As mentiras nunca serão lembradas

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Você parou de tomar os seus remédios ? - Gulf revira os olhos, pegando mais batatas douradas. - Me responda Gulf Kanawut! 

- Mãe! - Jin a chama num tom atencioso, a mulher não desvia seus olhos do filho mais novo. 

- Você não vai a psicóloga a quase três semanas, não aparece na sessão de tratamento e agora, não recebe mais os remédios. O que você pensa que está fazendo? Acha que vai ficar melhor ignorando o que tem? 

- Por favor mãe. - Jin volta a falar, agora num tom suplicante. O medo crescente de que as coisas se tornem mais tensas, de que seu irmão explodisse. 

- O que? Acha que passar tempo com Mew vai te curar? É isso? - Seu tom maldoso em direção a Gulf. O garoto larga seu garfo fazendo o som tilintar pela sala de jantar. - Você sabe que daqui a pouco vai começar a voltar a ficar descontrolado. Não tem como fugir.

- Eu estou bem. Mas você parece não querer isso. - Gulf se levanta. - Eu vou embora. A cada dia fica mais difícil jantar com você. 

- O que? - Gloria se levanta e caminha atrás de seu filho. - É assim que você me vê? Eu tento te ajudar Gulf! Você não entende que está acabando consigo mesmo?  O que aconteceu da última vez em que brigaram? Me diz? Foi tranquilo? Você conseguiu enfrentar da forma adequada? - A voz da mulher era baixa, mas havia as nuances irônicas que a cada segundo atingiam seu objetivo. 

- Você não é normal Gulf, você precisa de ajuda. E Mew não vê isso porque ele não te ama. - Gulf se vira para ela, seu rosto neutro, mas seus olhos transbordavam ódio. - Essa é a verdade que você tenta ignorar. Eu sei o que você está tentando fazer, não vai dar certo. Você não pode forçar ninguém a te amar, muito menos fingir ser algo que não é. 

Gulf se mantinha quieto, mas sua mão se fechava em punho. 

- Você tem medo dele te conhecer da forma como você é, certo? Mas meu amor, isso nunca vai dar certo. Você não pode fingir que não tem nada. Se afastar dos remédios só torna tudo pior e acelera as consequências. Você diz que quer manter sua relação com ele, mas como vai fazer isso assim? 

- Eu sou normal mãe. - Suas palavras saíram com dificuldade. Agora sua face demostrava seus reais sentimentos. Gloria estava conseguindo desestabiliza-lo. Ela se odiava por isso, mas era preciso tira-lo daquele devaneio de sua cabeça. Ela precisava fazer seu filho voltar para a realidade antes dela perde-lo. 

- Não Gulf, você não é. E você sabe. Não é normal quando tenta se machucar toda vez que Mew e você discutem. Não é normal a forma como você fica com raiva, nada é normal Gulf. E vai soar menos credível conforme deixa de seguir seu tratamento. 

- Eu sou normal! A gente já está juntos a dois anos, como explica isso? - A casa estava silenciosa, a voz magoada de Gulf e o tom certeiro de Glória os únicos sons ressoantes no ar. 

- Dois anos com medicação. E você não morava com ele. O que vai fazer quando ele começar a ver o que você tenta esconder? Ele vai te deixar! Ele vai te deixar porque ele não te ama o suficiente, nem para reparar o quanto você mudou Gulf. Porque acredite em mim, sem medicamentos você muda drasticamente.

Jin observa os dois, sua mãe soava apática, dizendo palavras cruéis para chegar em Gulf. O que não era difícil, já que o menino sem medicamentos e conselho psicológico se tornava muito mais suscetível a influenciar. Ele se sentia mal vendo aquela cena. Sabia que sua mãe estava forçando a margem para que seu irmão desistisse. Ela sabia que Gulf amava Mew e seu medo de perde-lo poderia ser maior que a tentativa de superar seu transtorno sozinho. 

Jin sente sua noiva segurar sua mão, ela o puxa para eles darem privacidade aos outros dois, mas Jin tinha medo de sair dali e Gulf ter qualquer reação adversa e não poder ajudar. Como se Gulf acabasse de escutar o pensamento de seu irmão mais velho ele começa a rir. 

- Parece que é você quem não me ama. Sempre que venho aqui quer me moldar. Mãe, eu sou maior de idade. Eu posso fazer o que eu quiser e já não moro mais sob seu teto. - Gulf sempre cedia. Mas para a surpresa de todos os membros familiares, ele não recua dessa vez. - E Mew me ama. 

- Ele ama a versão que você criou para ele. - Gloria balança a cabeça, querendo apenas desistir. Mas ela não podia. Não desistiria de seu filho. - E você talvez não o ame de volta. 

Suas palavras chamaram a atenção de Gulf. Ele até então aparentava controlado, a não ser pela mão que se mantinha fechada em punho. 

- Você diz que o ama, mas o usa para sanar seu vazio. Isso não é amor também. 

Tudo ocorre muito rápido. Gulf explodiu repentinamente, Jin vai até eles tão depressa quanto notou a situação. Sabia que Gulf nunca faria nada com a mãe deles, mas o garoto poderia fazer algo consigo mesmo. 

- Você não sabe a porra que está falando. Você continua falando essas coisas para mim. Você me desestabiliza. É tudo sua culpa. Eu não sou o filho perfeito, eu não sou normal, né? Você quer me enfiar de remédios para me fazer ser como você acha que eu devo ser. Você que não me ama, Mew me aceita. Ele me aceita e você não é capaz disso. - Jin o segurava enquanto Gulf explodia em cima de sua mãe. 

A mulher permanecia imóvel olhando a reação do garoto.  Usar as palavras dele contra ele mesmo foi seu ponto final. Como previsto, Gulf estava cada vez mais próximo de seu estágio inicial. 

- Gulf se acalme. Por favor, não ligue para o que ela diz. - Jin tenta restaurar a situação, mas os olhos de Gulf encarava intensamente sua mãe. 

- Foda-se isso. - Ele se se afasta de seu irmão e sai da casa sem olhar para trás, batendo a porta atrás de si.

- Você pegou pesado mãe, sabe que não pode fazer isso. - Jin se vira para Gloria. 

- Ele vai voltar, não se preocupe. O que ele procura em Mew vai se esvaziar com o tempo e ele só terá a nós de novo. Até lá, se eu posso acelerar esse processo eu vou fazer Jin. - Não havia nenhum remorso na voz dela.  

Quando tudo der errado, segure o meu coração (Reeditando)Onde histórias criam vida. Descubra agora