Capítulo 19

2.9K 261 111
                                    

  Sou demasiado orgulhoso para acreditar que um homem me ame: seria supor que ele sabe quem sou eu.  - Nietzsche


Laura

Acordo sobressaltada. Olho ao redor, como de costume, e respiro profundamente. Passo a mão pelo rosto e mordo meus lábios. Hoje é o quinto dia consecutivo que sonho com ele. Apesar do bom senso e consciência terem freado os outros sentimentos selvagens e primitivos, minhas células ainda o anseiam.

Acordei antes do despertador. Por mais que eu tente, não conseguirei dormir novamente. Levanto-me e ando pela casa. É o efeito dos meus sonhos. Esses sonhos enigmáticos que tenho com o Bruno tiraram meu sono durante toda a semana; acordava, aproximadamente, às cinco da manhã e minha mente recusava-se a relaxar novamente. Quando meu corpo traidor lembrava-me de suas carícias, não resistia à tentação de me tocar, de seguir sua voz e guiar meus dedos para o meu prazer. Ao atingir o orgasmo, sentia-me mais solitária ainda, de maneira que me arrependia por ter terminado. Mas não posso ser leviana e brincar com o meu coração, nem com o dele, se é que sente alguma coisa por mim. Sigo, portanto, firme de que apenas sua amizade me bastará.

A semana passou arrastada. Tentei me doar ao máximo para trazer meus alunos para mundo literário, mas ainda não obtive sucesso. Alguns deles ainda continuam determinados a zoar a aula inteira. Ignoram o ensino e não se esforçam nem para chegar no horário, e isto tem me preocupado além da conta.

Daiane, por outro lado, foi escolhida para representar a turma. A cada dia que passa, admiro-a mais. Seu esforço, dedicação e entusiasmo têm incentivado também a outros jovens. Agora ela lidera uma equipe de estudos e também auxilia alguns alunos com elevado grau de dificuldade. Apesar de ter se submetido a uma educação de má qualidade, Daiane consegue se superar a cada dia. Os erros gramaticais são raros, e agora já consegue expressar uma ideia coerentemente.

Passamos a semana praticamente grudadas. Depois de ministrar as aulas, íamos juntas para a instituição. Ela tirava dúvidas da "confusa língua portuguesa" em nosso tempo livre. Contei sobre as viagens que fiz e sobre as obras que mais gostava; ela parecia se deliciar a cada nova história. Também lemos poemas uma para a outra. Devo dizer que ela foi uma luz para a minha solidão. Conheci mais que uma aluna, encontrei uma amiga mais que especial. Mesmo com o surgimento dessa amizade acolhedora, não ousei perguntar sobre sábado passado, quando um hematoma estava encoberto pela maquiagem em seu rosto. Isso ainda me aflige.

Daiane é reservada demais. Várias vezes peguei-me falando além da conta, enquanto ela apenas ouvia e sorria quieta, como se estivesse adorando tudo o que eu tinha a dizer.

Felipe também ajudou-me a esquecer a solidão que se instalava em casa. Não nos vimos desde segunda, mas todas as noites nos falávamos ao telefone. Ele adora a cultura greco-romana, assim como eu; portanto, imaginem o enorme debate sobre os mitos gregos, os deuses do Olimpo, a arte e literatura. Para alguém formado em Direito, até que ele tem uma boa noção sobre as artes. Acho que nossa conversa diária foi como doses homeopáticas para a cura de nossa aflição. Felipe estava preocupado demais, eu podia sentir pela sua voz cansada...

Em uma de nossas conversas, contei-lhe sobre meu aniversário; ele ficou entusiasmado para comemorar, mesmo depois de eu ter dito que não comemoraria nada, pois eu não estava em clima, não depois da discussão que ocorreu com os meus pais.

Papai odiou a ideia de minha permanência em Porto Verde. Mamãe, preocupada comigo e com a reação alterada de Declan, preferiu não falar nada. Mas no dia seguinte ao da briga, conversei seriamente com ela e expliquei-lhe todos os motivos válidos. Apesar de ter ficado com o coração na mão, segundo suas próprias palavras, ela entendeu minha posição e aceitou. Convenceu ao cabeça dura do papai, que depois veio conversar comigo; desculpou-se por sua atitude equivocada e também aceitou meu pedido, mas só depois de exigir uma visita no recesso de julho. É claro que contei com o apoio de Altair. Como prometido, ele contatou a mamãe e lhe assegurou meu bem-estar. Depois que o assunto com meus pais foram resolvidos, a expectativa cresceu consideravelmente com a surpresa que Felipe disse que preparou para meu aniversário.

Orgulho e Desejo (Revisando)Where stories live. Discover now