Não sei, Miguel. Tomara que sim, né, ela gostava tanto de você. E você e seus primos se davam tão bem quando crianças...

Sorri ao me relembrar disso, mas devido à atual situação, se eles voltassem não ia fazer a menor diferença, já que aparentemente eu estava destinado a ficar naquele quarto pra sempre.

—Dona Lurdes... Além da minha tia, mas alguém li...ligou? Sei lá.

Indaguei com curiosidade, mas tentando disfarçar minha curiosidade súbita com aquele assunto. Eu não sabia o que esperava com aquela pergunta, muito menos com a resposta que receberia, mas simplesmente saiu.

—Sua amiga ligou. – Esclareceu.

—Só ela?

Tentei não colocar um tom de muita expectativa na voz e não me deixei decepcionar com a primeira resposta. Foi só uma semana. Talvez ele não esteja mesmo ligando muito pro meu sumiço a ponto de ligar ou vir atrás, talvez só eu tenha sentido saudades dele.

Por Nossos FilhosWhere stories live. Discover now