Cinquenta e nove

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Samuel abriu a porta do carro e jogou a bengala para o banco de trás, sentou e bateu a porta do carro com mais força do que gostaria, jogou a pasta com a logomarca da clínica no banco ao lado. Soprou um pouco de ar, tomando fôlego em seguida, abaixou a cabeça enquanto fechava os olhos.

Passou a mão nos cabelos, empurrando os fios para trás, balançando a cabeça em negação. Estava inquieto, o coração batia acelerado e seu estômago estava sensível, como se pudesse começar a ter enjoos a qualquer instante, mas não acontecia.

Seu celular tocou no bolso da jaqueta e precisou fechar os olhos quando sentiu uma súbita vontade de pegar o aparelho e jogar pela janela com toda sua força. No entanto, apenas ignorou, porque não não tinha condições de falar com quem quer que estivesse ligando.

Respirou fundo duas ou três vezes, apertando os lábios quando uma onda de dor fluiu das suas costas para as laterais.Tirar a roupa e expor aquelas malditas cicatrizes para alguém que não era seu marido. A postura do médico com certeza lhe manteve firme naquele momento e quase o fez acreditar que não era nada demais, mas a palpação dos rins foi um inferno. 

Em primeiro lugar, havia a sensibilidade daquelas malditas cicatrizes, quer dizer, foi realmente constrangedor quando teve um sobressalto logo no primeiro contato da mão com a pele deformada.

O Dr Leocádio começou a falar onde tocaria e demorava mais no contato sutil, dessensibilizando a pele antes de realmente apertar onde precisava e tentar sentir seus rins. Quando pensou que a pior parte tinha passado, teve o gel frio da maldita ultrassonografia.

Agora tinha aquela dor nas costas, porque aparentemente tinha algum problema nos rins, que honestamente não tinha o mínimo interesse em saber, mas que aparentemente causava inflamações e dores. Certamente a palpação teve efeitos negativos, afinal o médico realmente sentiu parte dos seus rins, mesmo que fosse difícil.

Enfiou a mão no bolso, sentindo a pequena caixa de remédio que o médico lhe entregou. Era apenas uma amostra grátis, com poucos comprimidos, ele falou algo sobre sua adaptação ao estimulante e efeitos colaterais tendo em vista suas comorbidades antes de seguir com o tratamento, mas não acreditou muito nisso. Honestamente, aquilo pareceu um subterfúgio para que voltasse para uma consulta de retorno, mas as artimanhas do médico não eram importantes, pois sua mente estava cheia de pensamentos sobre o motivo que o fez se expor e se abrir, mesmo que apenas parcialmente para um médico.

Samuel abriu os olhos enfim, observando através do parabrisa, olhando fixamente um ponto qualquer no muro branco que ladeava o estacionamento. Sua mente voltou ao bangalô na praia, revivendo as lembranças embaçadas pelo whisky, o calor que sentiu por dentro quando ele virou de costas, mostrando as nádegas definidas e totalmente nuas na jockstrap. Sabia o que ele queria desde o começo, mesmo que ele dissesse que só estava provando a peça nova. 

Lembrava de como ele estava incomodado com a jockstrap e não permitiu que ele tirasse mesmo assim, até o masturbou por cima do tecido. Isso devia ter sido tão incômodo, só podia imaginar se ele ficou muito dolorido depois, pois não teve coragem de perguntar. Podia usar a embriaguez como desculpa, mas a verdade é que foi absolutamente prazeroso ver ele revirar os olhos e gemer tão bem enquanto forçava um pouco os limites. Tudo bem que às vezes Toni era muito óbvio sobre o que fantasiava e não ia dizer isso a ele, mas parecia errado tratar seu marido daquela forma. 

Tirou a caixinha de remédio do bolso. "Citrato de Sildenafila 25mg", estava escrito em letras garrafais azuis, logo acima da faixa vermelha onde se lia "venda sob prescrição médica". Tinha que fazer isso sóbrio e totalmente lúcido, precisava ter discernimento para não agir como um perfeito imbecil outra vez. 

Toni esperou que algo como aquilo acontecesse por anos. Ele tentou esconder a intensidade dos próprios anseios ao longo do tempo, mas a frustração estava apenas enlouquecendo ele aos poucos. Sorriu com amargura ao pensar naquela experiência estranha no bangalô, o jeito cabisbaixo e introspectivo que ele ficou no dia seguinte. A imagem dele sentado na beira da cama com os ombros caídos não saía da sua mente e teve aquele olhar conformado quando caminharam até o restaurante e um sorriso um pouco triste.

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