XI

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Lauren

Saio do ônibus e percebo que eu descobri oficialmente o lugar mais bizarro de Pittsburgh.
Um enorme estabelecimento, cheio de ruas e galpões está na minha frente, cheio de janelas sujas e quebradas, que me convencem que ninguém deve acreditar que é seguro guardar coisas aqui.
Parece abandonado.
Olho de novo o endereço que Jim, o dono do food truck, me passou essa manhã e está surpreendentemente correto.
Se eu morrer aqui, todos os 26 dólares na minha conta serão herança para minha mãe, que vão acabar na loja de bebidas da Lydia, a alguns quarteirões da minha casa.
Esse pensamento, acaba me dando coragem para entrar.
Aqui vai nada.
Coloco o copo vazio de moccha superfaturada em uma lata de lixo que, provavelmente, não vão esvaziar em anos e sigo os números do galpão em direção a unidade 134.
Quem diria que ser uma boa pessoa era tão caro?
Eu desacelero e paro quando vejo uma porta de garagem aberta e respiro aliviada quando vejo um food truck preto escrito JIM’S EATS na lateral. Sentado do lado do carro tem um cara gigante, vestindo uma bandana vermelha e uma camiseta cinza manchada.
Imagino que seja a lenda em pessoa.

Oi, Jim? - Digo enquanto ele carrega o food truck com caixas de pão. Ele bate a porta, se ajeita e limpa as mãos em um pano enquanto me encara.
- Lauren? - ele pergunta com o cigarro balançando na ponta dos lábios. Concordo com a cabeça - Está atrasada.
- Estava ajudando uma amiga com um negócio. Não vai acontecer de novo, eu prometo, eu…
- Você não parece como a escolha certa para esse trabalho - ele me corta - Não é sol e arco íris e essas besteiras. Sabe não é só sentar e parecer bonita.
Seguro a vontade de revirar os olhos e dar uma resposta sarcástica. As palavras de Camila ecoaram nos meus ouvidos.
- Bom, eu tenho muita experiência em não sentar. Trabalho de cozinha, caixa, lavar louças. Já fiz de tudo - respondo e vejo ele pegar as chaves em cima de uma caixa de sachês de ketchup Heinz.
- Não sei, é trabalho pesado - Não tem ar condicionado, nem aquecedor. Sem pausas para banheiro e turnos longos.
Dou de ombros
- Maravilha. Parece até minha infância
Ele abre a porta do passageiro e pula pro assento do motorista, não posso desistir. Não tive resposta de nenhum lugar e preciso de um emprego.
- Além do mais, já que você acha que sou um rostinho bonito, pensa em todas as gorjetas que vão entrar.
Mas ele revira os olhos e não cai nessa.
- Que tal se você me der uma chance? Só hoje, você parece que está indo pra algum lugar e vai acabar tendo que trabalhar tanto no grill quanto na janela.
Ele respira fundo, mas ainda não me responde.
- Se eu for mal, você não precisa me pagar e eu vou embora.
Ele me encara e eu o encaro de volta. Nenhum de nós pisca, depois de um logo momento ele me responde.
- Sobe aí, você tem literalmente uma chance, não fode.
Subo no banco do passageiro, procuro o cinto, mas não encontro nada.
- Tem…
- Cinto de segurança? - ele completa e balança a cabeça - Não
Que bom.
Ele liga o carro e partimos e a viagem não dura nem 5 minutos e nesse tempo Jim conseguiu xingar dois motoristas.
Chegamos em uma cervejaria, com mesas de piquenique montadas embaixo de fios com luzes amarelas. Tinha bastante pessoas no lugar que começaram a esticar o pescoço curiosas com o food truck.
Depois que JIm liga a fritadeira, ele me mostra como trabalhar no caixa e me dá um tutorial rápido do cardápio básico. Hambúrgueres, queijos quentes e três variedades de batata frita (normal, com cheddar e cheddar com bacon, naturalmente.
Ele me olha sério.
- Agora me escuta. Você só pode dar um guardanapo para cada cliente - ele dá u tapinha em uma pilha com pacotes de guardanapos e depois aponta para uma caixa com garfos de plástico - E os garfos são só para a batata com cheddar e bacon, se outra pessoa pedir não é para dar.
Olho para a caixa, tinha milhares de garfos.
- Por que não?
Ele segura um garfo.
- Cada um desse me custa 7 centavos. Eu vou falir se ser um desse para cliente.
Eu concordo com a cabeça como se aquilo fizesse sentido, sendo que o homem cobra vinte dólares por um hambúrguer com refri e fritas.
Então ele passa por mim e abre a janela do caminhão e agora sim, estamos abertos para serviço.
No começo é um estressante, a fila de pessoas, a caixa registradora, Jim resmungando nas minhas costas enquanto cozinha.
Mas em pouco tempo começamos a trabalhar em sincronia, anoto o pedido, penduro no varal próximo ao grill, sirvo quando está pronto.
Repito isso mais um milhão de vezes.
Jim não estava mentindo. A grelha e o sol, tornam o foodtruck em uma sauna em poucos minutos, além disso ele não fala muito,
Depois de algumas horas o movimento diminui e mesmo assim, Jim permanece em silêncio. Então deixo minha mente vagar, vejo as pessoas curtindo o fim de tarde na cervejaria. Vejo uma garota de cabelos pretos e compridos sentada com os amigos, o jeito que ela joga a cabeça para trás para rir me lembra Natalie.
Imagino o que Natalie vai pensar de Camila. Elas não poderiam ser mais diferentes, desde o jeito que agem até o jeito que se vestem. Apesar de tudo elas tem uma coisa em comum: as duas falam e apontam minhas merdas.
Camila até mais do que Natalie. E honestamente, estava de saco cheio hoje.
Okay, eu até admito que estava falando besteira na cafeteria com aquela história de plano de 5 passos. Mas Camila parecia precisar de um e não deve ser difícil inventar mais quatro.
Ainda mais porque já fiz isso várias vezes, só tenho que parar e pensar nos passos e agora entendi que o que funciona para mim, talvez não funcione para Camila.
Essa é a chave para tudo dar certo, que funcione para Camila.
Lembro dela derrubando a bebida da garota hoje e toda a interação estranha que aconteceu depois.
Achei que se mostrar para ela o que fazer fosse suficiente. Não sei, tipo dar a ela a ferramenta e coloca-la em um ambiente sem consequências. Só não esperava aquele pequeno acidente, no segundo que a bebida caiu, percebi como eu tinha ferrado tudo.
Pude praticamente ouvir Natalie me dizendo que joguei Camila aos lobos e que não estava ajudando ninguém.
Mas então, o pequeno sorriso no rosto de Camila quando conseguiu. O olhar de choque quando ela percebeu que funcionou e o fato de que ela pensou que Dusitn só estava interessado em estudar.
Sorrio. É nisso que tenho que focar, Camila tem que encontrar as partes dela que Cora vai amar e…
- Pedido! - Jim chama e eu volto a ação, pegando a caixinha de papelão e entrego com um único guardanapo ao cliente.
- Obrigada - digo para o rapaz de fraternidade, dando um sorriso malicioso para ele enquanto pega a comida.
Conforme eu esperava, ele mexe nos bolsos, pega alguns dólares e coloca no pote de gorjetas, que está cheio e com sorte, vou receber uma parte dele hoje.
Quando o rush da hora do jantar acaba, uma das bartenders do lugar vai até a janela e o Sr. Garfos de 7 centavos e para minha surpresa, ele entrega um queijo quente de graça para ela.
- Vocês querem alguma coisa lá de dentro? Cerveja? Cidra? Latas para a viagem?
- Não - ele responde e eu nego com a cabeça também, mesmo sabendo que se eu chegar com cerveja artesanal na próxima festa me tornaria uma subcelebridade.
A bartender agradece Jim e volta para a cervejaria.
- Parece um bom benefício do trabalho. Não bebe em serviço? - pergunto para ele
- Beber no serviço foi tudo que fiz durante uns 20 anos - ele fala enquanto vira um hambúrguer - Alcoólatra em recuperação
É o máximo que conversamos durante o trabalho, mas eu olho para outro lado, quero perguntar mais para Jim. O que ele fez com ele parasse, como ele parou, mas um grupo pequeno de pessoas vem até a janela, coloco um sorriso no rosto e anoto os pedidos. 
O relógio já marca perto de meia noite quando fechamos. Jim sai do caminhão para fumar e eu fico embalando e guardando os queijos.
Vejo ele dar uma volta ao redor do caminhão antes de jogar a bituca fora e voltar para dentro para contar o dinheiro.
- Pagamento é 15 dólares por hora - ele fala segurando um lanche embalado em uma mão e um maço de dinheiro na outra - Você fica com metade das gorjetas.
Penso em negociar a questão das gorjetas, já que sou o rostinho bonito que com certeza trouxe um monte de dinheiro, mas tenho certeza de que ele não é uma pessoa fácil de ganhar.
Pego o dinheiro da mão dele, aliviada que consegui o emprego.
- Você pode ir - ele aponta para um ponto de ônibus do outro lado da rua - Tenho seu número, amanhã te mando mensagem com os horários.
Vou para a porta dos fundos do caminhão, mas antes de sair olho para ele.
- Fiz bem, não fiz?
Ele balança a cabeça e dá uma risadinha enquanto coloca os ganhos da noite em uma bolsinha.
- Saia do meu carro antes que eu mude de ideia.
Não precisa me dizer duas vezes, pulo do carro rindo.
Chego no meu apartamento e vou contar o que recebi hoje.
Cento e oitenta e dois dólares em dinheiro vivo.
Decido dividir em dois potes, um para mim e um para minha mãe, como sempre fiz.
91 dólares em cada, esse valor são todos os meus livros, quase 1 quarto do meu aluguel ou muita comida, a não ser que eu continue comprando café caro na faculdade.
E para minha mãe, provavelmente deve valer uma semana de bebida.
Solto um longo suspiro antes de cair na minha cama. Estou exausta. Minhas pernas doem das horas em pé, meus olhos começam a fechar, meu celular vibra do meu lado quando chega uma mensagem de Natalie.
Natalie. Parei de mandar mensagem fazem dois dias, pela falta de resposta. Sabia que se eu a desse espaço ela me responderia.
Abro a mensagem no Instagram, é uma foto, luto para manter os olhos abertos, abro a mensagem. Uma foto dela, com a mesma camiseta do Led Zeppelin com um texto: Show incrível no Texas hoje, acho que essa camiseta me dá sorte.
Sorrio.
Abro minha câmera, tiro uma foto e coloco um monte de emojis de corações. Deslizo o dedo até o botão de enviar, enquanto meus olhos se fecham.

She Gets the GirlOnde histórias criam vida. Descubra agora