Prólogo.

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     Eu nunca vou me formar no ensino médio. Eu nunca vou entrar em uma universidade para cursar psicologia. Nunca vou dá meu primeiro beijo, ou ter um namorado, nunca terei que enfrentar uma sogra, assim como o meu pai nunca vai entrar com uma filha em uma igreja.

     Nunca. Eu me acostumei com essa palavra, eu me agarro a ela com a mesma firmeza que um navio se agarra a uma âncora. É doloroso saber que eu nunca terei experiências tão simples e banais que todas as outras garotas terão.

     E o porquê disso? Eu fui assassinada, minha vida foi literalmente martelada para fora de mim. O meu fim se iniciou quando eu tinha catorze anos, quase uma década e meia, ela se foi tão cedo muitos disseram aos meus pais inconsoláveis. Sim, eu fui muito cedo e deixei amigos, família e até um amigo que eu pensava que teria mais tempo, para que ele deixasse de ser apenas amigo.

    Meu assassino, porém, acreditou que eu já havia tido tempo suficiente na Terra, eu nem havia entrado no ensino médio. Eu nem tive tempo para desabrochar, como minha tia havia afirmado que aconteceria quando eu debutasse. Mas o meu assassino, também conhecido em meu bairro como senhor Carl, precisava satisfazer sua necessidade.

     Então, depois que minha mãe cuidou de sua amada roseira e disse que eu podia continuar pedalando até a hora do jantar, ele saiu da sua casa que ficava em frente à minha.

     Meus cabelos castanhos avelã voava a cada curva que eu fazia, eu fechava meus olhos tão escuros que mal dava para ver a pupila, apenas para sentir o vento. Minha pele bronzeada de um legítima moradora do litoral deve ter atraído sua atenção, assim como as moscas são atraídas para a carne podre.

  — Olivia, poderia me fazer um favor? – ele diz com aquela voz de tio que apenas visita no natal. – Comprei um presente para minha sobrinha que mora em outro estado e queria que visse, para me dá um ponto de vista mais parecido com o dela...

    Eu entrei, que problema haveria? Meus pais o conhecia, a rua toda o conhecia, ele era de confiança. Um homem bom, meu pai disse em um jantar qualquer. Levei minha bicicleta em meu próprio jardim e segui até a casa do senhor Carl. Ele trancou a porta e me violou, da pior maneira possível, minha inocência foi arrancada de mim.

     Meu estuprador precisava terminar o serviço, então com um martelo – que eu já tinha visto construir uma amável casa para passarinhos –, ele afundou meu crânio, minhas costelas e outros ossos dos quais eu não tenho conhecimento, pois minha vida já tinha se esvaído e pairava em algum lugar desconexo.

     Meus pais me procuraram feito loucos, moveram toda a comunidade em buscas por todo estado, mas meu corpo estava bem na casa da frente. Sujo e vazio, enquanto meu assassino fingia me procurar como todos os outros.

    Eu queria gritar. Pai! Mãe! Meu corpo está aqui na casa da frente, ou quem sabe pedir para pararem de me procurar. Eles nunca me achariam.

      Dias depois de minha morte, meu assassino saboreava cada detalhe de seu crime, cada cena se passava em sua mente e ele deliciava com aquilo, sentia o sabor com prazer. Ele encontrou a oportunidade perfeita para se livrar de meu corpo sem utilidade. Esgueirando-se na sombra, não por vergonha, mas por desejo de cometer o crime outras vezes.

      Meus pais nunca me encontraram. Outros me encontraram e eu fui restaurada. Minha vida foi devolvida, novas habilidades me foram dadas e vivi em paz em um planeta pacífico e caloroso. Uma alienígena foi mais caridosa comigo do que minha própria espécie.

      Quatro anos se passaram, e deixei para trás um passado doloroso, ou tentei deixar. Eu não sou mais Olivia Merlim, agora me chamo Projeto Lyra, minha restauradora fez de mim seu projeto favorito, implantou genes e realizou transformações. Não, eu não sou uma cobaia, minha restauradora faz isso para que eu me torne mais forte e melhor adaptável. Para que ninguém possa me machucar outra vez.

      Estava tudo perfeito, eu tinha me adaptado, feito amigos. Eu estava feliz. Até que o Mortium chegou, o vírus estava contaminando todos os planetas do Conselho, incluindo Saudia onde eu estava abrigada.

      Rapidamente a cura foi descoberta, mas ainda era necessário sua obtenção. E a cura estava na Terra, sendo mais específica, estava nos cérebros humanos. Para salvar o grupo de planetas mais pacíficos e desenvolvidos que já existiram, os humanos deveriam ser extintos.

      Justo. Os humanos se matam, e mesmo os bons são corruptíveis e podem se tornar maus. O final da raça humana será digna, já que eles proporcionarão a cura para seres perfeitos. Espécies que não abandonam ou fazem os outros sentirem dor, seja ela física ou psicológica. É o curso natural da evolução.

     Humanos devem ser extintos e eu participarei disso.

EXTINÇÃO Where stories live. Discover now