PNF - Capítulo 45

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[Rodrigo Aguilar Sobral]

—Is it my imagination?

—Is it something that I'm taking?

—All the smiles that I'm faking...

Paramos por uns segundos, todos nós olhando para o Miguel a espera da sua parte, mas claro, aquele estraga prazer não continuou.

—Eu não conheço essa música.

Deu de ombros despreocupadamente, parecendo nem se importar que mais de 40% dos divórcios acontecem justamente porque um não canta as músicas que o outro gosta. Absurdo!

—Como que alguém não conhece as músicas do reizinho de Doncaster? –Tentei entender, e eu juro que ia fazer um esforço, antes de sair correndo atrás dele com uma vassoura na mão.

—Eu só não ligo muito pra isso.

Um monstro desse merece perdão?

—Misericórdia. Você ouve o que fala?

Dramatizei, recebendo duas risadas divertidas que compreenderam meu estado de espírito, e uma risada mais contida, junto a um revirar de olhos, que me conheciam bem o suficiente para estar acostumado com aquilo. Era uma manhã tranquila, apesar de ter uma réplica de um senhor de 95 anos com a aposentadoria atrasada na minha frente reclamando de tudo - e que eu chamava de marido – testando minha paciência e carisma desde cedo.

Acordamos com a Bisteca arranhando a porta pedindo pra sair porque a natureza a chamava e desde então não conseguimos dormir mais, o que foi bom, pois já estava mesma na hora de levantar. Encontramos a Clara e o meu filho conversando na sala, com uma desculpa esfarrapada de que tinham acabado de chegar – eu finjo que acredito e eles fingem que eu fingi que acreditei – e agora preparávamos e tomávamos o café juntos.

—Da próxima vez vamos cantar algo que ele saiba. – Yuri propôs, rindo e roubando as frutas cortadas da minha tigela. Dei um tapa na mão dele e acrescentei mais mel e aveia.

—A gente pode até pegar alguma musica da playlist dele pra não ter desculpa.

—Peraí... como você sabe da minha playlist? – Nesse momento ele parou com a sua xicara de café na bancada e olhou pra filha.

—Todo mundo sabe, pai, tá no Spotify.

—Tão bonitinho como ela fala 'Spotify'.

Intervi, provavelmente sorrindo mais que o Coringa, e tirando uma com a cara do Miguel que ainda mantinha uma expressão de choque. Será que ele tinha uma playlist de sexo e não queria que ninguém soubesse... ok, isso me deu ideias pra mais tarde, rs.

Comemos assim, entre uma zoação e outra, musicas inacabadas porque sempre tinha uma parte que não sabia como continuar e risadas altas e verdadeiras, nem parecia que era relativamente cedo pra toda aquela felicidade.

Eu teria que ir para o restaurante somente mais tarde – porque sim, pobre não pode sonhar por muito tempo e logo tem que voltar a rotina – e o Miguel parecia também não ter nenhum ensaio agendado pelo resto do dia, por isso ficamos mais relaxados.

Relaxamento esse que não durou muito tempo, já que, entre uma conversa animada e outra, nós ouvimos o barulho do portão lá na frente se abrir e logo depois de alguns segundos, aparecer a última pessoa que eu esperava ali naquele momento.

Ah pronto!

—Oi mãe. – Tenta não mostrar muito o desespero e descontentamento, Rodrigo. – O que faz aqui?

—Estava dando uma passadinha e resolvi parar. Faz tempo que você não aparece em casa, queria saber se estava tudo bem.

Meus pais moravam do outro lado da cidade, ninguém iria dar 'uma passadinha' por essas bandas por nada. AHA! Era obvio que eu não passava muito por lá, também pudera, ainda mais agora, que eu tentava ao máximo não deixar que nada intervisse nesse meu novo momento. Adultos e suas relações mal resolvidas com os pais, que nutrem alguns traumas do passado e que às vezes preferem se manter afastados pra não gerar desentendimento, como tratá-los?

Por Nossos FilhosWhere stories live. Discover now