Capítulo Nove

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Diogo Novais

Adentramos a Rocinha sob fogo, não haviam muitos muros que podíamos nos proteger, eu estava me protegendo atrás de postes, era o máximo de proteção que eu conseguia obter. Ajoelhei atrás do poste que eu estava e o Thiago ficou em pé atrás de mim. Parecia que tinham aberto um bueiro com infestação de ratos, muitos traficantes passavam correndo perto de nós, no final da rua, mas eles eram muito rápidos.

A grande parte dos tiros não estavam direcionados a gente, mas sim a outra facção que estava presente. Foquei minha atenção ali, naquele cenário caótico e no meu fuzil, esvaziei minha mente o máximo que eu consegui pra efetuar meu primeiro disparo, não obtive sucesso. Avancei de poste com o Thiago, ficamos perto de uma padaria que estava entreaberta, a porta de enrolar estava com uma fresta de mais ou menos um metro de altura, quase na metade, de onde eu estava pude ver que haviam pessoas ali dentro e que também haviam pessoas sujas de sangue, estavam sentadas no chão e encolhidas, não deu pra ver quem estava ferido e eu não pude ficar prestando atenção exclusivamente naquilo. Voltei meu foco pro fuzil e respirei fundo, um traficante passou correndo e quando eu apertei o gatilho, meu fuzil não atirou.

— Pegou, mané! Tu viu ele caindo? — disse rindo e comemorando seu tiro bem sucedido.

— Porra, o meu fuzil travou nesse caralho! — disse visivelmente irritado, retirando o carregador.

— Não dá pra desmontar fuzil aqui, não, ô Novais! — um colega gritou.

— Mas eu preciso desmontar isso! — disse respondendo o colega.

— Corre pra padaria, desmonta lá, eu te dou cobertura! — o Thiago disse concentrado na mira.

Assenti positivamente e me preparei pra correr em direção a padaria, que não estava muito longe, mas também não estava perto o suficiente pra eu andar tranquilamente.

— Vai, Novais! Vai, vai! — outro colega disse tomando meu posto e permitindo meu deslocamento.

Corri o mais rápido que eu consegui, afinal não era fácil correr rápido com um colete pesando dois quilos e um fuzil pesando quase cinco, eu estava correndo segurando um saco de arroz praticamente. Subi aquela porta de aço com toda a minha força e logo a desci por completa, me virei ofegante pras pessoas que estavam lá dentro e todos se assustaram com a minha presença, no total haviam doze pessoas ali, contando comigo, o chão estava lavado de sangue e mesmo eu estando perto das pessoas, eu não vi quem estava ferido.

Desmontei meu fuzil, peça por peça, com calma, mas sabendo que eu não podia demorar muito, eu estava sozinho ali dentro, minha equipe estava me esperando do lado de fora, mas eu ainda poderia sofrer uma emboscada. Escutei um smartphone tocando e sem olhar pras pessoas, esbravejei:

— Ninguém atende celular nenhum até eu sair daqui! — disse alto.

Não era estupidez da minha parte, eu só estava com medo de ter algum informante ali no meio que dissesse da minha presença na padaria, eu estava cercado por traficantes, pra chegar um lá pouco custava.

— É a minha mãe, eu preciso atender. — disse chorando.

Parei de montar o fuzil e franzi as sobrancelhas, era o que eu fazia quando estava tentando reconhecer alguém. Subi meu olhar e procurei a dona daquela voz, até ver a menina da Rocinha, uniformizada, chorando, encolhida, fragilizada e com seu jaleco colegial manchado de vermelho, assim como suas meias, as lágrimas dela escorriam insistentemente e ela tentava controlar sua respiração descompassada, talvez pra não parecer tão assustada e amedrontada.

Entre A Paz E O CaosDonde viven las historias. Descúbrelo ahora