Capítulo 10:O que os olhos veem, o coração sente

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O sol já estava baixo quando Derek saiu no encalço de Roshlyn juntamente com  um grupo de cavaleiros liderados por ele, disfarçado com uma longa capa escura e montando um cavalo de montaria comum ao invés de seu portentoso cavalo branco de guerra.
Antes de sair pediu a todos os presentes que a conversa não saísse daquela sala. Era imperioso que ninguém soubesse da possível fuga de Roshlyn.
A decisão da princesa foi uma surpresa para Derek. Nunca poderia imaginar que ela tomaria uma decisão como essa, sendo tão tímida e reservada.
Sabia que não era um noivo dedicado e mal haviam trocado meia dúzia de palavras ao longo daqueles meses...Mas aquela relação que eles tinham, era um mero cumprimento de dever.
Havia prometido a sua mãe que se casaria após o inverno para dar continuidade ao legado da sua família.
Sua escolha por Roshlyn foi incoerente, passiva e imprevisível, ele sabia.
Existiram muitos reinos com filhas em idade de casar que dariam tudo para tê-lo como suserano. Mas o que se passou com ele naquela noite foi apreciar  a postura distante e tristonha de Roshlyn,. Ela era um desafio, e ele não costumava fugir de desafios.
Roshlyn era diferente de todas as mulheres que ele comumente se relacionava. Ela já estava em idade avançada para o casamento, iria fazer vinte anos em breve. Mas a sua figura elegante e simples, haviam chamado sua atenção. Ela tinha o porte altivo de uma lady e um ar melancólico, quieto e aparentemente apaziguador.
Não tinha feito certo ao escolhê-la. -Pensou enquanto cavalgava observando com atenção tudo ao redor.
Eles eram como água e vinho. Mas agora estava feito. Seu casamento com ela era um fato e envolviam muitas questões políticas e econômicas que seriam profundamente prejudicadas se ele tomasse a decisão de romper com o acordo. -Está feito. -Pensou com um peso estranho no coração.
..
O pequeno grupo de busca percorreu a estrada que levava a Havema, sem encontrar nenhum vestígio da princesa.
Algumas vilas permeavam o caminho e as pessoas ficaram curiosas com as perguntas feitas pelos cavaleiro do rei.
Achavam que procuravam meliantes devido a feira que haveria em Craig ou talvez  procurassem alguma  jovem nobre do castelo, que se aventurara por aqueles sítios. Com medo e inseguros deram todas as informações que se lembravam e ninguém se lembrava de ter visto um donzela num cavalo por aqueles lados.
Afastando-se um pouco, Derek ficou pensando para onde Roshlyn iria ? Era óbvio que ela não voltaria para o castelo de seu pai, já que lá, com certeza não seria bem recebida.
Para onde ela iria?
Derek então lembrou-se que Roshlyn gostaria de ir para um convento antes da proposta de casamento. Possivelmente era para lá que ela estava fugindo!  E isso era uma questão delicada, já que se ela adentrasse as portas do convento, dependendo da força política da abadessa, ele não poderia resgatá-la
-Cavalaria! Vamos pegar a estrada para Jaffrez!
..
A estrada para Jaffrez era circundada por fileiras e mais fileiras de abeto, tornando-a um lugar escuro  e úmido. Roshlyn estava cansada de cavalgar e decidiu descer da montaria e ir seguindo a pé segurando as rédeas do cavalo.
Sua mente estava cansada de pensar no que havia visto aquela manhã.
O rei era um homem depravado! Acordou pela manhã, pela primeira vez em muito tempo bem disposta, aceitando  inclusive que Bozena enfeitasse seus cabelos com flores e ervas que agora ornamentam sua cabeça como uma coroa de flores secas e murchas.
Ao passar por uma árvore grande com o tronco exposto, decidiu sentar para descansar.
Seu dia terminou no momento que passava pelo corredor e viu o rei tendo relações com uma criada ruiva que ela conhecia como Henriet.
Os boatos eram que a criada jurava que um dia viria ser a concubina do rei e como a rede de intrigas num castelo é muito comum, num dos jantares, algumas mulheres da nobreza, por maldade humana, ou simplesmente informação gratuita, trataram de avisa-la.
No momento não se importou. Boatos correm solto e as pessoas preferem sempre falar sobre os outros do que de si mesmos.
Apesar de ter ouvido falar sobre os comportamentos do rei e ela mesmo tendo visto no seu reino do que ele era capaz , resolveu deixar para lá.
Mas ao ver novamente com seus próprios olhos, o rei tendo relações íntimas com uma mulher que era dia criada e num momento de difícil adaptação, ela simplesmente decidiu fugir. E o fez.
A sensação de já ter visto aquela cena a deixou sem fôlego. A intimidade dos dois a impactou deveras. Saber que ele usava uma outra mulher sob o mesmo teto onde estava sua noiva a abateu profundamente.
-Seu lugar não era ali! Não podia-se submeter a essa humilhação!
Lembrou-se do sofrimento de sua mãe, quando ainda era uma menina, e via a Rainha chorando em seu quarto de vergonha dos insultos e desacatos que as mulheres de seu pai faziam com ela.
Mas sua mãe amava seu pai. Talvez, por isso ela sofresse daquela maneira tão desesperada.
Mas ela não amava o rei Derek. E nunca o amaria! Ele era um homem dado ao pecado da luxúria e da fornicação.
Ela nunca o amaria!
Depois de passar um tempo tentando assimilar o encontro profano, ela decidiu enfim, que não valia a pena continuar vivendo naquele lugar. Iria para onde deveria ter ido desde o início: para Jaffrez. Esperava que a Abadessa Dionisia a recebesse com alegria e não a devolvesse ao seu pai ou o pior dos casos, ao rei de Craig.
Nesse momento, seu estômago deu sinal que estava com fome. Ao longe, ela ouvia os barulhos da noite, pios de coruja, sapos coaxando e ela começou a pensar se haveria algum animal noturno perigoso que pudesse importuná-la.
A sua reação foi impulsiva, ela sabia. E talvez corresse perigo estando ali, no meio de uma floresta desconhecida com tantos atalhos amedrontadores.
-Talvez essa fuga não tenha sido uma boa ideia. -Ela disse a si mesma.
Como seu estômago parecia pedir clemência mais uma vez, ela tirou de dentro de seu alforje uma maçã. A comeu como se fosse um banquete. Era suculenta e macia. E ela devorou a fruta em pouco tempo.
-Se tivesse mais duas, eu comeria. -Pensou inquieta.
Por alguns dias, ela seria capaz de aguentar ficar com fome. Desde dos quatorze anos, ela havia passado tantas dificuldades com as amantes de seu pai para se alimentar, que isso não a assustava. E afinal de contas, não deveria estar tão longe do convento de Jaffrez. Não. Na verdade ela não sabia.
- Oh meu Deus! Faça que eu ache o caminho e que que nenhum mal me encontre por esses caminhos.
A noite estava clara e a lua encoberta por nuvens. Talvez fosse chover. Aquele tempo era incerto nessa época do ano. Desanimada, Roshlyn encostou a cabeça numa árvore. Os barulhos da noite eram tão assustadores... ela se enrolou na sua velha capa de lã. Estava com frio, e o sereno caia devagar, quase sem perceber.Um vento frio começou a soprar por entre as árvores e ela pensou em descansar apenas cinco minutos. Descansaria e partiria rumo ao seu destino original.
-Oh senhor... não me desampare... por favor me envie um sinal de sua atenção comigo...
E sem terminar sua pequena oração, Roshlyn fechou os olhos e dali a alguns minutos dormia um sono profundo.
...
Derek estava determinado a achar Roshlyn. Por mais que não quisesse se preocupar, não havia como não pensar que alguns coisa de grave podia lhe acontecer. A lua estava clareando o caminho entre as árvores densas, mas de repente, a claridade foi diminuindo, e ele sabia que em pouco tempo haveria uma tempestade, e como Roshlyn não conhecia aquela rota, fatalmente, ela se depararia com o rio grande a sua frente, e ele era fundo e extremamente perigoso até para quem o conhecia. Ainda mais quando ficava muito cheio pelas águas da chuva.
Apressou o galope, enquanto uma coruja soltou  um pio lúgubre ao longe. Ele sentiu um arrepio na nuca.
-Onde andará Roshlyn? Será que eu a encontrarei ? Sim! Eu a encontrarei!
Quando virou uma curva à direita, viu a égua jezebel pastando amarrada numa árvore.
Mas isso não deu a ele a tranquilidade que ele esperava. Se a égua pastava sozinha, o que poderia ter acontecido a Roshlyn?
Antes que seu cavalo parasse a corrida, com destreza, ele soltou da montaria, porém tropeçou num amontoando de lã e carne humana.
Roshlyn acordou sobressaltada e se viu cara a cara com o rei.
Ambos se olharam por um tempo. Um tempo que pareceu longo demais para Roshlyn . Ela quase não podia vê-lo na escuridão, mas podia sentir seu corpo quente e másculo em cima do seu.
—Olh! Por favor Vossa Majestade, assim vai quebrar meus ossos.
Derek a olhou entre assustado e divertido.
-Então é assim que trata sei cavaleiro salvador?
Tímida, Roshlyn colocou a mão sobre o seu peito para afastá-lo de si. Ele olhou para suas mãos pequenas e ela as retirou imediatamente.
-Perdão Milorde.
Ele então se levantou. Ela era bem pequena e seu corpo se moldou ao dele perfeitamente, o que na verdade, o deixou intrigado.
Roshlyn imediatamente se levantou e ficou com a cabeça abaixada em sinal de respeito, enquanto torcia as mãos nervosamente.
-Então esse é o sinal que o senhor me enviou. Só me resta voltar ao castelo e aceitar com resignação o meu destino.-Pensou Roshlyn com tristeza
Enquanto os cavaleiros esperavam pelos acontecimentos, e por uma atitude do rei, procuravam disfarçar a curiosidade sobre o que acontecia ali.
Então, Derek montou seu cavalo e ofereceu a mão para Roshlyn.
Depois de um longo tempo, ela estendeu a mão e subiu na montaria de lado, sentando-se na frente do corpo musculoso e vigoroso.
Ele sentiu a surrada capa de lãnestava molhada e num repentinao, acretirou jogando-a no chão.
Roshlyn tremeu de frio e se encolheu. Derek então a envolveu com sua capa, e ela sentiu um conforto misterioso. Estar ali tão perto dele, sentiu-se estranhamente segura.
Passado algumas horas, o ritmo cadenciado da montaria a fez ficar sonolenta.
De repente, ouviu a voz do rei dizer baixinho:
-Nunca mais fuja de mim.
Com os olhos quase fechando, e lutando para permanecer ereta e não recostar no peito robusto e forte, ela pensava se deveria responder ou não aquela afirmativa.
Diria a ele o que viu? Diria de seu desconforto e insegurança? Diria a ele da humilhação duplicada que vivera em menos de um ano? Diria do horror de ver seu corpo fornicando depravadamente com outra mulher?
Com os olhos quase fechando, ela respondeu.
-Não, milorde.

O Rei ProfanoWhere stories live. Discover now