Capítulo 16

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-... Não sei como você conseguiu ajudar o Jaime mas ele teria morrido... Vai garantir que ele fique vivo... se ele morrer você morre...

Os olhos dele desviam dos meus para o garoto por alguns instantes, então ele volta a fitar o mar, e depois que ele estiver bem? O que vai acontecer comigo? Engulo em seco sem olhar pra ele, suspiro apenas aliviada pela minha vida ser um pouco mais prolongada, uma brisa faz meu corpo estremecer com o frio mas não quero sair, não quero que a imagem deste mar negro e estrelado se perca em minha mente, não quero esquecer o cheiro do mar, fecho os olhos saboreando as sensações que o mar trás a mim.

- Onde aprendeu a curar?

Ele me pergunta mas eu permaneço em silêncio, não sinto vontade de lhe falar sobre essa parte do meu passado.

  - Ele vai ficar bem em poucos dias.
Falo seca ele me encara e se aproxima mais de mim, olho em seus olhos.

  - Não foi o que eu perguntei senhorita... Não se esqueça que você não é nada aqui... uma prisioneira... um passatempo... aprenda a obedecer e ficar no seu lugar ou vai se machucar.

Me escolho involuntariamente, dou um passo para trás ainda olhando em seus olhos.

- Eu fazia os curativos de meu pai... Ele chegava bem machucado as vezes... Eu pre..cisei aprender...

  Engasgo nas minhas próprias palavras, nunca tinha falado disso com ninguém além de Noah, não que não fosse falado na praça e nas esquinas, suspiro e desvio o olhar olho para o céu e o seu limite no horizonte.

- Onde está a adaga?

Ele pergunta mudando o tom de voz surpreendentemente rápido, demoro alguns segundos para compreender, ergo um pouco a camisa e tiro do cós da calça a fina adaga, ele a toma de minha mão, será que ele mudou de ideia? Talvez ele não queira mais que eu fique com a adaga, observo ele etenta e pronta para correr caso ele gente usar a adaga, ele parece pensativo.

- Sabe usar?

  Penso um pouco e então faço que não com a cabeça, sei usar uma faca mas não para machucar alguém e sua expressão não parece se referir a cortar vegetais. Ele suspira e caminha em volta de mim como que me analisando, seus passos param atrás de mim sinto sua mão na minha, ele devolve a adaga e guia minha mão rápido em um golpe para frente, inclinando a adaga para cima.
- Você é pequena... na primeira oportunidade seja rápida e crave a adaga abaixo das costelas... vire a adaga pra cima e gire antes de puxar.
Ele fala enquanto guia meu braço mostrando o movimento, presto atenção a cada detalhe, me pergunto o porque dele estar me ensinando isso, sinto meu rosto queimar com a proximidade.

  - Depois corra... tente uma vez sem mim.

Ele solta meu braço e caminha até minha frente ficando alguns passos afrente de mim, suspiro aliviada por ele ter se afastado, repito o movimento sem dizer nada.

  - Não!... coloque um pé na frente, e de mais impulso, segure firme... de novo.

Repito o movimento agora apoiando um pé na frente criando uma base melhor, olho para ele que da um leve sorriso pra mim.

- Você aprende rápido...

Não consigo evitar sorrir também, olho de relance a adaga em minha mão, escuto passos e percebo que ele voltou a ficar atrás de mim.

- Mas e se eu...

Vejo a adaga voar longe com um tapa que ele da na minha mão, derrepente meus pés saem do chão, sinto uma forte pressão feita por seu braço em volta do meu pescoço, tento desesperada buscar ar, me debato e tento arranhar seu braço mas ele nem se move, aos poucos minha visão começa a escurecer, então ele me solta, consigo proteger o rosto me apoiando com as mãos no chão, recebo um chute na barriga que faz com que eu caia de lado e um grito escape por minha garganta.

- Você vai acabar morta...

Escuto mas sua voz parece distante, vejo a sinueta dele abaixado ao meu lado.

- Vamos chegar em terra pelo amanhecer... você vai gostar da onde estamos indo...

Ele da risada e escuto seus passos se afastando de mim, estico meu braço alcançando a adaga a seguro firme entre meus dedos, tento me levantar mas fico tonta e caio novamente, respiro fundo várias vezes e então levanto, passo por passo vou até a cabine, tento abrir a porta mas está fechada, bato nela várias vezes mas não tenho uma resposta, algumas lágrimas molham meu rosto, não consigo entender porque ele é assim.
Desço os degraus até onde Jaime está adormecido com uma garrafa de rum ao seu lado, sento ao seu lado, "ele vai deixar o garoto aqui fora no frio?" Um leve grunido de dor e encomodo sai pelos meus lábios quando me ajeito ao lado do garoto trêmulo.

Me pergunto onde estamos indo e por que ele quis me ensinar a usar a adaga? Por que ele parece se importar com o garoto e ao mesmo tempo só se importar consigo mesmo? Por que ele não me matou depois que eu entreguei o caderno? Ele vai me matar quando chegar em terra? Ou então o que ele vai fazer comigo?
Olho para o garoto, não tenho força para leva-lo para um lugar mas aquecido... nem tenho um lugar mais aquecido para leva-lo... Eu não pensaria em descer para onde os marujos ficam a noite... Então puxo ele mais para perto para tentar aquece-lo, escuto ele resmungar mas não acordar, olho para as estrelas...

Sete MaresWhere stories live. Discover now