Capítulo 9

20 3 0
                                    

NATE

Encarar a casa de Lisa do outro lado da rua nunca tinha sido um trabalho tão difícil. Pelos últimos dias, a melhor amiga aparentemente estava no banho todas as vezes que ele ligava, mas também se esquecia de responder às mensagens quando saía dele. Nathan sabia que não era verdade; não só porque ninguém tomava cinco banhos por dia na entrada do inverno, mas porque Lisa nunca tinha sido lá tão cheirosa assim.

Com uma sacola de comida chinesa que conseguiu com parte das economias de mesada que vinha fazendo para quando a Bee Are chegasse à cidade, atravessou a rua e usou a mão livre para girar o boné para trás. A aba dele em sua testa costumava ser um esconderijo, mas, apesar de se sentir culpado sem certeza do motivo, não podia fugir de Lisa agora. Precisava enfrentá-la como apenas o melhor amigo dela poderia fazer.

O som da campainha veio acompanhado por um grito indiscreto do andar de cima:

— Eu não tô!

Nathan assentiu para a mãe da garota assim que ela apareceu à porta. Ergueu os ombros e sussurrou antes que ela pudesse lhe passar o recado:

— Eu sei que ela tá.

A senhora Wood sorriu com um suspiro e abriu espaço para que ele entrasse. Nathan aceitou a sugestão com rapidez, antes que ela mudasse de ideia. Espremeu-se pelo vão da porta e agradeceu em tom quase mudo enquanto subia as escadas. Teve um momento para decidir se deveria se anunciar, mas, quando escutou os passos destrambelhados dentro do quarto, entendeu que ficaria trancado para fora. No segundo que lhe restava, girou a maçaneta e colocou um pé contra o batente para impedir que a amiga alcançasse a chave antes que ele pudesse travar a porta entreaberta.

— Não! Lisa! — Jogou o ombro contra a madeira enquanto a garota a empurrava pelo lado de dentro e esmagava seu tênis no meio do caminho.

— Vai embora!

— Me deixa falar com você!

Não soube quando ela desistiu da luta, mas, no instante seguinte, estava correndo para dentro do quarto, impulsionado pela força que fazia e tentando se equilibrar antes de cair de cara. Parou alguns passos depois e respirou fundo enquanto se virava para Lisa. Ainda não tinha decidido o que dizer quando gesticulou com a mão que segurava as sacolas e deixou os ombros caírem.

— Eu trouxe comida chinesa. E eu não roubei o Paul de você!

Nathan acreditou que ela fosse desconversar sobre o motivo de terem acabado ali, sem se falarem, depois de mais de um ano esperando para viverem aquele momento juntos; e, pelo jeito que Lisa o encarava, ela também parecia acreditar nisso. Talvez para a sorte dos dois, a mudança de ideia veio logo:

— Claro que roubou! Claro que roubou.

Nathan não gostava de quando ela enfatizava as coisas daquela forma. Primeiro um grito estridente de quem não estava nem aí para quem pudesse escutar; em seguida, um sussurro que o fazia ter medo de como as palavras vinham cortando pelo ar.

— Você tá conversando com o Jonny desde que a gente conseguiu contato, porque era o Jonny! E, agora que o Paul apareceu, é você quem continua conversando com ele.

— Mas eu tentei te ligar! Você não atendeu!

— Uma vez! Eu não atendi uma vez, e você tá conversando com ele pelos últimos cinco meses!

— Eu tentei dizer pra ele falar com você.

— Eu aposto que você tem mensagens dele no seu celular agora. Eu aposto que ele continua te mandando mensagens sobre a turnê.

Nathan não entendeu de imediato quando ela se aproximou. Acompanhou com os olhos o que a garota fazia até encontrar a mão dela perto de seu bolso. Vinha em busca do celular, usado do pai, mas que havia ganhado de aniversário alguns meses atrás.

— Lisa — chamou uma vez quando não conseguiu afastá-la com a única mão livre que ainda tinha, segurando as sacolas com a outra. — Lisa, para! Você tá maluca!

— Não me chama de maluca! — O grito em sua cara o fez travar com os olhos arregalados. Os da amiga estavam logo na frente dos seus e provavelmente tão grandes quanto, mas tinham um olhar de quem estava pronta para arrancar sua cabeça de cima do pescoço.

Foi bem ali, com o grito ainda ecoando na cabeça, que não conseguiu se segurar mais. Tentou mastigar um sorriso e abafar a risada na garganta para não piorar a situação, mas falhou quando viu a mesma expressão se formar aos poucos no rosto dela. Não poderia dizer quem começou a rir primeiro, mas se sentou no chão acarpetado e soltou as sacolas. Sentia os olhos umedecerem na aflição de não terem conseguido ainda conversar sobre o problema, mas resmungou com as palavras risonhas e arrastadas, pronto para começar a chorar ali mesmo, confuso, se nada mais desse certo:

— Por favor, Lisa.

Viu quando a amiga se sentou em sua frente, um pouco menos emotiva que ele, mas com um bico nos lábios.

— Não é justo, sabe? — ela comentou simples, enquanto puxava a sacola para perto sem cerimônia e decidia na sorte qual seria a sua caixinha entre as duas que ele havia comprado.

— Eu juro que não fiz de propósito. Mas, olha, eu já disse pra ele que não vou mais entrar no MySpace esses próximos dias, então ele pode falar com você pra dar as notícias pro site. E ele pediu um número pra quando chegasse e você não tem celular, mas você pode ficar com o meu.

Observou quando a garota trouxe os olhos dos hashis para ele, depois voltou a afundá-los no frango com molho agridoce.

— E o que ele disse?

— Eu não sei, mas eu não vou responder mais. — Deixou que ela ficasse em silêncio o quanto precisasse para engolir a informação com a primeira porção de comida. Só então se atreveu a continuar. — Agora a gente pode falar sobre o que eu tô tentando te contar há dias?

Lisa continuou em silêncio, de boca cheia. Um pouco de comida sempre funcionava para melhorar seu humor, então não a esperou confirmar.

— Meus pais vão pra casa dos meus tios no norte, no fim de semana do show. E meu irmão deve ficar na faculdade ou ir pra casa da namorada.

A amiga finalmente soltou a caixa de comida chinesa. Os olhos pretos pareceram vir até os seus com o dobro da intensidade que já costumavam ter.

— Quer dizer que...

Ele encolheu os ombros para responder que sim.

— A gente pode convidar.

Tá brincandoWhere stories live. Discover now