Capítulo XXIII

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Selene ainda estava parada na escada, sentada perto dos prisioneiros que libertara, sem saber o que fazer.

Caden se arrastou até ela quando conseguiu convencer a todos de que havia melhorado, pelo menos um pouco.

— Obrigado. — Ele se sentou ao lado dela, e a observou erguer a cabeça encolhida entre os braços, que estavam apoiados em seus joelhos. — Você salvou muita gente hoje, foi bem heróico da sua parte.

Heróico? Podia ser, para ele. Mas para ela a palavra não fazia o menor sentido. Ela os salvara das garras do pai, cujo corpo agora esfriava alguns metros abaixo, além de ter ordenado a prisão do próprio irmão para prosseguir com o plano. Era quase engraçado. Imaginar as damas e cavalheiros da sociedade ressonando nos quartos de cima enquanto um parricídio ocorria nas profundezas do castelo a fazia querer rir.

Um ronco mal contido saiu de sua boca e, antes que conseguisse se segurar, gargalhadas vieram atrás, tão fortes que faziam seu corpo sacudir e lágrimas brotarem em seus olhos. Caden a olhou, meio confuso e assustado, e isso a fez rir ainda mais. Rir até sua barriga doer. Rir até chorar.

Uma mão pálida com queimaduras nos pulsos pousou em seu ombro quando ela começou a soluçar. Não sabia se era capaz de parar. Selene prendeu a respiração até ficar tonta para conseguir se controlar.

— Você pode chorar, se precisar. Não se preocupe. Eu chorei hoje também. — Algo se apertou em sua garganta e ela se aproximou dele. Selene não ouvia palavras gentis com muita frequência, e, quando ouvia, ficava desconfiada. Ela não sabia que precisava delas tanto assim.

— Teressa. Preciso vê-la — lembrou-se, surpresa. Não sabia o porquê, mas essa foi a primeira coisa veio à sua mente.

— Teressa...?

— Ela vai me ajudar. — Correção: ela ia ajudá-la. Com a questão do possível casamento para ser mais precisa. Esse fato parecia sem importância agora, mas era uma coisa menos trágica a qual se agarrar.

Os feéricos olhavam Caden e Selene, sem disfarçar a estranheza. Não conseguiam ouvir mais que sussurros, mas mesmo assim era esquisito vê-los tão próximos, conversando.

Angrod, com a pele esverdeada e olhos de azeviche, acariciava os ombros rosados feridos de Indis com delicadeza, enquanto olhava os jovens de soslaio. Deschia, a garota dos cabelos de copo-de-leite, encarava-os com a boca quase escancarada, sua mão machucada enrolada no tecido do próprio vestido roçava levemente no ombro. O ancião com chifres, Nain, semicerrou os olhos quando viu a princesa se aproximar de Caden, e Finrod, o elfo de longos cabelos verdes e brilhantes, fez uma careta de confusão.

Quando Selene se levantou, eles logo disfarçaram.

— Vocês precisarão me seguir pelas passagens ocultas deste palácio, para chegarmos em segurança a... para sairmos daqui. — Ela engoliu em seco e umedeceu os lábios. — Elas podem ser bem labirínticas, por isso teremos que permanecer juntos.

Ninguém disse nada e ela também não se mexeu. Pelo menos não até Caden se levantar e dizer:

— Bem, é melhor irmos logo. — Ele apertou a lateral de seu corpo com uma das mãos, por causa da dor. Os outros se entreolharam, mas não contestaram. Selene assentiu e começou a subir os degraus.

— Ah... Princesa? — começou Finrod. — Obrigado. — Ele olhou ao redor, em busca de algum tipo de consentimento. — Em nome de todos nós.

— Foi o mínimo que pude fazer. — Seu sorriso era uma linha fina. — E podem me chamar de Selene.

Selene seguiu pelo caminho que seu irmão havia ensinado até chegar ao trajeto que já conhecia. Ela lembrou da expressão de Telbeth ao ser preso, e disse a si mesma para não esquecer de tirá-lo das masmorras o mais rápido possível, antes que ele fizesse algo estúpido.

O que ele pode fazer?, disse internamente.

É. O que ele pode fazer?

Telbeth foi diretamente para a sala cuja chave estava em seu peito. Foi o primeiro lugar que veio a sua mente, e pareceu o lugar certo.

— Vossa Alteza... — começou um dos guardas, mas se interrompeu ao ver seu olhar.— Vossa Majestade.

— Sim?

— O que faremos em relação a Princesa? 

— Nós... — Algo apertou sua garganta. Ele tentara bloquear qualquer pensamento relacionado à irmã. Ele amava Selene de uma forma estranha, sentia que devia protegê-la, era algo quase instintivo. Os dois nunca foram muito próximos, mas para os padrões daquela família, eram quase melhores amigos. Às vezes, ela iria ao quarto dele à noite pois ficava com medo das tempestades, ou porque precisava de alguém para acompanhá-la até a biblioteca. Na primeira vez que ele passou mal por causa das bebidas, aos catorze anos, ela o ajudou. E quando chorava por causa das surras, ela afagava seus cabelos e ouvia seus lamentos. Mesmo que estivesse com raiva, não estava com raiva dela. — Resolveremos isso depois.

Os guardas assentiram, com as testas franzidas. Todos estavam confusos, sem saber quais regras seguir. Eles já esperavam que a coroa passasse para o príncipe, mas em circunstâncias mais pacíficas. Seria engraçado se não fosse tão trágico, o rei que matou o rei.

Telbeth abriu a porta e respirou fundo ao ver tudo aquilo de novo.

                                  

Laelia pegou a peça de madeira entalhada com a mão sangrenta e sentou-se na cama.

Ela virou-a e leu o nome inscrito fracamente ali.

— Elia.— A palavra saiu seca e quebradiça. Há muito tempo não a pronunciava.

Sua irmã. Perdida há tanto tempo.

Um ódio subiu por sua garganta, tão convulsivo que a fez arranhar com suas unhas o entalhe, marcando-o com o que pareciam ser garras de um felino feroz.

Ela faria tudo por Elia, sempre fez. E voltaria a fazer agora.

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Ah, e novo aviso: estou trabalhando em um novo livro e fiz um formulário para me ajudar. Quem puder responder, o link está na minha bio! Obrigada ☺️

Até a próxima ❤️

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