Capítulo Trinta e Dois

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Felipe Ribeiro

— Calma.  riu, descendo da minha moto desengonçada.

Pequena do jeito que ela era, realmente era quase impossível pra ela descer de uma XRE 600 sem cambalear.

— Cuidado pra não queimar a perna no escapamento.  a alertei.

 Já foi.   disse rindo, ajeitando a mochila nas costas.

A mesma parou do meu lado, me olhando com um sorriso pequeno.

 Obrigada por hoje. Eu não me sentia tão bem assim há anos.

Senti meu coração acelerando, me fazendo suspirar involuntariamente a vendo daquela forma, com um sorriso tão meigo e doce. Não consegui nem a responder, mas senti que se eu respondesse, gaguejaria. Então eu apenas sorri de canto de boca, tentando segurar um pouco da minha felicidade.

 Entra. Vou esperar você entrar. — foi a única frase que saiu de mim.

Ela sorriu aberto, fazendo seus olhos apertarem de forma donairosa. A mesma deu as costas a mim e pegou a chave na sua mochila, a colocando na fechadura e girando. Nesse mesmo momento, escutei a janela de trilho do andar de cima da sua casa correndo. Levantei a cabeça e vi aquela mulher que amedrontava a Brenda, tranquei minha mandíbula enquanto a encarava e aquela puta não abaixou a cabeça pra mim. Ficou me encarando da mesma forma, raivosa.

— Vai ficar me olhando?  perguntei intimidador, a vendo virar os olhos e fechar a janela  Piranha do caralho.  resmunguei.

 Que foi?  deu um passo pra trás pra poder olhar pra cima.

— Nada, não.  desviei, mesmo sabendo que era óbvio o que tinha acontecido  Entra e vai descansar, deve tá morta.  ri.

 Acredita que não? Parece que eu tomei energético.  gargalhou — Tchau! — empurrou o portão, entrando.

Liguei a moto, mas só sairia quando eu escutasse ela trancando o portão por dentro. Fiquei a olhando encostar o mesmo e antes de fechá-lo por completo pra então o trancar, ela me olhou por uma fresta de trinta centímetros, sorrindo.

 Tchau. — sorri leve, sincero.

De repente, ela abriu o portão e veio até mim tão rápido que eu não tive tempo de raciocinar, só de sentir sua boca na minha, num beijo descontraído e roubado. Após, ela voltou na mesma velocidade e não me deu tempo nem de a olhar, apenas fechou o portão com tudo e eu fiquei ali, paralisado, sem entender nada do que tinha acontecido, mas de uma coisa eu sabia:

 Caralho... — olhei pro painel da moto, reflexivo  Fodeu, tô apaixonado. — gargalhei bobo, mas com uma ponta de desespero.

Dei a partida sorridente, abobado e com um sentimento bom. Mas não podia negar que aquele sentimento tão repentino me assustou.
Sim, desde quando eu a conheci, eu já a adorei e fazia questão de a procurar, mas depois do nosso beijo, simples, tudo mudou. Meu único medo era me magoar novamente, e eu não podia me permitir. Eu ainda estava magoado com a Amanda, era um sentimento vívido em mim, havia pouco tempo que eu havia decidido pôr um basta naquilo, então era algo completamente recente. Se eu ficasse magoado com mais uma pessoa, não iria saber o que fazer.
De repente um medo tomou conta de mim. Medo de um dia ela decidir que não iria mais falar comigo, e motivos não faltavam. Eu tinha que entender que Brenda era uma menina cheia de traumas, incerta com seus sentimentos e amedrontada, tinha que colocar tudo aquilo na balança e não ser egoísta a ponto de ficar chateado caso algo ocorresse. Além do mais, eu era traficante! Eu andava de fuzil pra cima e pra baixo naquele lugar, trocava tiro quando necessário e talvez fosse questão de tempo até ela cair na real e perceber que eu não valia tanto a pena assim. E se ela não estivesse certa do que ela queria? Eu havia sido o cara que a tirou do inferno de vida que ela tinha, talvez ela tivesse tanta afeição por mim apenas por gratidão e nada mais. Pensar nisso me fez querer morrer, estava acontecendo tudo de novo. Eu ia me apaixonar, me apegar e depois... Tudo iria acabar e eu iria ficar de pista. Esse roteiro eu conhecia de trás pra frente e sinceramente, já estava cansado.
Cheguei em casa morto, bocejando mais do que respirando. Havia passado a madrugada em claro, mas eu repetiria tudo de novo sem nem hesitar. Mesmo cansado, me sentia leve.
Incrivelmente, ter passado horas conhecendo a Brenda, me fez esquecer quem eu era por alguns instantes. Não me senti um traficante, um bandido que a qualquer momento pudesse morrer ou ser preso. Me senti... O Felipe de quatorze anos. Um garoto que gostava de conversar, jogar bola e soltar pipa. Que brigava por bolinhas de gude e de vez em quando faltava aula apenas pra jogar videogame com os amigos.
Era tanta coisa pra pensar. Informações novas sobre aquela menina tão... Tão linda e inteligente, claramente esforçada e cheia de vontade.

Entre A Paz E O CaosWhere stories live. Discover now