Zwei.

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Era sexta-feira. O último dia útil livre de Marco e ele tinha passado a tarde toda terminando de desempacotar sua mudança. Aquele era seu terceiro dia em Greifswald e nada ali se parecia com um lar, não importava o quanto ele tentasse.

Suspirou, soltando uma das caixas em cima da mesa, pondo-se a caminhar até a janela. O sol desaparecia lá fora, prestes a dar lugar para uma noite fria e todos na rua corriam em direção à suas casas. Era um bairro bonito, em uma cidade bonita e Marco acreditava que coisas boas poderiam surgir dali. Era um recomeço, afinal de contas.

Ouviu o telefone tocar na mesinha ao lado do sofá, mas deixou que a secretária atendesse. Ali estava seguro, não precisava se encolher quando o telefone ou o celular tocasse, podia se dar ao luxo de relaxar e observar a vista. E a vista, naquele momento, era o loiro que conhecera na terça-feira.

Conhecera, não era exatamente o termo certo, mas Marco se lembrava de seu nome. Toni, com o mesmo penteado perfeito e olhos azuis ofuscantes, agora encarava-o do outro lado da rua. Casualmente sentado em sua Harley, esperando que os amigos terminassem o papo que levavam com Marcel — o vendedor de charutos, do outro lado da rua.

Ele não sorria, o rosto marcante e duro feito pedra. Marco era um grande apreciador de artes — gosto herdado de sua mãe — e pôde facilmente compara-lo à uma escultura grega. Tinha uma feição que jamais causaria ao observador qualquer tipo de cansaço, Marco poderia olha-lo por horas. Mas não deveria, por isso, fechou a cortina e deu as costas para a janela, o apartamento sendo preenchido pela voz de sua mãe, balbuciando lamúrias devido à ausência do filho.

Fez bem em não atender, porque não se sentia pronto para mais uma sessão de desculpas e mentiras. Era isso o que ele vinha fazendo, mentindo para todos que o conhecia, pelo simples fato de temer ser encontrado. Sabia que sua mãe jamais compartilharia seu número de telefone, mas não podia deixar de pensar nisso. Estava cansado da sensação eterna de estar sendo vigiado e de fugir de tudo o que conhecia, como se fosse culpado de algo. Greifswald deveria ser um recomeço e Marco se esforçaria para que fosse.

Antes que pudesse voltar ao que fazia, ouviu o som estridente da campainha soar pelo ambiente. Aquele vinha sendo um ritual contínuo naqueles três dias: chegar em casa e então, minutos depois, ouvir aquele mesmo barulho. Havia recebido boas vindas de todos que moravam no prédio, assim como de todo o quarteirão. Quando pensara em uma cidade hospitaleira, jamais imaginou que chegaria ao ponto de receber tortas no meio da manhã.

E era isso que ele esperava encontrar, quando caminhou até a porta e a abriu, mas ao invés de mais uma senhora com mais uma torta de maça, Marco se deparara com Toni. De novo.

Franziu o cenho, apertando a madeira por entre os dedos. A porta parcialmente aberta mostrando toda a bagunça interna, mas o loiro não parecia curioso em saber o que Reus escondia lá dentro, e sim, curioso nele. Os olhos fixados nos de Marco, com um pequeno sorriso dançando entre os lábios.

— Está me seguindo?

Toni negou com uma risada, descansando uma das mãos no batente da porta. Os dedos firmes contra a madeira, tensionando os músculos de seu antebraço, que por sua vez, era repleto de desenhos pretos. Marco também tinha tatuagens, mas elas pareciam constrastar melhor com o dono dos olhos azuis.

— Estava de passagem, — murmurou casualmente, trocando os pés. Reus apertou os olhos, totalmente descrente daquelas palavras. — Vim me apresentar.

— Você já se apresentou. — cortou, arrependendo-se em seguida. Toni devia saber que não era o tipo de pessoa que era facilmente esquecida, mas de qualquer forma, Marco acabara de confirmar aquilo à ele.

— Tem razão. — ele riu, balançando a cabeça para os lados, se divertindo completamente com a situação. — Não vai devolver a gentileza?

Agora foi Marco quem riu, mesmo que não soubesse exatamente do que. O homem parado à sua frente, não se parecia em nada com a pessoa que ele vira no bar na terça, e nem com o motoqueiro sentado do outro lado da rua. Toni parecia equilibrar bem suas personalidades, distribuindo-as para quem e como quisesse.

— Você já sabe quem eu sou, tenho certeza disso.

O loiro confirmou com um suspiro, desistindo do apoio com seu braço, encostando agora a lateral de seu corpo no batente. Próximo demais de Marco, que teve de se afastar um pouco para o lado, para não toca-lo.

— O novo médico do St. Jude. — afirmou, vendo Reus confirmar em um aceno. Toni baixou os olhos, subindo-os pelo corpo do ruivo. O ato não era em nada inocente, mas Toni não parecia tê-lo feito para constrange-lo. Não que ter conhecimento disso, deixasse as coisas menos embaraçosas. Não, muito pelo contrário, Marco queria se esconder completamente do exame visual que Toni estava fazendo. Ao voltar a atenção para o rosto de Marco, o loiro voltou a sorrir, lambendo o lábio inferior antes de se pronunciar. — Aparentemente, saindo melhor do que a encomenda.

Marco revirou seus olhos, sentindo seu rosto arder. Havia anos que não tinha aquela proximidade e conversa com qualquer outro homem — pelo menos, não um que não era seu paciente. Estava enferrujado e era incapaz de discernir o quão interessadas eram as palavras do outro.

— Honestamente, o que veio fazer aqui?

Toni riu, dessa vez mais alto, desencostando-se da madeira e assumindo uma nova postura. Tudo parecia um jogo extremamente divertido para ele, sem regras e sem freios, do tipo que confundia a cabeça do outro jogador. Marco não deveria querer ser o outro jogador, mas era impossível não pensar na possibilidade, quando um homem como Toni olhava para ele daquela maneira.

— Vim dar as boas vindas, Doutor. — estendeu sua mão direita, como se tivesse acabado de chegar. Marco demorou-se um pouco para aperta-la, perguntando-se o quão à sério deveria levar o outro. — Toni Kroos, completamente, ao seu dispôr.

Marco quis rir, não apenas pelas palavras de Toni, mas sim pela forma com a qual ele as falou. A voz brincalhona em um rosto que tentava se manter sério, e por um momento, Reus se esqueceu de quem ele era e o que fazia.

— Marco Reus. — respondeu, mantendo sua mão abraçada entre a de Kroos. Apertou os lábios, se dando conta de que o contato se estendera mais além do necessário, e enfim soltando a mão do loiro. Raspou a garganta, como se fosse o necessário para levar as palavras até sua boca. — Nada de doutor.

Aquilo pareceu ser o bastante para despertar algo em Toni, que trouxe de volta o sorriso largo. Ele era lindo e sabia como usar as palavras ao seu favor, uma combinação perigosa demais para alguém com o psicológico de Reus.

— Mais alguma coisa?

— Não. — Toni garantiu, se preparando para ir. Trocou os pés, as luzes do corredor deixando seu rosto com uma coloração amarelada, um contraste engraçado com aquela cor de olhos. Marco amava azul, principalmente como par de olhos, tão diferentes do seu verde sem graça. — Nos vemos em breve?

Marco anuiu.

— Que não seja no hospital.

Kroos soltou uma última risada, estudando o rosto de Reus mais uma vez, antes de dar as costas e sumir na curva do corredor.

Marco ainda permaneceu em seu lugar, repassando a conversa breve que tiveram. Toni falava com ele, como se soubesse tudo à seu respeito — o que Marco acreditava ser completamente possível — e fossem amigos há anos. E fosse lá o que a visita surpresa de Kroos significasse, Reus tinha certeza de que não resultaria em nada politicamente correto.

Dogs of War. {Kreus Ver.}Where stories live. Discover now