Capítulo I

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Haiti – Seis anos antes

RICHARD

— Faltam menos de dez dias para irmos para casa, Richard.

— Finalmente! — Sorrio para o Rodrigo. — Sei que fui eu quem quis vir e gosto do que faço, mas...

— Mas é cansativo. — Ele suspira. — E estou com saudades da minha família.

— Nem me lembre disso! Estou há mais tempo que você aqui. Faz dois anos que não vejo a minha família.

— Imagino como deve ser horrível para você. Estou há menos de um ano aqui e já não aguento de saudades das minhas filhas, tirando a parte que eu nem ao menos conheço minha Rebecca pessoalmente.

— Isso é bem complicado. — Suspiro.

— Também acho. Mas, e aquela garota... — Ele coloca a mão no queixo, pensativo. — Como é mesmo o nome dela?

— Quem? A Amanda? — Ele concorda com a cabeça. — Ela me escreve às vezes.

— Mas vocês não tinham terminado?

— Sim, porém ela ainda insiste. Diz que sente a minha falta.

— Mas e você?

— Eu só a ignoro. Ela só namorava comigo por conta da minha aparência e do meu dinheiro. — Reviro os olhos. — Ela é muito interesseira.

— Tem certeza que ela não gosta de você? Às vezes você a julgou mal, Ric.

— Certeza? — Ergo uma sobrancelha. — Esqueceu que uma semana depois que eu cheguei aqui ela foi se agarrar com aquele sargento?

— Esqueci, desculpa mesmo. Ela não vale nada.

— Exatamente. E eu sei que sou bonito e posso ter a mulher que eu quiser. — Sorrio.

— Convencido.

— Realista.

— Sei. — Ele revira os olhos e dá um sorriso.

— Posso saber o que os dois rapazes estão conversando? — pergunta Diego, vindo em nossa direção.

— Nada. Estávamos comentando sobre a viagem de volta, que está perto — digo.

— Ah sim, finalmente! — Ele sorri.

— E estávamos comentando sobre como o Richard é iludido — acrescenta o Rodrigo.

— Eu? Iludido? — Ergo uma sobrancelha. — Eu sei que sou lindo.

— Iludido — concorda o Diego.

— Isso é inveja, Dieguinho. — Dou um soco de leve no ombro dele e sorrio.

— Não mesmo. — Ele sorri de volta.

— Mas e você e a Mariana? — pergunta o Rodrigo.

— Ela voltará para o Brasil também na semana que vem e aí veremos como vamos ficar.

— Diego se deu bem, hein. Pegou a mulher mais gata daqui. — Sorrio.

— Mais respeito, Richard! Ela é a tenente! — Diego responde.

— Mas não deixa de ser linda — concorda o Rodrigo.

— Um pai de família falando essas coisas? — Diego sorri.

— Amo minha mulher e ela é linda, mas não sou cego.

— Que amigos maravilhosos que vocês são! — Diego revira os olhos.

— Vamos comer logo. — Rodrigo me empurra em direção à saída dos dormitórios.

— Ok! — Sorrio. — Vamos comer.

Seguimos em direção à fila, pegamos nossos pratos e talheres e sentamos em uma mesa com outros soldados.

— Estou há dois anos sem comer pizza. — Diego suspira. — A primeira coisa que vou fazer quando chegar ao Brasil será ir a um bom rodízio para me fartar.

— Acho justo — comento. — Não aguento mais essa mesma comida. — Mexo minha sopa intocada com a colher.

— Atenção, todos! — Ouço a voz do coronel soando através dos alto-falantes. — Novamente um grupo de rebeldes está vindo em nossa direção para tentar atacar a base. Peço que vocês peguem suas armas e se preparem.

— De novo. — Diego revira os olhos.

— Lá vamos nós. — Suspiro.

Pego minha arma, seguido pelo Diego, e vou para o lado de fora de nosso acampamento. Há um grupo de uns trinta rebeldes se aproximando.

— Pelo menos estão em menor quantidade — comenta meu amigo.

— Pelo menos isso — concordo.

Começa uma habitual troca de tiros entre meus colegas e o grupo de rebeldes. Vejo que um rebelde se aproxima e o acerto na perna, fazendo-o cair no chão. Preparo-me para atirar em outro rebelde.

— Não! — diz o Diego. — Olha!

Enxergo o que ele está dizendo. Um dos homens está segurando uma granada nas mãos.

— O que... — Mas antes que eu conclua a frase, uma mistura de areia, fogo, fumaça e claridade invade minha visão.

Sinto-me sendo atirado ao chão com o impacto da granada. Tento me levantar, mas não consigo. Meu rosto queima. Não consigo nem ao menos me virar. Tento gritar, mas tudo o que consigo emitir pela boca é um baixo gemido de dor.

Estou estirado ao chão, não sei por quanto tempo. Talvez um minuto, talvez uma hora. Minha força se esvaiu e a dor só aumenta. Não consigo me mover, não consigo falar.

— Richard! — Ouço a voz do Rodrigo, mas não o vejo. Tudo o que consigo ver é o céu azul sem nuvens acima de mim. O dia está bastante quente. — Richard! Ai meu Deus, o que aconteceu com você? — Sinto-o ao meu lado. — Cara, você está bem?

Não consigo respondê-lo e antes de tentar dar algum sinal de vida, vejo pontos pretos dançando à minha frente. Será que este é o fim?

— Richard! Richard! Olhe pra mim! — Essas são as últimas palavras que escuto antes de apagar completamente.

A Primeira PétalaWhere stories live. Discover now