IV

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Camila

Depois de jantar um miojo ontem e comer um bolinho de morango no café de manhã de hoje, decidi que não posso mais adiar me aventurar pela cafeteria do prédio.
Quando saio do elevador no hall de entrada, vejo uma moça de pé, em frente a entrada de uma das áreas comuns.
- Oi, você está aqui para o evento? - ela me pergunta
- Ah não, só estou… - aponto para a porta da saída, mas ela me interrompe.
- Ah entra, participa, vai ser divertido - o sorriso que ela tem no rosto me faz acreditar nela.
Eu não sei que evento é esse, mas melhor tentar conhecer algumas pessoas, antes de ficar parada no meio da cafeteria procurando um lugar para sentar e almoçar.
Dentro da sala tinha umas 40 pessoas espalhadas, uma mesa com uma tigela com pacotes de balas e muitas bananas. Um combo estranho de petiscos, mas ok.
Começo a pensar em um plano de me sentar em algum meio, pego uma banana e vou procurar um lugar. Quando me dou conta já estou em um canto sozinha. Ótimo começo.
Quando uma de duas mulheres que estão na frente da sala pega um pote de de bolinhas de ping pong percebo que acabei de entrar em um evento para alunos se conhecerem
Não que eu esteja reclamando.
Esses eventos e brincadeiras foram feitos para pessoas como eu, um jeito de nos forçar a ter uma interação social, mas bem que podia ter uns jogos de Ping Pong, nisso sou boa.
Quando parece que elas vão começar, eu descasco minha banana e dou uma mordida. Então noto um garoto me encarando do outro lado da sala.
Olho de novo então reconheço, Christopher Matthews, fizemos alguns trabalhos juntos ano passado. Eu aceno e ele sussurra alguma coisa para o cara que está parado ao lado dele antes de atravessar a sala em minha direção.
“Seja legal, Camila. Seja normal”. Já conversei com ele várias vezes na escola, então vai ser tranquilo.
- Ei Camila, tudo bem? - Ele sussurra encostando na parede ao meu lado.
- Tudo tranquilo - me forço a manter a conversa - e você?
- Meus amigos me arrastaram pra cá - ele fala olhando para alguns caras do outro lado da sala, que estavam rindo e se empurrando como se conhecessem a anos.
- Estou ansiosa pra começar - ele me olha de um jeito esquisito.
O silêncio se instala, mordo mais um pedaço da banana.
- Camila? - olho pra ele - Eu vim aqui para te avisar. Eu... acho que essas bananas não são para comer. - Ele me avisa e sorri.
As mulheres que estavam na frente se viram. Uma delas está segurando uma banana e um pacote de balas. E a outra está com um balão cheio de bolas de ping pong.

Aquilo não é um balão.
E não são pacotes de balas.

- Ai meu Deus - sussurro morrendo de vergonha enquanto uma das mulheres coloca uma camisinha em uma banana - Achei que íamos jogar alguns jogos - admito para Chris, que está se esforçando para segurar o riso - O que eu tô fazendo aqui?
- Banana grátis? - ele dá de ombros - Além do mais, agora você sempre vai saber o jeito certo de usar uma camisinha.
- É, mas eu sou gay - conto pra ele, estou com tanta vergonha, que nem percebo o que acabei de falar.
Ele ri, muito.
- Você nunca me disse isso, então acho que só uma banana grátis.
- O que você vai fazer depois daqui?
- Nada, na verdade, vou sair à noite. Você se lembra de Kristen Osborne? - eu concordo com a cabeça, lembrando da líder de torcida loira que se formou anos antes, quando estava entrando no ensino médio. - A sororidade dela está dando uma festa hoje. Você devia ir - Ele fala como se não fosse nada.
Eu não sou convidada a uma festa desde o fundamental, quando as crianças eram obrigadas a convidar a sala inteira para os aniversários.
- Sério?
- Claro. Vou te mandar as informações no insta.
Assistimos enquanto a mulher em frente enchia uma camisinha com bolinhas de ping pong.
- Então, se ele disser que é muito grande pessoal, vocês já sabem que é mentira.
Olho para ele e aproveito para perguntar - Você acha que vão ter muitas pessoas de Oak Park lá? - já esperando ouvir um nome em específico
Ele dá de ombros - Matt, Tim, Brie, Cora…
Meu coração erra a batida. O resto das palavras dele viram um amontoado de barulhos. Faz tanto tempo que não vejo ela e agora vou ter a oportunidade de conversar com ela. Em uma festa. E eu fui convidada.
Esse é meu recomeço. E não poderia ser mais perfeito.
Quando a apresentação acaba me despeço de Christopher e volto para meu quarto. Deito em minha cama e fico esperando o convite da festa. Consegui conversar hoje, talvez não deva me forçar a ir em uma festa, talvez eu deva ficar em casa, com uma xícara de chá, reassistindo alguns episódios de Wynonna Earp.
Sem alguém para dividir o quarto, como tinha planejado, preciso me adaptar. Não posso parar de tentar, ficando só no quarto. Decido ir até o apartamento de Nic, conversar com ele sobre a festa, torcendo para que ele tenha algumas dicas pra me dar e até lá são apenas 10min de carro.
Ele abre a porta segurando um pedaço meio comida de pizza de pepperoni, vestindo uma camiseta de baseball e uma calça de moletom da Nike. Uma das vantagens do home office. Depois que ele se formou ano passado, Nicolas conseguiu um trabalho em uma das start-ups mais legais do país, com base aqui em Pittsburgh. Então ele está sempre trabalhando em programações de coisas maneiras, como braços robóticos.
- E aí? -  Ele me fala antes de morder um pedaço da pizza.
- Pensei que os crossfiteiros só comiam coisas saudáveis. Frango, batata doce, shakes de proteína - comento enquanto entramos no apartamento.
- Não me coloque em um estereótipo. Você aceita? - ele me mostra o pedaço da pizza comida - Tem metade na caixa ainda.
- Vou aceitar - digo seguindo-o para a cozinha, ele pega um pedaço da caixa e me entrega
- Já fez algum amigo no andar? - ele pergunta e eu balanço a cabeça e mordo um pedaço da pizza - Sabe Mila, você é tipo … - ele procura as palavras - Você é legal e outras pessoas pensariam isso também se você desse a elas uma chance.
As palavras dele me acertam.
Quando não dei chance?
Então penso em Christopher, conversei com ele hoje, mais do que em um semestre inteiro quando estávamos na escola. Talvez ele tenha razão.
Respiro fundo.
- Fui convidada para uma festa mais tarde, mas estou com medo de ir.
- Vai! - ele responde sem hesitar - Assim, não quero te dizer o que fazer, mas … festas de faculdade são meios para um fim.
- O que você quer dizer?
- Foi em festas que conheci o Dave e o Noah. Até conheci a Kendra em uma festa.
- Kendra te traiu e partiu seu coração - relembro ele.
O olhar que ele me dá me diz que ele não precisava ouvir esse comentário.
- Mila, o que quero dizer é que conheci alguns dos meus melhores amigos em festas - ele dá de ombros.
- Cora vai estar lá.
- Camila! Você precisa ir. Está brincando comigo?
Começo a sentir a ansiedade, só de pensar em ir, mas sei que ele está certo.
- Eu sei, eu sei. Tá bom. - eu dou um suspiro exagerado e me jogo de maneira dramática em uma das cadeiras na cozinha dele.
- Ótimo, mas uma coisa - ele aponta o dedo em minha direção - Sem beber e dirigir.
- Tá bom mãe - dou uma risada - Provavelmente não vou beber nada mesmo.
- Bom - ele dá de ombros - Talvez beba um pouco.
Meu telefone toca e vejo a notificação do Christopher no Instagram “ ei, espero te ver lá”.

She Gets the GirlOnde histórias criam vida. Descubra agora