Capítulo XLIV

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— Não deveríamos ter vindo. — Respondi a Lucius, chutando a grama sob meus pés.

— Claro que deveríamos. — Ele refutou. — Você fez uma promessa.

— Eu fiz muitas promessas.

Os ombros dele subiram e desceram, eu deveria entender sua consternação, ele estava fazendo isso por mim acima de tudo.

— Nesse caso, pode ser um bom momento para começar a cumpri-las.

— Ainda assim é perigoso. — Falei por fim, não querendo dar-me por vencida.

Novamente, ele deu de ombros.

— Essa é nossa realidade, não é? Acostume-se.

— Mas Marcus...

— É por isso que trouxemos ele, Fine. Você é cautelosa demais para um demônio.

Lucius apontou para o homem que sacudia o braço discretamente balbuciando que "a área estava limpa". Edgar Allan não era tão ruim, afinal.

Já se faziam duas semanas desde que havíamos deixado Andorra e tudo o que isso significava. E o mesmo tempo desde que Edgar tinha nos asilado. Por isso, talvez, parecesse uma ideia estúpida a de voltarmos até aqui.

Mas ainda assim, era onde estávamos. Sentados em cadeiras metálicas, no pátio a frente ao Colégio de Santa Coloma de Andorra, com uma vista um tanto privilegiada do palanque que ocupava a entrada e que ostentava uma fileira de freiras.

Apertei levemente a mão de Luc quando percebi que nossos olhos haviam encontrado o mesmo objeto.

O quadro que estampava o rosto de Madeleine não fazia jus a beleza que tinha se transformado em pó.

— Aquela era... — Questionou Edgar. Respondemos um sim uníssono. — E aquele é o...

— Sim. — Lucius respondeu sozinho desta vez.

O mero vislumbre daquela silhueta já havia me desnorteado. Minha boca havia ficado seca e minha bile subiu alto o suficiente para imaginá-la saltando para fora de mim. Finquei minha vista ao chão e me limitei a ouvir a reação de Edgar a aquilo que acontecia.

Nome por nome começou a ser chamado ao palanque. Tantos familiares. Jessica, que saltitava risonha, Arthur que ainda carregava um olho roxo e Lucius gabou-se por isso (e me convenceu a usar um tanto de magia, somente para rirmos discretamente dele no chão), Catarine que parecia confortavelmente feliz, o de Madeleine – ressaltado in memoriam que nos fez tremer novamente, e o dele.

A voz de Lucius me retirou de meus devaneios.

— Tem certeza que não quer vê-lo?

— Tenho. — Afirmei com força.

— Nem uma espiadinha?

— Não me tente, Lucius.

Eu sentia uma pitada de sua frustração se disseminando no ar. Eu ainda podia vê-lo, mesmo que a distância, isso era mais do que ele poderia dizer.

— Como ele está?

— Bem, ele está sorrindo... Então acho que ele está feliz.

A tristeza veio rápida e rasteira. Prendeu-me em seus braços fortes e me consumiu como tinha se tornado costumeira de fazer.

Ele estava feliz. Mesmo sem nós.

— Não existe mais nós. Não existe.

Eu sussurrei para mim mesma. Vinha repetindo a mesma frase desde que tudo tinha ocorrido. Mas a ferida parecia não chegar nem perto de cicatrizar.

As Crônicas do Caos - Perdição (EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora