A Lua Minguante

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Desfecho

Caio e Rebeca saíram do hospital com o coração partido. Estela nunca estivera tão frágil.

— Mamãe fica forte e vovó enfraquece — Rebeca abraçou o irmão — Por que nossa vida é um infinito carrossel?

— É difícil compreender como o coração dela pôde ficar tão fraco de uma hora para outra. Há duas semanas, ela estava tão bem, ativa, cuidando da mamãe, do sítio...

— Será que nós a sobrecarregamos demais sem perceber? Ela cuidou da mamãe sozinha esses dias todos — lamentou-se Rebeca.

— Mas, mamãe está tão bem agora. Cuida da vovó com tanto carinho, nunca imaginei ver tanta paz entre elas, e ainda aceitou assinar o divórcio com o pai – espantou-se Caio.

— E nós, como ficamos com o papai? — perguntou Rebeca.

— Nós precisamos decidir alguma coisa sobre ele agora? — respondeu Caio, Rebeca sorriu. Concordou com Caio, pois cada coisa tinha seu próprio e misterioso tempo.

O que estava claro era a impossibilidade de Estela em continuar a instruí-los na magia. Ela tinha períodos de lucidez e períodos de total ausência. Sua cabeça ficava por vezes oca, o olhar parado e as palavras faltavam. Mais um imensurável vazio a ser enfrentado pelos três.

Grã-sacerdotisa

Perla reuniu o conselho da Irmandade. As sacerdotisas se reuniram sob o céu estrelado e o fino traço de lua minguante. Era visível a angústia diante da transformação de Perla. A perda das valiosas pedras fragilizou também seu lugar de grã-sacerdotisa. Algumas delas questionavam o destino da irmandade. Então, Perla soube que estava na hora de revelar o desfecho da lenda.

— É lua minguante. Meus poderes mínguam como a lua. Há anos, preparo Marina para assumir meu lugar e é chegada a hora de começarmos a transição. Ela saberá trazer os Olhos da Deusa de volta a nossa Irmandade, porque ela já criou o vínculo de sabedoria com a nova guardiã das pedras — Perla encarava cada uma das sacerdotisas com firmeza no olhar. — Há vinte anos, ocupo este lugar, ou seja, quase a mesma idade de Marina. É muito jovem, mas não há ninguém mais capaz, eu vi isso. Vocês também devem concordar, diante do ocorrido na lua de sangue. Ainda temos alguns longos meses até completar a transição. Espero que todas estejam de acordo.

Marina não sorriu, sabia que a missão imposta pela sua jornada como grã-sacerdotisa seria iniciada muito antes do que esperava. Precisaria dividir energia entre a preparação para assumir o novo lugar na Irmandade e os estudos para o vestibular de medicina. Nada mais seria simples em sua vida.

Lâmina

Miguel observou o mesmo carro que há dias parava na porta de sua casa. Sabia que Lâmina não desistiria de receber sua dívida. Ele os intimidava. Miguel decidiu pedir ajuda a Jorge.

— Vou conversar com Luís, temos que pôr um basta nisso. Ele já entregou o dinheiro da venda do carro, mas isso não diminuiu as ameaças. — Jorge colocou as mãos na cintura e olhou para o teto. — Ele continua insistindo que você deveria jogar para ele. Acredita que dois campeonatos seriam suficientes para você saldar a dívida. Anda te observando de perto, sabe que você está muito mais centrado e esperto que o seu pai. É uma armadilha para você voltar a jogar e ganhar dinheiro para ele.

— Eu não vou jogar, não jogar minha vida fora como o meu pai. Será que não devíamos considerar entregar logo a casa?

— Será que sua mãe suportaria? — Miguel não sabia responder, ela era um verdadeiro mistério para ele.

— Ela não conversa sobre nada comigo. É sempre tão silenciosa. — Miguel passou as mãos no cabelo e deixou a cabeça pender para trás. — A verdade é que eu ainda tenho medo de me aproximar e tocar novamente em algo que a machuque novamente.

Os Olhos da Deusa (completo)Where stories live. Discover now