Capítulo XIII

539 44 0
                                    

Estados Unidos – Cinco anos antes

RICHARD

— Richard, vamos? Foi difícil conseguir uma hora com o cirurgião, não podemos nos atrasar — fala minha mãe, terminando de passar batom.

— Você tem certeza que ele vai conseguir consertar isso? — Aponto para o lado direito do meu rosto, encoberto por uma espécie de tala.

— Ele já fez coisas piores — diz minha mãe, um pouco incerta. — Ele vai conseguir resolver.

— Já é o terceiro médico e até agora nada, mãe! Cada um mexe um pouco e...

— Mas já está bem melhor, meu amor — ela me interrompe, acariciando meu braço. — Você já melhorou bastante desde que chegou.

— Não sei, mãe. — Suspiro. — Mas vamos lá. — Dou de ombros.

Ela concorda com a cabeça e guarda o batom na bolsa, seguindo em direção à porta. Vou logo atrás dela.

Meia hora depois, após enfrentar um pequeno engarrafamento, chegamos à clínica. De cara, vejo carros de luxo importados estacionados próximo ao local.

Assim que entramos, percebo diversos olhares em cima de mim, como de costume. Há em média dez mulheres na sala, provavelmente estão todas esperando para botar mais silicone nos bustos.

— Com licença — diz minha mãe para a recepcionista.

— Como posso ajudá-los?

— Marquei uma hora aqui para o meu filho, Richard Campbell.

— Tudo bem. — A mulher olha no computador. — Só um instante, o doutor já irá chamá-lo.

— Ok, obrigada! — Minha mãe diz e senta em uma cadeira vaga.

Não tem nem cinco minutos desde que chegamos ao local e uma mulher com roupa de enfermeira aparece à porta, chamando meu nome e avisando que o doutor está me esperando.

Levanto-me e minha mãe faz o mesmo. Seguimos em direção ao consultório.

Há uma maca e uma mesa com duas cadeiras para sentarmos. Atrás da mesa há um homem de aproximadamente cinquenta anos, mas com jeito de quem já fez uso de algumas plásticas.

— Boa tarde, senhor... — Ele olha na ficha. — Richard. E a senhora, quem é? — diz, sorrindo para minha mãe.

— Sou a mãe dele, Carolina, prazer — ela se apresenta, dando um sorriso educado.

— Prazer — o médico responde. — Mas, como posso ajudá-los?

— É o rosto dele — diz minha mãe. — Como pode ver, está enrolado em uma tala. Bem... — começa.

— Não gosto que os outros vejam o que há por baixo dessa tala — respondo friamente.

— Posso removê-la? — pergunta o doutor. Apenas aceno com a cabeça. — Sente-se aqui na maca então — diz para mim.

— Ok. — Dou de ombros e faço o que ele diz.

O doutor vem até mim e começa a remover a tala. Faz certa cara de espanto, porém reage de forma menos alarmante do que os demais.

— Já vi casos piores — diz.

— E o senhor consegue consertar isso, doutor? — fala minha mãe, esperançosa.

— Não posso dar cem por cento de certeza, mas podemos tentar. — Ele me olha. — Como isso aconteceu?

— Bomba — respondo.

— Como assim? — pergunta.

— Meu filho trabalhava para o exército brasileiro. Ele estava em missão no Haiti e aí uma granada explodiu próxima a ele — minha mãe responde antes que eu consiga sequer abrir a boca.

— Entendo, que pena — diz o médico. — Mas essa não é a sua primeira cirurgia para tentar modificar isso, estou certo?

— É a terceira. — Suspiro.

— Ok, me deixe analisar isso melhor. — Fico imóvel enquanto o doutor analisa meu rosto. — Vamos marcar a cirurgia para semana que vem, tudo bem? Por sorte, houve uma remarcação, então há uma vaga sobrando. Você consegue fazer estes exames aqui até lá? — Mostra-me uma folha.

— Eu fiz todos há menos de um mês. — Pego o envelope com os resultados dos meus exames das mãos da minha mãe e entrego ao homem.

O doutor observa com atenção toda a série de exames que fiz para levar a outro médico anterior a dele, o qual acabei desistindo de ir na consulta por não gostar muito. Depois de um tempo, ele analisa novamente as feridas e enfaixa meu rosto com uma nova tala. Por fim, volta para sua mesa, escreve em um papel e o entrega para minha mãe.

— Entregue isto na recepção, por favor.

— Pode deixar — diz minha mãe, sorrindo enquanto pega o papel. — Muito obrigada, doutor. — Levanta e aperta a mão do homem.

Desço da maca e vou em direção à porta sem falar nada. Não estou com ânimo para me despedir do médico. Para ser sincero, depois que o acidente aconteceu, as granadas explodiram e meus amigos morreram, eu não tenho mais ânimo para nada.

A Primeira PétalaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora