Capítulo 14

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Encontrei um lugar perfeito para chorar as pitangas ao lado de duas garrafas de uísque; O terraço gigantesco e muito solitário do hotel. Não pude observar com detalhes a decoração do lugar, estava um pouco escuro e a minha visão não era uma das melhores. Mas o pouco que pude perceber, era muito bonito. Um jardim vertical dava meia volta por todo o terraço, conseguia sentir o perfume das flores, mesmo com o cheiro forte da bebida impregnado em cada pedacinho de mim. E quanto os móveis do terraço, aparentavam serem de boa qualidade. As espreguiçadeiras, mesa e cadeiras brilhavam com a luz da lua. Não sei se eram de inox ou os móveis possuía uma pintura especiais para dar aquele efeito. Ou era a bebida junto com os meus olhos embaçados de tanto chorar.

Sentada sobre o parapeito e afundando os meus problemas com a boca no gargalo da garrafa, resmungava entre um gole e outro da vida miserável que tivera até ali. Primeiro foi o meu nascimento emoldurado de decepção. E veio a minha maldita impulsividade aumentando a cada centímetro e aniversário adquirido. E mais impulsividade e mais... e mais. Mais. O desprezo do meu pai e a violação do meu corpo, tudo em um dia! E o abandono, julgamentos e algumas outras impulsividades.

Houve um período de paz em que julgamentos não tinham o poder de me abalar e impulsividade não era mais uma parte feia de mim. As pessoas me viam com respeito e admiravam a minha inteligência que ia além dos meus looks caprichados, peso ideal e rosto bonito. Elas confiavam nos seus projetos milionários em minhas mãos porque acreditavam cegamente em mim. Era a melhor na área e chegava a ser motivo de disputa por grandes empresas.

Eu era o centro das atenções, e não por um motivo sórdido.

E estava bem.

E estava muito bem.

Pensava que tinha superado o suficiente para que o passado não pudesse me assombrar, porém, sem aviso prévio, fui sujeitada a descer do salto e abraçar todos os meus traumas. Forçada a revivê-los e questionar a todo instante os meus comportamentos.

Eu não queria viver aquilo.

Eu não queria viver aquilo de novo.

Os julgamentos, as risadinhas maldosas depois de um comentário insensível, a conversa encerrada com minha chegada acompanhada de olhares tortos, a privação de um carinho de alguém que antes se importava comigo, a falta de fé para encontrar o meu caminho, o choro preso na garganta o dia inteiro... a vontade de morrer se expandido a cada respirada.

Eu não podia viver aquilo de novo.

Já era uma adulta que... nada sabia. Só raiva de si mesma por colaborar involuntariamente em sua descida do salto. Por que diabos eu escrevia do Ted daquela forma? Por que gravava vídeos aleatórios de dança dando espaço para que as pessoas falassem mais?

Doía assumir, mas a única culpada de fazer a minha vida em um inferno era eu.

Eu.

Eu? Por que faria isso comigo?

— Por que faria isso comigo, Laura Steven? — falei alto o suficiente para que pudesse escutar a indignação de uma parte de mim. — O terapeuta já disse uma vez que a culpa não é sua e por que ainda sente, garota? Eu te odeio quando pensa nisso, por favor, pare! — Soluçando, pois chorar já não conseguia, voltei a levar a garrafa a boca e dei três longos goles seguidos. — Ah, Laura Steven, se te conhecesse na infância eu te ajudaria a não se meter nesse ciclo sem fim. — disse, largando a garrafa ao meu lado e comecei a me mimar, cantando Twinkle, twinkle, little star enquanto olhava para o céu.

— Laura?

Uma mão tocou em meu ombro, fazendo me calar. Envergonhada, fechei os olhos e pedi para as criaturas mágicas que o levassem para longe de mim. Não queria ter que explicar minha a cantoria misturada com soluços a ninguém.

Descendo do SaltoOnde histórias criam vida. Descubra agora