Capítulo Vinte

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A Pensão da Magnólia era um negócio familiar, existia desde a época da morte de Otoniel, pai de Toni. Desde então cada membro da família tinha obrigações com os negócios. Desde ir ao banco pagar as contas, até as coisas mais corriqueiras, na manutenção do lugar. Não havia empregados ou nenhum tipo de colaborador. As vezes Carmem ou alguma outra inquilina mais antiga ajudava nas tarefas domésticas, mas para isso contavam com um generoso desconto nos pagamentos pela estadia. Se bem que, Carmem estava ali a tanto tempo que era praticamente da família.

Em resumo, Luz assumiria suas obrigações como membro da família Neves, sem exceções, sem preferência ou suavidade.

"Se ela tem idade para esconder macho dentro de casa, tem idade para pegar no batente como todo mundo", foram as palavras de Toni quando conversavam sobre a decisão ainda no estúdio.
Samuel não o contrariou apesar de achar as palavras fortes e muito pesadas para descrever a filha. Até olhou para o marido com brandura, pois conhecia Toni e sabia perfeitamente o que estava acontecendo.

Via a mesma reação abrupta e assustada nos pais de alguns dos seus alunos. Toni estava percebendo que era pai de uma menina e sua filha estava crescendo. O personal trainer estava ressentido com a forma escandalosa e indecorosa que descobriu isso.

Chegaram na pensão mais tarde que o habitual naquele dia, já era noite e o jantar já havia até acabado. Assim que passaram pela porta, Toni marchou direto para o quarto da menina, como um general de guerra, deu duas batidas firmes na porta e a convocou para o acerto de contas.
Luz tremia tanto que dava até pena, mesmo Toni se limitando a poucas palavras. Apenas ordenou que fosse se desculpar com a vó e já informou a mãe o novo status da menina na pensão.

Quando Samuel a encontrou no quarto, as gêmeas prontamente saíram e deixaram os dois sozinhos.

Luz ajeitou o cabelo atrás da orelha e cruzou os braços numa inútil tentativa de esconder o nervosismo.

— Aquilo foi perigoso, sabia? Se esconder com aquele rapaz no depósito no fundo do quintal — começou, muito calmo — Já imaginou o que ele poderia ter feito com você se ninguém te encontra? Eu fiquei preocupado.

— A por favor Samuel, me poupa! — rebateu muito insolente.

Mas o mais velho permaneceu calmo e inabalável. Atacar era o modo de Luz se defender, por alguma razão ela sempre achava que precisava se defender do músico.

— Eu estou falando sério.

— Ele não é assim tá legal! Tu que fica julgando as pessoas pela aparência! — acusou, cruzando os braços de forma infantil.

— Eu vejo isso Luz todos os dias, eu trabalho com adolescentes. Vejo meninas de doze anos grávidas, porque confiaram na pessoa errada. Diziam a mesma coisa que você está falando agora. "Ele não é assim", "ele gosta de mim de verdade". No fim, elas acabam com um bebê no colo, sozinhas, porque a família não dá o apoio que elas precisam num momento tão difícil.
Os olhos claros da menina se encheram de lágrimas imediatamente, foi instantâneo.

— É isso que tu vai fazer? Se por a caso eu aparecer grávida? Ou fizer alguma coisa errada? Vai fazer a cabeça do papai como fez hoje e vai me jogar na rua! Bela porcaria de irmão mais velho que eu tenho! — desabafou, incontrolável.
Samuel sentiu um nó se formarna sua garganta, um pressentimento ruim se apossou do seu corpo, mas seu rosto permaneceu imutável. Não demostrou nem por um segundo a bomba de adrenalina que explodiu no seu interior com aquelas palavras.

— Não. Não é isso que eu faria. Por mais que você me odeie, Luz, independente de qualquer problema de convívio que nós possamos vir a ter, você tem que se lembrar de uma coisa. Eu nunca vou deixar você desamparada. Você não tem que ter medo de ficar na rua ou sem teto. — explicou calmamente, se esforçando ao máximo para transmitir confiança.

Segredo de FamíliaWhere stories live. Discover now