Capítulo IV

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Marylia e Selene observaram a capa preta deslizar pelos fundos do jardim até desaparecer. Com um grunhido de frustração, a mais jovem fincou sua adaga no tronco de uma árvore.

— Senhorita, é verdade?

— O quê?

— Vai mesmo cortar o fornecimento de alimento do reino?

Ao ouvir a pergunta, a garota se arrependeu das palavras impensadas que pronunciara enquanto fogo e raiva percorriam suas veias.

— Não... foi só uma... ameaça.

A moça suspirou de alívio, porém prendeu a respiração novamente ao ver a jovem arrancar a adaga da árvore e sair marchando na direção oposta do castelo.

— Senhorita! O que está...

Marylia foi silenciada por um aceno de mão brusco. Ela correu sorrateiramente na direção da ama, com os olhos arregalados de medo e preocupação.

— Vamos segui-lo— determinou Selene, ainda mais decidida.

— Está louca?!— engasgou. Teria se arrependido de suas palavras indecorosas se não estivesse tão alvoroçada.— Até mesmo os soldados têm medo de invadir vilarejos mágicos!

— Não podemos deixar que ele simplesmente vá, sem mais nem menos!

— Eu sinto muito...— começou, sacudindo a cabeça freneticamente.— Não posso ir, é muito perigoso...

Selene deu uma parada brusca, tomou as mãos da criada, e disse:

— Você não pode permanecer na mansão, isso sim seria perigoso. Não te obrigarei a me acompanhar até o vilarejo, irei arranjar-lhe um lugar para ficar, mas precisa sair daqui.

Ela voltou a correr de forma furtiva, sem abrir brechas para protestos. Marylia não viu outra alternativa a não ser acompanhá-la.


O silêncio costumeiro do castelo Blackburn estava mais pesado e sombrio.

Depois de levar uma boa surra de seu pai por ter ido jantar fedendo a aguardente, Telbeth arrastou-se até seu quarto, abriu o guarda-roupa e retirou o fundo falso para pegar a tentadora garrafa de rum que escondia.

Ele tirou a rolha com dificuldade, utilizando os dentes, e começou a beber direto pelo gargalo. Suas bochechas ardiam devido às bofetadas atordoantes que recebera. Lágrimas rolaram por elas, como se tentassem aliviar a dor ardente que irradiava dali.

Telbeth cerrou os olhos, a cabeça girava. Ele não se importou quando uma escuridão entorpecente encobriu seus sentidos, levando-o para um sono sem sonhos ou pesadelos, um vazio completo.


O rapaz se movia como uma sombra, literalmente. Sua capa preta camuflava-o na noite, dificultando a perseguição.

O fato de que ele nunca olhava para trás ou para os lados, caminhava lentamente, e nem mesmo se preocupava em disfarçar sua presença, afligiu a garota. Estaria sendo atraída diretamente para a toca dos lobos? A resposta mais provável para essa pergunta a assombrava mais a cada instante, mas, de qualquer modo, àquela altura, dar meia-volta não era uma opção.

Estava sozinha. Marylia a deixara para se hospedar numa pensão barata. Suas joias seriam suficientes para sustentá-la por um período. Pelo menos conseguira um lugar razoável para abrigá-la.

Cada vez mais perguntas surgiam, sussurrantes e incômodas. Uma delas, particularmente irritante, não parava de provocá-la. Por que ainda o segue? Selene a ignorou.

Em determinado ponto, o rapaz adentrou uma taberna. A garota esperou alguns minutos antes de passar pela ensebada porta de madeira e chegar ao ambiente com o nauseante cheiro de cevada e homens suados. Ele se sentou na bancada. Ela se ocultou em uma das mesas vazias.

Com o rosto encoberto pelo capuz do manto, era difícil ver muita coisa, então seu olhar estava centrado nas botas sujas de lama do garoto.

Uma taberneira passou na sua frente, bloqueando a visão, e então ela ouviu passos arrogantes e ritmados ressoando pelo chão de madeira imundo.

— Olá, Selene.

A jovem trincou os dentes e se levantou. Ele deu a volta na mesa redonda e parou ao seu lado. Em seguida, indicou com um floreio duas espadas entrecruzadas suspensas na parede.

— Escolha a sua.

— Não.

— Vai lutar sem uma espada?

Ela apontou uma de suas adagas escondidas para o estômago do rapaz. Ele não se moveu um centímetro, mas também não parecia nervoso.

— É a segunda vez que aponta uma lâmina para mim e nem mesmo sabe meu nome.

— Me diga.

— O quê?— Ele fez questão de arrastar as palavras.

Seu nome— grunhiu ela.

— Lute comigo e direi.

Sem retirar a adaga, Selene puxou uma das espadas. A lâmina reluziu à luz das velas, e o cabo frio de metal gelou sua mão. Só então, lentamente, voltou a guardar a adaga no corpete.

O jovem sorriu contidamente e retirou o manto. Ela apenas reajustou o seu ao redor do corpo e o observou apanhar a espada restante.

Algo que chamou sua atenção foram seus cabelos. Brancos como a neve. Seus olhos eram verde-musgo, ou pareciam ser, devido à luz fraca. Uma aparência bem... incomum.

Quando percebeu que ele a esperava, Selene virou-se e saiu de forma tão rápida e brusca que o chão ao seu redor tremeu.

Ela abriu a porta com um estrondo e foi para fora, levando consigo alguns olhares atravessados e murmúrios.

O garoto a seguiu, sem pressa e sorrindo.

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O Encanto da LuaWhere stories live. Discover now