Capítulo 86

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Ao ouvir o sinal do intervalo, mal dei o primeiro passo para fora da sala, e fui agarrada pelo braço e literalmente arrastada pelo corredor. Bufei e disse, incomodada:

— Eu tenho pernas, sabia?

— É? Então podia usar pra correr e me contar logo os mínimos detalhes dessa história! Você acha que eu não reparei que você contou superficialmente? Eu trabalho com detalhes, fofa.

Revirei os olhos. Sofia podia ser extremamente invasiva e irritante quando queria.

— Tá, o que mais quer saber? – Perguntei, sentando em um banco vazio.

— Tudo, sem perder nenhum detalhe.

— Bom, ele chegou lá dirigindo o carro da tia e...

— Não, isso eu já sei. Tô falando da hora H.

Suspirei.

— Bem, Sof... Ele foi carinhoso e cuidadoso, e...

— Doeu muito? Sangrou? Ele foi safado? Você disse que foi vendada até a casa. Ele usou a venda em você na hora?

— Você tá lendo Cinquenta Tons de Cinza de novo, né?

— Talvez, mas você não me respondeu.

— Não usei venda, Sof. E doeu, sim, mas conforme foi rolando, foi ficando melhor. Sangrou um pouquinho. Mas, no geral, foi bom. Não me arrependo nem um pouco.

— Você gosta dele de verdade, né amiga?

— Gosto. – Sorri, lembrando do sorrisinho tímido de Peter.

O dia passou rápido, pois eu tinha muito o que fazer no colégio e mais ainda no trabalho. Quando cheguei em casa, fui tomar um banho e desci para jantar, decidida a contar a Tony que Peter havia me pedido em namoro.

Desci as escadas já com a aliança na mão, respirando fundo e tentando não parecer nervosa. Sentei à mesa e coloquei as mãos sobre as pernas, escondendo-as embaixo da mesa propositalmente.

— Ei, eu estava com pressa e acabei nem conversando com você direito hoje cedo. Como foi a aula? – Perguntou Tony, aparentemente bem-humorado.

— Foi legal. Sem grandes novidades. – Dei de ombros.

— E quanto a ontem?

Engoli em seco.

— Ah... Bom, foi ótimo. É sempre bom passar um tempo com Peter, e ele sempre encontra uma maneira de surpreender. – Respondi, tentando contornar a situação.

— É mesmo? Ele fez alguma surpresa pra você?

— É, pode-se dizer que sim. – Falei, mostrando a aliança.

Tony ficou olhando para minha mão por alguns instantes, com uma reação difícil de decifrar.

— Isso é... Uma aliança? Uma aliança de namoro?

Fiz que sim com a cabeça, num sorrisinho tímido. Tony franziu as sobrancelhas, mas logo deu um sorrisinho, murmurando:

— Confesso que tô surpreso.

Olhei para ele, sem saber ao certo se deveria esperar por alguma frase fofa de pai ou pelo típico sarcasmo do playboy Stark. Pensei em perguntar o porquê, mas antes ele continuou:

— Quer dizer... O Peter é um garoto tímido, gagueja por qualquer coisa. Ele pediu você em namoro no meio do boliche? Na frente de todo mundo?

Boliche? Ai meu Deus! Eu quase havia me esquecido que inventei para Tony que havíamos ido no boliche. Com a maior naturalidade possível, respondi, dando continuidade à mentira:

— Ah, não. Ele esperou que a gente saísse de lá. Pediu... No carro.

— No carro?

— É... Quer dizer... Não exatamente no carro. Na frente. É. Na frente do carro. Do lado... Perto do carro.

— No estacionamento?

— Isso. No estacionamento. – Concordo, nervosa por já estar tropeçando nas próprias palavras.

Tony olhou em meus olhos, e senti um frio na espinha, com medo de minha história não ter colado. Mas, por fim, ele disse:

— Acho que tô ficando velho. Num dia, descubro que sou pai e no outro, já sou sogro.

Sogro. Tony, sogro de Peter. Que coisa estranha de se pensar. Quase tão estranha quanto ele ser meu pai.

Dei um sorrisinho e mudei rapidamente de assunto, comentando que precisava comprar livros novos. Tony indagou meu interesse pela leitura, e contei para ele sobre alguns de meus livros preferidos.

A semana passou sem grandes novidades. Peter e eu trocávamos sorrisinhos ao passarmos um pelo outro na empresa, lembrando da noite de segunda-feira. Às vezes, era surpreendida com alguma mensagem de texto em meu celular durante o serviço. Era Peter, que não economizava em palavras doces.

Era estranho para mim a ideia de estar em um relacionamento sério, principalmente com alguém tão doce como Peter. Por vezes, eu me achava bruta demais para ele, e sempre me esforçava para ser tão delicada com ele quanto ele sempre fora comigo.

Marcamos de sair novamente no final de semana, e fui dormir ansiosa na noite de sexta-feira, contando os minutos para sair com Peter no sábado.

Ao acordar no sábado de manhã, percebi que as coisas não corriam bem. Minha cabeça latejava, e meu estômago estava estranho. Levantei devagar e fui me arrastando até a cozinha.

— Bom dia. – Disse Tony, a quem eu respondi com um grunhido.

Abri a caixinha de remédios e peguei um comprimido.

— O que você tem? Não vai tomar café?

— Não. Estou enjoada e com dor de cabeça.

Tony fitou-me por um longo instante, o maxilar travado e uma expressão visivelmente tensa.

— Vou pro meu quarto. – Falei.

Deitei novamente em minha cama, e logo o celular tocou.

— Alô?

— E aí, amiga? Tava pensando em sair pra tomar um sorvete hoje à tarde, o que acha? Charlie já topou.

— Não tô muito bem, Sof.

— O que você tem?

— Tô enjoada e com a cabeça latejando. Já tomei um remédio, mas tô bem azeda.

Sofia ficou em silêncio por um instante.

— Lena... Eu sei que posso estar sendo bastante intrometida, mas não posso deixar de perguntar. Na noite em que você e o Peter fizeram, vocês usaram camisinha?

— Claro que sim, né Sof.

— É que você sabe, né? Mesmo usando, tem chance de dar ruim. Chance mínima, mas tem. E você não tava no período fértil, né?

— Período fértil? Não sei... Não me atentei a isso.

— ... Bom, deve ser só um mal estar... Mas fica de olho. Melhoras!

— Obrigada.

Desliguei. A conversa com Sofia foi o suficiente para me deixar nervosa pelo resto do final de semana.

I (don't) Need a Hero!Onde as histórias ganham vida. Descobre agora