Capítulo XXXIX

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O peito de Théo subia e descia, mas sua expressão era a mais terna e tranquila possível.

Seu corpo parecia exausto, era culpa minha, claro. Tinha me recordado tarde demais que o corpo humano não possuía tanta energia quanto o de minha espécie, mas ele em momento algum tinha cedido. Resistindo até o seu limite e me levando com ele inúmeras vezes.

Mesmo que eu tivesse imaginado aquela noite de inúmeras maneiras e até mesmo temido os fracassos de uma primeira vez, não houve um segundo que não tivesse valido a pena.

E eu deveria confessar, que estava completamente extasiada e agora somente velava o sono do homem ao meu lado. Ignorando tudo ao nosso redor.

Cedo demais, ouvi os burburinhos distantes e percebi o sol mais alto do que o esperado, esgueirando-se no céu, anunciando que já não havia muito mais tempo. Ergui-me da cama cuidadosamente para não o despertar e tratei de buscar uma muda de roupas em sua cômoda, já que as minhas pareciam inutilmente sujas.

Sorri silenciosamente vendo a coleção de camisas de Théo metodicamente dobradas e não distinguindo-se em tons diferentes de preto, vermelho e azul. Tomei a primeira muda de roupas que vi e vesti junto com minha roupa intima recuperada depois de uma breve busca.

Estava prestes a iniciar aquele ritual quando meus olhos se tornaram travessos.

Avistei o caderno entre suas roupas por puro acaso, tive cuidado ao toma-lo em minhas mãos, me atentando em não ser descoberta ao explorar a privacidade dele – mesmo que eu já tivesse comprado sua alma e arrancado sua virtude, ainda parecia errado ler os escritos naquele caderno. Ainda assim, o fiz.

Um pequeno sorriso veio aos meus lábios a mesma medida em que uma lágrima cruzava minha bochecha. Aquelas páginas eram um compilado de versões minhas feitas pelos traços de Théo. Fosse sentada na cadeira do outro lado da sala com uma expressão carrancuda ou apenas sorrindo, provavelmente, com alguma piada sua.

Talvez se um dia tivesse duvidado da sinceridade dos sentimentos de Théo, agora me sentiria a mais tolas das criaturas.

Deslizei o meu dedo pelas linhas escritas logo abaixo de um desenho que me transformava em um emaranhado de fios vermelhos, revelando apenas meus olhos.

"De pele diáfana, olhos ilícitos e cabelos num vermelho fogo. — Sorri sozinha com aquela descrição. — Se o mundo tivesse um terço do calor que ela me desperta quando me olha nos olhos, de certo, ele queimaria. Que vida resiste a tua mera presença?".

Engoli em seco, já tendo perdido aquele sorriso idiota.

— Espero que a sua resista, Théo. Ao menos a sua.

Já tinha retirado da mochila tudo necessário para o ritual e disposto no chão ao meu lado. Posicionei-me na beirada da cama e antes que o ferrum sanctu lhe queimasse, depositei um beijo rápido na pele exposta como um pedido prévio de desculpas.

Senti o fio de magia aquecer meu corpo enquanto eu murmurava aquele cântico, me esforçando para a que cada palavra saísse com exatidão. Não poderia permitir que houvesse o mínimo erro. Théo arregalou os olhos no exato momento em que a agulha tocou sua pele e talvez tivesse gritado se a planta que eu queimava como incenso, não tivesse inundado suas narinas, fazendo-o adormecer novamente.

Mordi o lábio involuntariamente.

— É para o seu bem, anjo, então desculpe-me.

Minha tentativa em tornar aquele processo o menos doloroso possível teria sido o responsável pela demora, mas quando o sol aqueceu-se ao longe, a marca brilhava em preto e vermelho – pelo sangue que surgira eventualmente.

As Crônicas do Caos - Perdição (EM REVISÃO)Where stories live. Discover now