VI - O INSTITUTO

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 Meicy espiava pela janela apertando forte os seus dedos na cortina branca, tentava de alguma forma, tapar a sua face com aquele tecido e se perder em seus pensamentos enquanto apreciava a vista arborizada do lado de fora. Ele estava em um dos vagões de uma velha locomotiva que seguia viagem para a área urbana de Hidda. Em pouco de menos de meia hora estaria no Instituto de Seguidores de Hidda, em seu primeiro dia como jovem seguidor de Karen.

Millo ajeitava a alça de um dos suspensórios em seu ombro. Se achava estranho usando roupas tão formais, as pessoas nos bancos ao lado sempre lançavam olhares gélidos, como se desprezassem um garoto índio se adequar a sociedade. Ele desviou o olhar e passou a fitar o seu amigo sentado no banco em sua frente. Meicy não havia falado sequer uma palavra desde a estação, por mais que fosse calado, aquele seu comportamento já estava soando estranho.

— Meicy, está tudo bem? — O índio perguntou.

Millo olhou para ele. Aqueles olhos tão concentrados pareciam mais escuros e intenso ao serem destacados pela forte luz que entrava pela janela. A pinta em sua face também tomou mais realce, fazendo com que tal pequeno ponto negro desse um certo charme ao semblante confuso e cansado do pré-adolescente.

Meicy permaneceu calado, distinto aos próprios sentidos. Apesar de fingir não se importar com nada, no fundo ele estava conseguindo demostrar a dor que sentia. Ser maltratado pelo próprio pai, apenas por uma escolha, uma decisão para o seu futuro. Ao menos por um ato de "bravura" pode-se dizer, sua mãe lhe fez suas malas e entregou na casa do velho Art, onde o garoto estava sendo abrigado.

— Estou bem! — Ele respondeu secamente e voltou o olhar à paisagem pela janela, fitando uma cadeia de montanhas no horizonte e algumas casas isoladas no meio daquele nada.

Millo suspirou. O seu amigo estava bastante estranho nos últimos dias. Um tanto inquieto e silencioso, passando horas fazendo anotações em um caderno, como se desabafasse toda a sua aflição em um diário. Estaria ele ocultando algum mistério, algo que não desejasse compartilhar com ninguém, nem mesmo com seu melhor amigo. O índio estreitou os olhos, observando atentamente aquela face tão alheia a toda volta. Millo só gostaria por um momento, ler seus pensamentos.

☽✳☾ 

Meicy e Millo desembarcaram da estação central de Hidda. O aglomerado de pessoas caminhando em diferentes direções, dificultavam a locomoção. Sempre esbarravam em alguém ou algum desajeitado pisava em seus pés. O local era imenso, contendo várias plataformas para diversos lugares próximos a cidade e por toda a região. O índio encarava nas faces de toda aquela gente que passava por ele. Nenhum rosto era familiar. Todos pareciam estranhos e apressados. Era a primeira vez do jovem na cidade, ele estava um tanto ansioso. Para a sorte do índio, Meicy conhecia bem o lugar.

Meicy parou de caminhar, colocando sua mala no chão sob seus pés. Olhou ao redor, aguardava o ambiente ficar um pouco mais deserto para poderem seguir o seu caminho ao Instituto. Alguém passou por ele subitamente, roçando o paletó marrom em seu braço. O garoto o reconheceu bem, simplesmente pelo andar. Ele estava de costas e o chapéu escondia uma parte de seu cabelo, levava consigo uma maleta preta que deveria conter os seus planos de aula. Jeon Kallú.

O garoto rangeu os dentes. Não esperava dar de cara com o seu pai tão cedo apesar dele ignorá-lo naquele mesmo instante. O dia já não estava indo nada bem, mas por mérito de si mesmo, Meicy não iria estudar a disciplina que o guardião ministrava — o sidelênico — afinal, ele já era fluente. Ele suspirou de alívio.

Legend - O Feiticeiro Oculto (Livro 2) EM REVISÃOWhere stories live. Discover now