CAPÍTULO 13

76 11 57
                                    

LUCIAN

- Esther! Esther! Desce aqui agora, sua trapaceirazinha, vigarista de uma figa.

Fiquei sem entender nada, até que a moça chamada aos berros chegou na sala de pijamas e uma cara de quem sabia que era a vencedora. Pra minha surpresa absoluta, dona Zuleica tirou uma nota de 100 reais da carteira e entregou pra ela. Sem entender nada, escutei Esther perguntando:

- Ele te contou agora, foi?

Quando entendi o que estava acontecendo, comecei a rir ainda com os olhos cheios de água. Dona Zuleica me olhou irritada:

- Tá rindo de quê, palhaço? Acha engraçado fazer uma velha perder dinheiro pra uma pirralha?

Seu mau humor estava bem nítido, mas o motivo não era o que eu esperava. Pra confirmar minhas suspeitas, perguntei:

- Vocês apostaram sobre mim?

- Sim. Desde que eu te vi, reconheci de cara. Meu "gaydar" não falha. E depois vi como você se comporta com os encontros que a vó tenta arrumar pra você, e confirmei. Tentei avisar ela, mas ela não me ouviu. Daí a gente apostou. Mas você joga duro, heim? Um ano pra admitir? Tô besta contigo.

Fiquei olhando aquelas três pessoas sem saber o que dizer (sim, Estela escutou os chamados de dona Zuleica e desceu pra ver o que era, chegando durante a metade da explicação da irmã). Com medo da resposta que receberia, criei coragem e soltei a pergunta que eu estava segurando:

- E isso não é um problema pra vocês?

Nessa hora, pra minha completa surpresa, dona Zuleica respondeu:

- Menino, não sendo o meu furico em jogo, você faz da sua vida o que você quiser. Tenho 65 anos, e não vai ser agora que eu vou querer escolher a vida dos outros. Minhas escolhas eu fiz, e sou feliz com os resultados. Agora a vida de vocês está vindo. Só fiquei brava porque se tivesse me contado antes, eu teria chamado rapazes ao invés de moças. Que perda de tempo e de dinheiro.

Ainda estava meio abobado enquanto ela seguia resmungando pro próprio quarto pra guardar a bolsa, e eu sorrindo sem acreditar no que estava acontecendo. Estava tão entretido com a resposta da senhora idosa, que não percebi que as duas moças estavam dando pulinhos e risinhos estranhos. Cada uma sentou ao meu lado, me flanqueando, o que me deixou preocupado. E mais preocupado eu fiquei quando uma disse pra outra:

- Ok. Temos um tesouro em mãos. Temos que shippar com responsabilidade.

- Sim. Quando vamos ter outra oportunidade como essa? Ele é lindo, másculo, moreno, cheiroso. Tudo de bom. Diz aí, Lucian: você prefere caras mais malhados, mais afeminados, mais o quê?

- Isso. Fica tranquilo, vamos encontrar o melhor cara do mundo pra você.

E depois disso as duas saíram dizendo que iriam fazer uma lista de opções, que me chamariam pra ver assim que estivesse encaminhada. E escutei algo sobre avisar as juniores pra vir amanhã discutirem sobre o assunto. Não sei bem o que está acontecendo. Estou em um torpor agradável. Mas isso realmente aconteceu, ou eu estou morto na beirada da estrada, depois que o idiota do meu irmão ficou me olhando com cara de pastel e dando risadinhas sem prestar atenção na curva? Vou é dormir. Se eu estiver morto, valeu a pena morrer pra vivenciar uma cena como essa. Só não quero morrer porque minhas meninas vão sofrer de novo. E se eu não estiver morto, não fui expulso de casa outra vez, e isso é um bônus que eu não estava contando.

Dormi como uma pedra, e acordei já era quase hora de almoço. Quando me lembrei do que aconteceu ontem, resolvi conferir pra ver se não estava sonhando. Tomei um banho, vesti uma roupa confortável e desci. Quando passei pela sala de televisão, vi Estela, Esther, Mariana, Manuela e mais algumas que eu ainda não conheço. Escutei partes soltas da conversa, mas identifiquei claramente quando Mari disse:

- Meu pai. Eu tenho cem por cento de certeza. Vou contar o resto, e ninguém vai acreditar no que eu vi.

Enquanto Manu concordava com a cabeça e as demais ouvintes pareciam em choque. Estiquei um pouco mais as orelhas pra ouvir a fofoca, mas Marcos escolheu bem essa hora pra me gritar do andar de baixo:

- Lu? Eu tô morrendo de fome. Você criou raíz aí, foi? Vai fazer fotossíntese e abandonar a comida da tia? Tira o pé da minha janta. Agiliza aí.

Espera aí... Tia? Quando foi que ele conseguiu essa intimidade toda? Meu irmão é muito folgado mesmo. Desci correndo pra comer, e freei quando cheguei na cozinha. Claro que Geovane estaria aqui, se as meninas estão no andar de cima. Onde eu estava com a cabeça? Milena como sempre correu em minha direção e pulou pra eu pegasse ela no colo pra um abraço. Estava um pouco receoso sobre o que Geovane faria hoje, mas ele apenas me cumprimentou com educação, e voltou a conversar com meu irmão como se fossem velhos conhecidos. Marcos, como o cretino que é, aproveitou uma distração de Geovane e me deu uma piscadinha safada. Eu tô muito ferrado. Sei disso.

Depois do que aconteceu ontem, estou sentindo um alívio tão grande, que sinto que vou começar a levitar. As meninas desceram pro almoço com uns risinhos estranhos. Não sei se fico feliz com a reação delas, ou apreensivo com o conteúdo da "reunião". Na dúvida, melhor não baixar muito a guarda. Quando terminamos de comer e cada um foi pros seus respectivos empregos, Geovane me convidou pra conversar, o que me deixou tenso na hora. Pro meu alívio, ele apenas queria me chamar pra comprar algumas roupas e calçados pras meninas, porque as antigas já não serviam mais, e ele não sabia como fazer isso. Pareceu tão aliviado quando eu concordei, que eu senti vontade de sorrir. Realmente, é muito difícil dizer "NÃO" quando ele sorri desse jeito. Será que ele faz isso de propósito?

Era uma vez: um quase conto de FadasWhere stories live. Discover now