Capítulo 1

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— Luísa

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— Luísa.

Pisco, puxada para fora do transe pela voz de Thais acompanhada por seu tapinha na testa.

— Hum. — murmuro, meio confusa, antes de olhar ao redor e notar a sala praticamente vazia.

Ah.

Fecho rápido o caderno de rabiscos, com a linda capa de couro vermelho que me fez  pagar por folhas parcialmente riscadas em um brechó, e amarro a fita do mesmo material na lateral. Me embolo com a caneta preta e as apostilas jogadas por cima da mesa e quase levo tudo ao chão.

— Vamos, enrolada. — passa a mão por algumas folhas, tentando arranjar uma forma de adiantar meu confuso processo de arrumação.

O zumbido em meus ouvidos aumenta  quando abaixo a cabeça para organizar os materiais, e a pressão dobra. Tento ignorar. Já era para eu ter me acostumado a isso nessa altura do campeonato.

Não havia percebido a aula chegar ao fim. Estava focada demais em meu caderno — preenchido por uma floresta coberta por cogumelos e liquens em uma escala de cinza onde eu pretendia pôr um pouco de dourado, o sol filtrado pelas árvores, mais tarde — e de menos na aula de história da música popular. Talvez minha completa falta de interesse em teoria musical se desse pelo alinhamento maior da minha personalidade à parte sensível da música. Música não pode ser regrada. Não é uma ciência. Não é previsível. Música é vida. É cor e luz, alma e coração, é o que preenche vazios.
É o que em breve seria tirado de mim.

Terminando de guardar minhas coisas na bolsa, puxo minhas pernas para a lateral da cadeira e levanto. Ou tento.
Uma onda de tontura me atinge, fazendo-me cambalear para frente. Minhas mãos chocam-se abertas contra a mesa, em busca de estabilidade. As mãos de Thais já estão lá, apoiando-me e fazendo com que eu me sente novamente.

Ela busca uma garrafa de água na própria bolsa, desenrosca a tampa e ergue em minha direção.

— Tatá, estou bem. — mas aceito o líquido mesmo assim, ao menos para dar a ela alguma coisa a monitorar.
Minha amiga enrola os compridos cabelos pretos em um tubo e os joga para trás dos ombros, em uma mania nervosa que aprendi a identificar.

— Está, sim. É claro que está. — Ela resmunga.

Bebo metade do recipiente antes de entregá-lo e me levantar novamente, dessa vez sem infortúnios. Ajeito o lenço colorido que mantém meus fios castanho-acobreados no lugar, alisando também a jardineira jeans que visto antes passar pela porta.

A verdade é que não havia motivo para agitação. A tontura originava-se do mesmo motivo pelo qual às vezes eu me desequilibrava sem motivo, e pelo qual eram raras as viagens de carro em que eu não ficava pelo menos 70% do tempo nauseada. O mesmo motivo pelo qual minha capacidade de ouvir estava se esvaindo cada dia mais.

Último Som Where stories live. Discover now