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A solidão no Palácio é esmagadora.

Jamais havia imaginado que a ausência do antigo Sacerdote e de Vero poderia ser tão intensa. Eram os únicos com quem podia falar, apesar de tudo. E saber da ligação dos dois com seu passado e os Surdos não facilitava as coisas...

Sentado à mesa para as refeições, ele tentava, em vão, conversar com algum dos Auxiliadores ao seu lado. Eles eram todos iguais. Todos tinham a mesma aparência, a mesma idade, a mesma atitude nojenta. Depois de meia dúzia de frases jogadas ao vento, tornava a se calar e comer em silêncio.

Por mais revoltante que fosse a ideia, o único do Palácio que ainda conhecia um pouco melhor era Anton, provavelmente a pessoa que mais odiava no mundo todo. Se o Auxiliador da Justiça tentasse iniciar um diálogo, provavelmente acabaria com uma faca enfiada no olho.

O único motivo que o fazia suportar as horas tediosas que se arrastavam era a certeza de que em breve estaria com Dantálion novamente.

Por que todos não podiam ser como ele? Sinceros, espontâneos, corajosos? Por que todos os Auxiliadores tinham que ser tão pacatos, tão insossos, tão pegajosos?

Quando Anton começa a falar, ele sente alívio por finalmente ter aquele silêncio desagradável interrompido.

- Senhores Auxiliadores, senhor Sacerdote, gostaria de convocar neste momento uma nova reunião para discutirmos os últimos eventos.

Seus olhos ardem devido à falta de sono. Mesmo assim, não deixa sequer uma palavra de Anton escapar. A adrenalina de ser o assassino que eles procuram é suficiente para mantê-lo alerta.

- Continuamos sem nenhum sinal de vida do antigo Sacerdote, e nenhum tipo de ameaça ou informação por parte da população. A partir de amanhã, portanto, iniciaremos as buscas pela cidade, e daremos publicidade ao caso. Por mais que desejemos não divulgar o ocorrido, será necessário. A ajuda do povo poderá ser útil para encontrarmos qualquer sinal suspeito.

Os Auxiliadores acenam com a cabeça, murmurando entre si.

Anton leva à mão a boca e força uma tosse, pedindo silêncio.

- Seria interessante, porém, que tivéssemos algum tipo de entretenimento enquanto isso, algo que distraísse as emoções do povo para que não sofram tanto com as revistas e com as mortes de nossos amados colegas.

- No que está pensando, Anton? – questiona o Auxiliador da agricultura, tão gordo quanto um porco, e com a aparência deplorável de um.

- Estive pensando que, considerando as últimas circunstâncias, seria bom que o Sacerdote investisse seu tempo para encontrar uma esposa.

Anton olha diretamente para Lúcio, que não consegue esconder a surpresa.

- O que diz, senhor Sacerdote? Não seria bom ter uma esposa e formar uma família, agora que seu pai faleceu? Temos que pensar na continuação da linhagem sacerdotal. Não podemos ignorar a possibilidade de algo ruim acontecer ao senhor também.

O sangue esquenta seu rosto, as orelhas ardendo. Jamais havia sequer considerado ter uma esposa ou filhos. Sabia que, mais cedo ou mais tarde, aquilo aconteceria. Só não esperava que fosse tão rápido.

Ele abre a boca, pronto para negar o pedido, mas algo o impede.

Olha para os rostos dos Auxiliadores, que o encaram com expectativa.

Ele se lembra da história de sua mãe e Vero.

Ele se lembra de que está jogando em território inimigo.

- Acredito que é uma ótima ideia.

A voz que sai de sua garganta certamente não é a sua, de tão perfeitamente fingida.

- Ótimo, senhor Sacerdote. Arranjaremos os preparativos e logo definiremos uma data. Gostaria também de aproveitar esta oportunidade para lembrá-lo de que deverá também eleger um novo Auxiliador pessoal de sua confiança para substituir Vero.

Os olhos azuis de Anton faíscam com um prazer estranho.

- E eu mesmo gostaria de me candidatar à posição.    

    

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Dantálion [COMPLETO]Where stories live. Discover now