A impertinência

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David havia acordado, estava indisposto com enorme vontade de se entregar à cama macia e quente, mas esforçou-se para se por de pé. Precisava dar seu apoio à Lucas, estar do seu lado nesse momento tão doloroso. Arrastou-se para o seu banheiro, e trancando a porta despiu-se. O banho frio deu-lhe uma injeção de disposição. Depois de uns minutos, saiu ainda nu pelo quarto, molhando o piso e abriu a gaveta tirando uma toalha.

Lucas estava na sala de estar, e com ele o sr. Olavo, a sra. Maria Lurdes, sua mãe com Ana Clara e Felipe, que estava sentado de frente para Lucas que tentava permanecer o mais calmo possível, mas por dentro estava abalado e destruído.

A empregada retirava a bandeja de chá e de biscoitos, quase ninguém quis comer.

O mordomo acabara de adentrar e se aproximando do seu senhor, se curvou e disse num tom que somente ele pudesse ouvi-lo.

— Com licença senhor, pediram para avisá-lo da portaria que o avião já está preparado.

O senhor Olavo suspirou.

— Sim, obrigado Alfredo — o mordomo se retirou.

Lucas olhou para o sr. Olavo. Seu olhar distante e perdido. Olavo forçou um sorriso de apoio e se levantou indo até ele, e ajoelhando pegou suas mãos carinhosamente.

— Meu querido, chegou a hora.

David descia as escadas e quando chegou à sala de estar, encontrou todos reunidos, e seu olhar ficou concentrado no seu amigo Felipe, que o cumprimentou com um aceno de cabeça.

A senhora Melinda se levantou com Aninha no seu colo.

— Podemos ir então?

Os restantes se puseram de pé. Lucas parecia ter dificuldade de se levantar, parecia que as pernas tinham ganhado raízes e penetrados no chão, mas Felipe que estava ao seu lado, deu-lhe a mão para que ele se levantasse e Lucas aceitou para não criar um clima de constrangimento.

David sentiu-se incomodado e disfarçou.

Todos caminharam para fora. Estava agora apenas chuviscando. Dois carros pretos com motoristas uniformizados os aguardavam à frente da mansão, com as portas abertas.

David preferiu diminuir os passos, ficando por último e quando estava atrás de Lucas, e os outros mais a frente, pegou-o pelo braço, fazendo-o parar.

— Lucas, espere, por favor — pediu David.

— O que foi David? — Lucas suspirou, parecendo impaciente.

— Você convidou o Felipe?

— Velório não é uma festa para que fiquemos convidando as pessoas David — respondeu sério, e David pareceu um idiota com a resposta de Lucas. — Ele simplesmente apareceu para dar seus pêsames.

— Mas ele irá com a gente? — Todos agora começavam a entrar no carro, e Felipe olhou para trás, parando. — Caso você prefere que eu diga a ele que prefere velar seu pai mais intimamente, eu posso dizer...

— Se eu quiser eu mesmo posso dizer isso a ele, não preciso de mensageiro David — respondeu áspero, e começou a andar, deixando David para trás.

Felipe deu espaço para Lucas adentrar no segundo carro, enquanto o casal Odebrecht junto com a babá e sua filha iam no primeiro carro.

David tentou ficar calmo, e ao chegar ao carro onde Felipe também esperava por ele, disse.

— Não sabia que iria com a gente Felipe.

— Tentei ligar para você ontem mais não estava atendendo minhas ligações — informou ele.

David assentiu.

— Estava muito agitado aqui como você mesmo pôde ter notado.

Felipe concordou.

— Sim, eu sei, e quando liguei para o número fixo a empregada me disse o que havia acontecido — explicava e David tomou a frente de sua palavra.

— E veio pessoalmente dar-lhe os pêsames — disse David como se quisesse poupar o amigo de terminar sua fala.

Felipe e David se encaravam, e Lucas botou a cabeça pela janela do carro aberta.

— Será que pode se apressar, por favor?

Felipe sorriu para David, e deu passagem a ele entrar.

— Vamos amigo, não queremos causar o atraso, não é?

David amarrou a cara ao entrar e sentou ao lado de Lucas. Felipe fechou a porta ao seu lado e contornou o carro, abrindo a porta do outro lado e sentando ao lado de Lucas pela sua direita. O motorista entrou ocupando o seu banco, e saiu seguindo o primeiro carro que já estava a metros à frente.

No trajeto o silêncio era perturbador dentro do carro onde os três estavam, até que o celular de David começa a tocar. Ele pede desculpa aos presentes, e olha quem está ligando para ele. Era Camila.

Droga... — murmurou David. Lucas olhou para ele.

— Pode atender sem problema.

David decidiu atende-la e falar o mais baixo possível.

— Oi Camila.

— Nossa David que oi mais xoxo, sem animação, nem deu meu bom dia e nem me chamou de amor? — reclamou Camila ao ouvir a voz do seu namorado.

David suspirava tentando se controlar.

— Amor essa não é uma boa hora para conversamos, eu estou indo para o aeroporto agora para... — Camila interrompera nervosa.

— O quê? Como assim aeroporto? David Odebrecht me explique essa de ir viajar sem me comunicar? Vai viajar sem me levar é seu canalha?

David tentava apertar o máximo possível o celular contra o seu ouvido para a voz escandalosa de Camila não fosse ouvida, e perdeu a paciência, respondendo mais alto do que pretendia.

— Calada sua idiota, e não me interrompa novamente!

Lucas fingia não ter se perturbado, mas Felipe tentava ficar atento a discussão ao lado.

Camila parecera incrédula com a resposta de David.

— David... você nunca falou isso para mim antes... — sua voz era de um choramingo irritante, e David diminuiu seu tom áspero.

— Escute Camila, estou indo para o velório e o enterro do pai de um amigo meu, e não quero ficar aqui perdendo tempo com seu discurso vitimismo, está bem assim?

Camila engolira em seco.

— Eu... nossa David eu só estava preocupada por você não estava atendendo minhas ligações e recados... só queria saber o que estava acontecendo...

— Volto mais tarde, então até lá não me ligue mais, a não ser que seja urgente. — respondeu interrompendo-a. — Tenha um bom dia amor.

E desligou o celular irritado. Felipe reprimia um sorriso de divertimento e Lucas tentava não se deixar perceber seu nervosismo.



O Filho da BabáOnde histórias criam vida. Descubra agora