III

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Lauren

Quando chego em Pittsburgh ainda estou cansada, minha soneca de 10 minutos não foi o suficiente para meu corpo descansar, mas pra que dormir se você pode encarar uma janela por 7 horas e se arrepender de todas as decisões que você já tomou na vida?
Não importa o quanto eu tente pensar em uma solução, eu simplesmente não conseguia, ela me conhecia. Todas as partes de mim, até as que eu pensei que estava escondendo. E ela me ama, eu nunca tive isso antes e acho que é por isso que quero estar com ela.
Eu pauso a música que estava ouvindo, Pretty Games da Cereal Killers, a banda de Natalie, a música que fez com que eles se assinassem com uma gravadora indie alguns meses atrás, e checo por mensagens. Nada, nenhuma resposta a mensagem que eu enviei perguntando se podíamos conversar. 
Isso é pior que as outras brigas que tivemos, nós duas dissemos coisas ruins. Eu olho no Google Maps, tenho que descer depois daqui dois pontos. Em pouco tempo vejo os prédios de pedra gigantes. Não acredito que estou aqui. Oficialmente uma universitária. Por um segundo os pensamentos sobre a Natalie somem. Quase sinto como se pudesse respirar de novo.
Não acredito que consegui. Eu realmente consegui. Sai daquele inferno. Isso é o que queria. Descobrir como é viver me preocupando apenas comigo.
Bom, mais ou menos.
Coloco meu celular no bolso, desço do ônibus e espero o motorista abrir o compartimento para eu pegar minhas coisas. Agradeço o motorista e sigo pela Atwood Street, alguns quarteirões de distância do apartamento que encontrei em um anúncio.
Fico impressionada como esse lugar é diferente da Filadélfia, é menor, prédios menores, menos pessoas andando nas ruas.
Eu sigo o Google Maps, passo por um Starbucks e um mercado de bairro. Olho meu reflexo na vitrine de uma loja. Parece que fui atropelada pelo ônibus ao invés de ter descido de um. Meus cabelos pretos estão presos em um coque desleixado, minha camiseta está tão amassada. O delineado que é minha marca registrada, sumiu totalmente do olho direito e ainda está intacto no olho esquerdo. Como isso é possível?
Rapidamente arrumo meus cabelos e esfrego o olho para tirar o delineado sobrevivente, enquanto sigo em direção ao apartamento. Meu celular vibra e eu quase o derrubo no chão pra checar, torcendo para ser uma mensagem de Natalie. Era minha mãe. Ela respondeu uma mensagem minha.
Olho pro celular e vejo que minha mãe não respondeu nenhuma das mensagens que enviei para ela no caminho. O que não é novidade.
A mensagem só dizia: Chegou?
Todo o cansaço some quando vejo uma porta vermelha com o número 530. Igualzinho o do anúncio que dizia Estudante da Pitt procurando um colega para dividir apartamento.
Minha nova colega, Normani Kordei, definitivamente com certeza usou algum filtro no restante do prédio que não parecia tão bem cuidado quanto nas fotos.
Respondo a mensagem da minha mãe antes de apertar a campainha: Sim, acabei de chegar. Aperto o botão que torço para ser do 3A. Uma voz surge do interfone: Já tô descendo!
A porta se abre e dou de cara com Normani, a garota de pele e cabelos negros que vi nas redes sociais.
- Oi! - ela estende a mão - Você deve ser a Lauren!
- Sim! E você é a Normani, certo? Prazer em te conhecer - Aperto a mão dela e reparo nas unhas perfeitamente feitas - Adorei suas unhas.
Ela sorri para mim e sigo ela para dentro. O corredor é apertado e o carpete no chão está bem desgastado, mas pelo menos não fede a xixi de gato, já é um ganho, além disso foi o único lugar que consegui encontrar por menos de 500 dólares e já mobiliado, muito mais barato do que morar no dormitório do campus.
Começamos a subir de escada até o terceiro andar, Normani não para de falar e eu não desmaiar pelo peso das minhas malas.
- Você é novata né? Tá animada?
- É acho que sim - tento recuperar o ar, não chega nunca.
- Por que decidiu estudar aqui?
- Tem um programa pré-medicina. Ajuda estatal. - Jesus, será que coloquei tijolos nessas malas? - Longe suficiente de casa que parece que mudei de estado.
- Garota, eu te entendo - ela me olha antes de parar na frente de uma porta branca - Eu queria ir para Universidade do Colorado, mas ... - A voz dela some
Ela procura as chaves nos bolsos, destranca a porta e entramos.
- Mas Pitt é uma boa escola. Você vai gostar daqui. Meu namorado, Jackson, veio para cá transferido da Penn State, e ele gosta bem mais daqui do de lá.

Ela sorri para mim e eu sorrio de volta enquanto entramos pela porta. O apartamento é surpreendentemente organizado. O piso de madeira está um pouco arranhado e uma marca no teto do que deveria ser um vazamento. Tem um sofá cinza que parece bem confortável, uma mesinha de café e um cordão de luzes em cima de grandes janelas.
Tem quadros pelas paredes, alguns com frases motivacionais, algumas com fotos da cidade, uma foto de Normani com alguns amigos.
- Seu quarto é depois do banheiro - Normani aponta para uma porta no final do corredor.
Estou indo para o quarto quando esbarro em um cara molhado, sem camisa, usando nada além de uma toalha. Uma toalha branca bem pequena. Caímos no chão e olho nos olhos dele enquanto começo a surtar.
- Ai meu Deus - digo horrorizada e tento me levantar de qualquer jeito de cima dele.
Como se a situação não pudesse piorar, ele estava, como dizer, animado.Ele tenta esconder com a toalhinha, mas não adianta.
- Você tá de brincadeira, Jackson? É sério isso? - Ela passa por mim, pega ele pelo braço e o empurra até seu quarto.
Jackson. O namorado dela. Que jeito de começar, lá se vão as chances de uma amizade.
Entro no meu quarto, tem uma mesa pequena, um pequeno armário. Uma cama de casal perto de uma janela sem cortina. Tudo que eu sempre quis, mas mesmo assim queria estar de volta na Filadélfia, com Natalie, no apartamento dela, assistindo alguma série enquanto ela pratica alguma música na guitarra.
Pego meu celular do fone, abro a lista de contato e procuro o nome dela. Hesito em ligar. “Vamos, Lauren, você consegue”. Aperto o botão de ligar, seguro o ar enquanto o telefone toca. Quando estou prestes a desistir, ela atende.
- Oi
- Oi! - praticamente grito, em êxtase que a ligação foi atendida - Como você tá?
- Bem
Curta, brava, mas respondendo. Talvez a fase do gelo esteja passando, talvez eu ainda tenha uma chance.
- O que você vai fazer hoje? - Eu enrolo, pensando no que faríamos em um sábado a noite, se eu não estivesse trabalhando e se ela não tivesse um show pra ir. Talvez iríamos ao parque ou a uma loja de discos.
- Estou indo comer no Shaggys.
- Ah sim.
- Você precisa de alguma coisa Lauren? Ou não sei
- Nat, eu - luto para que as palavras saiam - Eu só estou com saudade.
- Achei que eu não sabia merda nenhuma sobre você - ela responde.
- Eu falei no momento da raiva. Eu só...
- Lauren, nós duas sabemos que você não está ligando porque sente minha falta, você tá ligando porque não tem outra pessoa pra quem ligar.
- Isso não é verdade, quero dizer…. é verdade, você estava certa sobre isso, mas estou ligando porque passei todos os minutos desde que saí do seu apartamento pensando em você. Me desculpa por tudo, eu não quero fugir Natalie, não de você.
Silêncio. Até tiro o celular do ouvido para checar se ela não tinha desligado.
- Eu falei sério - ela finalmente respondeu - Eu te amo Lauren, mas eu não confio em você. Especialmente com você longe. Além disso, Megan me contou que você ligou pra ela naquela noite.
Que inferno Megan
- Não é o que tá pensando! Só liguei porque eu não tinha onde dormir. Natalie, por favor, me deixa provar que você pode confiar em mim. Eu quero fazer isso funcionar, mesmo a distância.
- Eu não sei, você não está aqui e não consegue nem dizer que me ama. Como vou saber que você não vai me trair? Por isso queria que você fosse comigo na turnê - escuto ela respirar fundo - Nós só viajamos amanhã - o tom dela me pareceu uma pergunta.
- Natalie eu faço qualquer coisa, menos isso, essa é a minha chance de fazer as coisas diferentes, de dar rumo a minha vida, não posso deixar passar.
Ela fica em silêncio por um tempo e solta um longo suspiro.
- Antes de tudo acontecer eu ia fazer uma surpresa. Vou estar em Pittsburgh para um show no dia 13 de setembro. Sei que você vai ter umas quatro namoradas até, mas se não podemos conversar - Ela pausa - realmente conversar, sobre como se sente, se vamos tentar fazer funcionar.
- Natalie, não tem outra pessoa com quem eu queira estar.
- Vamos ter que esperar para ver. Espero que prove que estou errada.
- E vou.
Desliguei o telefone com um sorriso aliviado, afinal eu amo um desafio.

She Gets the GirlOnde histórias criam vida. Descubra agora