Mariah - "boca amordaçada"

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Alguém puxou a taça da minhas mãos e sai sem se importar comigo, outra pessoa me levanta como se eu fosse aqueles bonecos infláveis de posto de gasolina. Pelo menos a escadaria é perto da saída, o homem colocou o braço em meus ombros e me tirou do coquetel. Saio de olhos fechados de vergonha e por causa da tinta que escorre pela minha testa também.
Não vejo quem me arrasta até os elevadores, sinto só o perfume.
As portas de alumínio se fecham e então uma risada ecoa.

-Desculpa, até que consegui segurar por bastante tempo. - Ergui a cabeça para me deparar com Jessie engasgando de tanto rir. - Você está parecendo aquela menina do filme, que jogam sangue no palco do baile.

-Carrie?

-Isso, Carrie, igualzinha. - Surpreendo - me ao rir junto com ele, apesar de sentir o bolo na garganta de um choro que sairá mais tarde. - Pense por esse lado, você inaugurou a casa de show, me diz que boate noturna não tem quedas e vexames, hm? Você foi a primeira. - Jessie sustentou um sorriso grande daqueles que mostram os dentes, apertei os lábios um contra o outro, segurando o ar, ele não está ajudando.

-... - Solto o ar e tento apagar aquela imagem da minha mente para sempre.

Enfim saímos do shopping e a brisa que me encontra do lado de fora é inexplicável, me senti nascendo de novo, deve ser por isso que o bebê chora ao sair da barriga da mãe, por causa da brisa. Certeza.
Estou delirando, outra certeza.

-Eu a levo para casa. - Disse ele, mantemos uma distância maior um do outro e pude reparar que sujei sua roupa de tinta, sinto-me culpada.

-Não precisa, no momento estou hospedada nesse hotel aqui na frente. - Jessie olha para o hotel e volta a me olhar com uma sobrancelha erguida.

-Você tem alguma coisa com o Chase?

-O que você acha?

-Eu acho que não.

-Então está achando certo, eu vou indo, estou precisando me esconder pelo resto da vida. - Ele se despede com um sorriso solidário e tento retribuir, mas temo que não estou em condições de sorrir levianamente.

-Fica tranquila, e descansa um pouco.

-Obrigada, e desculpa por tudo.

Parti.

Subi pelas escadas de emergência com vergonha de atravessar o hall do hotel para pegar o elevador. Fui deixando o rastro pelos degraus, a tinta escorria e sem querer meus olhos com inveja quiseram escorrer também. Eles se encheram e lágrimas lavaram minhas bochechas, me enganei ao pensar que o choro era por causa da ardência causada pela tinta, respirei fundo e falei para as paredes escuras ouvirem.

-A vida consegue ser tão triste ás vezes. - Ouvir minha voz embargada piorou a cena.

Continuei subindo, num ritmo que ia diminuindo a cada passo, porque tão alto? Segurando no corrimão me impulsiono para cima, meus dedos ardem dentro desse salto, estou exausta.

"Because I'm happy, clap..." - A música do Pharrel Willians ecoa pelo lugar, é o toque do meu celular pessoal. Bem irônico escutar essa música agora. Lembrete: Trocar o toque.

-Alô. - Atendo o número desconhecido irritada, para disfarçar a voz de choro.

-Onde você está? - Chase?

-Tentando subir na vida. - Soltei uma risada descontente. - O que você quer?

-Saber como se sobe na vida depois de mergulhar na tinta vermelha e se jogar escadas abaixo. - Paro de subir e encosto na parede, fecho os olhos e quase vejo o seu sorriso debochado.

As quatro agendasDonde viven las historias. Descúbrelo ahora