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A música desse capítulo exige fones de ouvido, caso contrário vocês não conseguirão escutar.

A música desse capítulo exige fones de ouvido, caso contrário vocês não conseguirão escutar

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Ele corre como nunca correu em toda sua vida.

Os galhos e espinhos das árvores e dos arbustos cortam sua pele, deixando marcas de sangue, mas ele não se importa.

Apenas corre, tentando fugir da realidade, tentando fugir dos fatos, tentando fugir da dor.

Tentando fugir de si mesmo.

Em sua corrida cega, sem nenhuma luz para guiá-lo, esbarra em todo tipo de obstáculo. Os pés e as canelas doem com cada impacto.

Mesmo assim continua.

As lágrimas embaçam seus olhos, atrapalhando ainda mais sua visão.

A clareira do ponto de encontro se abre repentinamente à sua frente.

Sem diminuir a velocidade, ele se lança ao chão, rolando sobre si mesmo na terra áspera, sentindo as pedras rasgarem sua pele.

Com o rosto na terra, ele grita.

Um grito horrendo, que ecoa do fundo do abismo vazio deixado por sua alma.

Ele berra como um animal sendo morto, como uma legião de demônios sendo despertada.

Ele grita e uiva em agonia, arrancando várias mechas de cabelo com as mãos, levantando-se e lançando o corpo novamente contra o chão, contra as árvores, contra as pedras, contra qualquer obstáculo duro o bastante para machucá-lo.

E ainda assim a dor física não é suficiente.

Fecha os olhos e lança o pescoço para trás, gritando com toda a força, sentindo a garganta e o peito arderem, esmurrando o próprio corpo com os punhos fechados.

Os punhos que tinha usado para matá-lo.

Seu grito ecoa pela floresta, assustando várias criaturas noturnas, que fogem.

Exausto e incapaz de gritar mais, cai de joelhos, um gemido infernal escapando de seus lábios.

Ele se deita, dobrando-se sobre si mesmo, gemendo e urrando, sentindo todo seu corpo dilacerado.

E ainda assim a dor física não é forte o bastante.

Só então o choro vem.

Espasmos o sacodem, apertam seus órgãos internos, o impedindo de respirar.

Todo o conteúdo de seu estômago é lançado para fora, sufocando.

O gosto amargo de bile faz seu estômago se contrair em ondas de enjoo.

A cabeça e os olhos doem insuportavelmente enquanto continua a rolar sobre o próprio vômito, gemendo e chorando, desejando que, de alguma forma, sua vida acabe naquele mesmo instante.

Ele se coloca de joelhos novamente, e outro grito arrebenta seu peito.

Pega a adaga e a pressiona contra o ventre, as contrações involuntárias quase fincando a lâmina fria em sua barriga.

Suas mãos tremem enquanto segura a adaga com força, incapaz de movê-la adiante, e incapaz de guardá-la.

Luta consigo mesmo, respirando com dificuldade, a dor o consumindo por completo.

Afasta a lâmina, lembrando-se do juramento que tinha feito.

O juramento que tinha feito a Dantálion.

Um novo uivo explode, queimando seus ouvidos.

A adaga cai de suas mãos. Seu corpo se enrola sobre a terra, de olhos fechados, incapaz de conter os gemidos de dor que lhe escapam.

E assim fica horas, deitado ao relento, sozinho na escuridão, desejando que sua vida acabe, os urros bestiais assombrando a floresta como espíritos malignos durante toda a madrugada.

Uma fina chuva começa a cair, umedecendo seu corpo inerte.

A agonia aos poucos se acalma, dando lugar ao torpor.

Seus braços e pernas se tornam insensíveis, como se fossem os braços e pernas de outra pessoa. Seus olhos endurecem com as lágrimas secas, e seu coração para de bater, para de sofrer.

No lugar que antes ocupava o órgão de seus sentimentos, agora resta apenas um amontoado disforme de emoções coaguladas, duro como uma rocha, incapaz de sentir qualquer coisa, boa ou ruim.

Lúcio está morto.

Aniquilado.

Um último sentimento o esmaga:

Ódio.

Um ódio mudo, mais violento e furioso que qualquer ódio já sentido.

Um ódio que não é só sentido, mas vivido.

Um ódio que o coloca de pé e torna seu olhar frio e impiedoso.

Um ódio sedento, que não se contentaria em ferir, nem mesmo em matar.

Seu ódio tem vontade de destruir cidades, de queimar templos, de causar caos e destruição por cada centímetro de terra por onde pise. Um ódio que tem sede por exterminar a todos, sejam inimigos ou amigos ou ele próprio. O ódio comprime cada átomo de seu corpo.

Todos os fragmentos de si mesmo, trincados e partidos por cada sentimento ruim que tivera, de repente se prensam, comprimem, esmagam todo seu interior.

As fendas se encaixam umas nas outras, formando uma nova estrutura sólida, que não é mais dividida em suas três personalidades conflitantes.

O Sacerdote está morto.

Moloque está morto.

Lúcio está morto.

Ele ergue a cabeça, os olhos sombrios flamejando com o furor infernal que o consome.    

    

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Dantálion [COMPLETO]Where stories live. Discover now