CAPÍTULO TRINTA E SETE

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O último movimento de Kaya foi abraçar Tomás com toda sua força, esperando ser atingida pelas balas. Os olhos selados, incapaz de ver sua própria morte.

No entanto, esperou, esperou e... nada veio.

Ao abrir os olhos, viu Lynn, no meio das fileiras de cápsulas, com sua mira ainda presa neles. Mas nada saia de sua arma. Por mais que apertasse o gatilho repetidamente. Por mais que aperrasse... Estava descarregada.

Com uma onda de alívio percorrendo seu corpo, a adolescente ergueu a mão e afundou o punho fechado no monitor, acertando o botão de libertar todas as crianças. O vidro chegou a trincar com a força, mas não afetou no desempenho do programa. De uma vez só, todos os leitos foram abertos e, aos poucos, os capturados começaram a acordar.

— Não... — dizia Lynn com a arma entre as pernas, recarregando-a com as mãos trêmulas. — Não, não, não!

Kaya e Tomás não esperaram para ver o resto. Correram para fora de mãos dadas enquanto todos acordavam para distrair a mulher. Era algo cruel. Egoísta. Acordá-los apenas para usá-los. Contudo, necessário.

Então, eles continuaram sem olhar para trás.

***

Os alarmes ainda não haviam parado de soar quando o elevador se abriu e Leyr saiu com Guto no corredor. Mesmo ferido, o rapaz seguiu correndo de mãos dadas com o irmão de sua amiga, com medo de Hock alcançá-los. Nunca lutara daquela forma antes. Nunca ficara apenas na defensiva, tentando escapar dos golpes. Ele sempre atacava. Sempre conseguia acertar ao menos um soco. Mas... dessa vez, tudo que conseguiu fazer foi fugir.

Quando estavam chegando no ponto onde Leyr e Kaya se separaram, viram a garota vindo do outro lado correndo e... de mãos dadas com outra criança. Guto, ao perceber quem vinha, soltou-se de Leyr e correu na direção da irmã. Ela se agachou para aceitar o abraço do garotinho. Os dois se apertaram um contra o outro.

— Kaya! — ele gritou, com a voz de choro. — Você veio!

— É claro que eu vim! — ela respondeu, o apertando com mais força ainda.

O adolescente via o amor os circulando. Sabia que nenhum dos dois queria se afastar. Queriam ficar ali pra sempre, suprindo os longos dias separados. No entanto, a menina conseguiu superar o sentimento para se distanciar um pouco, olhá-lo nos olhos e dizer:

— Vamos voltar pra casa. Não podemos mais ficar aqui.

Após ele concordar, Kaya se levantou e se aproximou de seu amigo, ainda confuso com o outro garotinho ali. Porém, quando Guto viu a outra criança, esbugalhou os olhos de surpresa e correu para dar outro abraço. Quando exclamou o nome do outro, Leyr entendeu:

— Tomás!

Ele se virou para Kaya.

— É o menino do EACEI? — sussurrou.

Ela apenas assentiu. Depois, examinou-o de cima a baixo, mudando as feições para mostrar seu espanto.

— O que aconteceu com você? — perguntou, preocupada.

O garoto estava com alguns ferimentos expostos e sangue escorria por suas vestes. Seu incômodo maior era o estômago, onde fora chutado com brutalidade enquanto estava deitado em cacos de vidro.

— Estou bem — mentiu. — Acho que os soldados devem saber onde estamos. Precisamos correr para o elevador.

Outra vez, a adolescente balançou a cabeça em concordância. Eles interromperam o momento das crianças para recomeçar a correria. Kaya deu sua mão ao irmão e os dois seguiram à frente. Leyr fez o mesmo com Tomás para não perdê-lo ou deixá-lo para trás.

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