Capítulo 17

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Algo quente tateava o meu rosto freneticamente, afetando a qualidade do meu sono. Cobri o rosto com lençol e virei-me enquanto resmungava alguns monossilábicos impossíveis de decifrar o seu significado. Não houve desistência pela parte oponente e, desesperado, balançou o meu corpo até que abrisse os olhos. E ao tirar o lençol do meu rosto e abrir os olhos, a primeira coisa que vi foi o Gregório ajoelhado, sobre a cama, ao meu lado.

— Enfim! — suspirou aliviado e sentou-se, aguardando as minhas primeiras reações que levaram algum tempo.

Parecia que ele já sabia como eu funcionava ao acordar. Lenta. Precisava de um certo tempo até me situar no estado que estava. E onde estava. Minha mãe nunca entendeu a minha lentidão ao acordar, principalmente a lentidão matinal. Ela gritava que eu era preguiçosa e não se esforçava para ajudá-la em nada. Teve um período que ela conseguiu um bom contrato de trabalho na prefeitura como assistente administrativa, tinha que acordar cedo para deixar alguns serviços domésticos pronto e me levar à escola antes de ir ao trabalho. Mas, ela sempre atrasava no trabalho por minha causa. Às vezes me acordava uma hora mais cedo do que o normal e quando estava muito impaciente com a minha demora me deixava em casa trancafiada e ia trabalhar. Amava quando aquilo acontecia, antes do acidente com a eletricidade.

Um dia atípico, eu sozinha em casa, resolvi conectar o rádio portátil, uma aquisição caríssima feita pelo meu pai por ser a grande novidade do momento, em uma tomada nem um pouco segura. Estava com vazamento de corrente elétrica. Ao ligar só escutei um barulho, o interruptor meio que explodiu e eu fiquei no escuro, muito assustada e com medo da bronca que levaria, até a mamãe voltar.

Ela não me deu uma bronca pesada e nem tampouco me acolheu. Poderia ter perdido a filha ao ser morta eletrocutada e a culpa seria dela porque eu era uma criança! Se eu tivesse uma filha e passasse por aquilo, a acolheria e pediria desculpas. A única coisa diferente que ela fez foi me deixar comer quatro fatias generosas de bolo acompanhados com muita Coca-Cola e pediu que não comentasse nada com meu pai senão ele surtaria pela perda do rádio.

Não sei, até hoje, se ela estava falando a verdade ou não queria que meu pai soubesse que ficava, às vezes, sozinha em casa por de mais de oito horas.

— O que foi, Gregório Louise? — perguntei, assim que minha alma retornou ao corpo.

— Sabe fazer nó de gravata?

— Gregório Louise, não te creio! — suspirei, não o enxergando, à medida que me sentava. — Como pode me despertar para isso? Fazer um nó idiota que todo mundo sabe fazer? Eu não creio nisso!

— Desmanchei sem querer o nó da minha gravata e agora não sei fazer. — Ele apontou para a gravata em volta do seu pescoço como se fosse um cachecol e fez uma cara de súplica.

— Vai sem. — disse, voltando a deitar e me cobri até a cabeça.

— Laura, uma boa ação para um jovem necessitado? — Gregório ficou repetindo várias vezes a mesma coisa até me fazer mudar de ideia.

Dei um grunhido alto e raivoso ao me livrar da coberta e sair da cama. Ele, por outro, comemorou com um largo sorriso e, às pressas, parou em minha frente. Peguei a gaveta e de maneira certa a envolvi em seu pescoço, não deixando de reparar o elegante traje que vestia. Pela primeira vez o via em roupas sociais, parecia até um componente do grande escalão da Lex.

Estava lindo. Mais do que era.

— Está charmoso, Gregório! — disse enquanto fazia o nó.

— Demorei tanto para usar que pensei que não daria mais. — comentou ele, observando a maestria das minhas mãos em fazer um nó perfeito. — Você é muito boa nisso! Onde aprendeu?

Descendo do SaltoWhere stories live. Discover now