Capítulo Trinta e Quatro

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— Claire? — ela pergunta.

Ouço o som de sapatos pisando nas folhas mortas e nos galhos lá fora. Os pés que tocam o chão parecem estar cercando a barraca. Cerquem o perímetro.

— Abaixem — tento falar o mais baixo possível.

As crianças me obedecem e se deitam na grama. Faço um sinal para Anne também se abaixar. Sua expressão é uma junção de confusão e medo. Me deito junto à todas as crianças que tremem no chão. Ficamos assim por vários segundos.

Não sei o que a LPB vai fazer, mas desconfio deles tentarem fazer a mesma coisa que fizeram naquele armazém onde eu e Harry fomos para descobrir sobre o Centro.

Meu peito quase explode quando uma bala passa zunindo por cima de nós. Algumas crianças gritam. Outra bala passa, rasgando a barraca.

— Fiquem abaixa... — não consigo terminar, pois sou interrompida por uma explosão de disparos.

A barraca fica completamente cheia de furos e rasgos. Tiros não cessam. As crianças gritam.

Quando os tiros param, nós permanecemos no chão até que os passos deles comecem, se aproximando da barraca. Nos levantamos.

Vou até Anne e ofereço a arma que estava pendurada pela alça no meu pescoço.

— Sabe atirar? — pergunto.

— Mais ou menos... — ela diz, com as mãos tremendo.

Percebo que está segurando para manter as lágrimas nos olhos. Entrego a arma para ela. Pego o arco de Julio, o amigo de Mike que está neste exato momento morto no chão.

De repente, ouço o barulho da barraca rasgando atrás de mim. As crianças soltam um grito agudo de pavor. Pego uma flecha e me viro para o rasgo. Vejo um soldado avançando em minha direção. Disparo uma flecha e ela atravessa seu colete, bem no coração. O soldado cai de joelhos e desaba na grama.

Quando olho para o rasgo novamente, sou surpreendida por outro soldado vindo em minha direção. Não tenho tempo para puxar outra flecha e disparar, então golpeio o capacete do soldado com força máxima. O capacete explode em cacos de vidro e eu sinto o arco acertar a têmpora do soldado. Vejo seu corpo cair morto no chão.

Ouço a barraca rasgar em outro canto e me viro. Vejo Anne disparar contra os soldados que tentam entrar. Ela realmente não é muito boa nos tiros, mas consegue manter os soldados afastados.

Ouço passos passando pela entrada da barraca e viro meu corpo, já ajeitando uma flecha no arco. Dois soldados entram com pistolas. Atiro uma flecha em um deles e corro para acertar a mão do outro com um chute. Meu pé pega em sua arma e ele dispara no chão, perto das crianças. Elas gritam mais ainda. Não posso deixar eles acertarem elas. Não posso deixar eles acertarem Anne.

O soldado acaba derrubando sua arma e eu pego outra flecha. Não ajeito no arco, eu a enfio contra o peito do soldado. Sinto meus pelos se arrepiarem quando a ponta da flecha passa pelo peito dele, acerta seu pulmão e sai pelas costas. Nisso, eu ouço um estalo e vejo vários pedaços de metal voarem para todos os lados atrás do soldados.

Então eu percebo que é uma flecha explosiva.

Jogo o corpo do homem para frente e salto para trás, caindo no chão perto das crianças. Percebo que as flechas da minha aljava acabaram caindo e se espalhando pela grama. Explosões ocorrem na entrada da barraca. Nenhuma delas é capaz de acertar a mim ou as crianças. São explosões pequenas. Elas só causaram todo aquele estrago naquele prédio, pois o concreto estava velho e vulnerável.

As crianças ficam cada vez mais desesperadas. Eu me viro para elas e vejo algumas delas caídas e chorando no chão. Nenhuma parece ter levado algum tiro de algum soldado, mas elas estão muito desesperadas.

— Deitem no chão — falo. — Não vou deixar eles atingirem vocês.

— Claire! — ouço Anne gritar no meio dos disparos.

Olho para ela e vejo que mais soldados começam a aparecer pelo rasgo que eles fizeram perto dela. Ela não está conseguindo tomar conta de tantos soldados e eu percebo que um tiro já passou de raspão um pouco acima de sua cintura, onde há um rasgo na camisa e mancha de sangue.

Sinto meu coração bater em meu peito. A adrenalina corre em minhas veias e eu me sinto altamente agitada. Tenho uma ideia, mas não sei se é uma boa ideia.

No desespero, começo a colocá-la em prática. Me arrasto na grama, procurando uma flecha explosiva. São muitas flechas. Pego uma, mas quando vejo que é normal eu a jogo para longe. Apalpo a grama e encontro outra flecha. Um pingo de esperança aparece em mim, mas logo se vai ao perceber que é uma flecha normal. Quando ouço Anne gritas meu nome de novo, meu desespero aumenta. Apalpo o chão com mais rapidez do que antes.

Nisso, percebo que uma das crianças está se levantando enquanto as outras continuam deitada. Ao olhar para ela, a reconheço como a menina que eu salvei lá fora quando ela caiu. Ela segura uma flecha. Explosiva.

Me levanto em um pulo. Tomo o máximo de cuidado para não pisar nas crianças que estão no chão e me agacho ao lado da garota, que me entrega a flecha imediatamente.

Quando olho para Anne, percebo que não tem mais munição em sua arma.

— Anne, vem pra cá! — grito.

Ela joga a arma para longe e corre na nossa direção. Atiro a flecha contra um soldado que estava entrando na barraca. Meu tiro o acerta, mas percebo que ele consegue fazer um disparo certeiro em Anne antes das bombas começarem a explodir.

Perco totalmente meu ar. Anne cai na grama sangrando e gritando de dor. O tiro atingiu algum lugar de suas costas que eu não consigo ver. Meu coração se parte ao ouvir os gritos agonizantes dela que se misturam aos gritos das crianças.

Me levanto e corro até seu corpo. Percebo que a bala atingiu seu ombro. Ela se vira de barriga para cima e eu me agacho ao seu lado.

— Anne! — digo. — Não, não...

Ela treme muito e com dificuldade consegue dizer:

— Está tudo bem. A bala não está dentro de mim e acertou apenas meu ombro... Eu não vou morrer — ela fala, tentando me tranquilizar.

Mas não me tranquilizo. Ela levou um tiro. Por causa da LPB. Por causa de mim. Eles estão aqui por mim. Eles me querem.

Eles não querem Anne. Eles não querem Mike. Eles não querem Tomás. Eles querem apenas eu. E só há uma maneira de acabar com tudo isso.

Lágrimas escapam de meu olho. Eu preciso acabar com isso. Deixo meu arco no chão ao lado de Anne e sem dizer nada, corro para fora da cabana. Sou recebida pela mira de quatro armas diferentes.

— PAREM! — grito levantando as mãos e deixando minha aljava vazia cair na grama. — SOU EU QUEM VOCÊS QUEREM!

Me ajoelho no chão, deixando minhas lágrimas caírem.

— Eu estou aqui... — tudo que eu consigo pensar é Bia, Harry, Ariana, Justin, Dylan, Demi, Niall... Eles correram tanto perigo por mim. Eles queriam vencer a guerra. Eles queriam me salvar. Mas eu preciso salvá-los. Eu preciso acabar com essa guerra. — Eu estou aqui.

Fico parada quando os soldados colocam meus braços atrás das costas e me prendem com algemas de metal. Eu poderia muito bem me soltar dessas algemas e atacar os soldados.

Mas eu não faço isso. A guerra acabou. Eu perdi. Nós perdemos. Max conseguiu o que queria. Estou indo algemada para sua base debaixo da terra.

O homem que me algemou me levanta, puxando meu rabo de cavalo. Ele me segura pelos braços e diz no meu ouvido:

— Acabou pra você, Escolhida.

Olho para trás, vendo de dentro da cabana Anne me olhando. Ela segura seu ombro ferido e fica na frente das crianças, que também assistem a cena. Suspiro. Com a cabeça abaixada, começo a andar com os soldados.

Até um disparo acertar o soldado que estava me segurando.

Sou solta e me viro para a mesma direção que os outros se viram. Vejo Tomás se aproximar com um grupo de sobreviventes armados.

Escolhida || Livro 2 da Trilogia SinistraWhere stories live. Discover now