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- Eu sinto muito, projeto Lyra. - ele responde.

A primeira coisa que eu vi, quando eu nasci pela segunda vez, foi os olhos dela. Eu tinha catorze anos e minha última lembrança era meu corpo sendo violado e as marteladas em minha face, eu acreditei que aquilo era o fim, mas a vida preencheu meu corpo novamente e foi as mãos dela que me encheu. Quando eu abri os olhos, ela estava lá, com sua cabeça e olhos em formato de amêndoas, pele cinza e dedos tão compridos quanto meu antebraço. As frestas oculares exibiam olhos negros e gentis, talvez a primeira reação de qualquer um fosse o medo ou espanto.

Mas a única que eu pude sentir ao me deparar com a imagem daquela criatura tão diferente de mim, foi amor. Um amor intenso me tomou, gratidão e empatia me inundaram quando a criatura tentou falar algo comigo em meu idioma, eu ri. Foram quatro anos de aprendizado, todas as conversas repleta de sabedoria todos os melhoramentos para que eu me adaptasse. Nos meus dois primeiros anos, minha restauradora abandonou os outros projetos para se dedicar unicamente a mim. Ela me adotou como uma filha, assim como eu a vi como uma mãe. E agora ela não se lembrava de mim, ou de qualquer outra coisa, estava contaminada.

- Projeto Lyra?! - o Conselheiro me chama pela terceira vez.

- Desculpe, sim? - respondo enfim.

- Como eu ia dizendo, alguns sinais de socorro foram emitidos. -  ele começa.

- Algum de minha restauradora? - pergunto ansiosa por uma resposta afirmativa.

- Infelizmente não. - ele diz - O que eu proponho é que mandemos uma equipe de humanos alterados por nossa tecnologia, para o resgate dos sobreviventes. Depois, colocamos o planeta em quarentena e esperamos a cura.

- Nós sabemos das atitudes agressivas que os contaminados têm, não seria arriscar vidas indo buscar sobreviventes, cujo o número é tão diminuto. - Tomaz pergunta olhando fixo para o Conselheiro - Não seria mais adequado colocar o Saudia em quarentena de imediato.

- Está sugerindo abandono? - saudaciana abalada questiona - Nós não fazemos isso! - os outros concordam com a saudaciana.

- Mas eles são agressivos! - o amberiano diz encarando a todos com sua meia dúzia de olhos.

- Eu...- o Conselheiro começou a falar, então ele abaixou a cabeça e fechou os olhos, logo após ele abre os olhos e encarou a todos vidrado, parecia um computador sendo reiniciado - Me desculpe, estou muito cansado toda a situação. - ele falou voltando ao normal - Caso exista agressividade por parte dos contaminados, a equipe mandada para resgatar os sobreviventes deve revidar.

Todos ficaram espantados com a declaração, como ele podia autorizar uma ação agressiva, isso era fora dos padrões do Conselho não podia existir! Eu não conseguiria machucar nenhum um outro ser, nunca.

-A reunião está encerrada, experiência Tomaz vá e prepare a ação. O projeto Lyra deve apenas participar na linha de frente do esquadrão.- ele concluiu.

Eu vou para meu quarto na Central.
Qual tinha sido a última vez que eu  machucara um ser vivo? Seria hipocrisia de minha parte dizer que nunca, pois eu comia carne quando morava na Terra - todos os sábados eu e minha família íamos a um parque próximo e desfrutavámos do melhor cachorro- quente do mundo, depois disso minhas agressões a seres vivos eram sempre direcionadas ao meu irmão mais velho, mas era sempre coisa boba, brigas naturais. No entanto, desde minha chegada, me tornei vegana e meus atos para com outros foram sempre gentis.

- Lyra? - a voz de Tomaz me tira de meu devaneio. Ele havia entrando pela porta aberta do meu aposento.

Os olhos dele são de um verde tão bonito que eu poderia admirar o dia inteiro, principalmente quando as pupilas estão pequenas devida à iluminação, é como se ele tivesse pequenos discos de esmeraldas ao invés de íris.

EXTINÇÃO Where stories live. Discover now