Experiência 3.9 e 4.5

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 Eu e Alehandro marcamos de nos encontrar na sexta feira, mas chegou no dia e ele disse que teria que ir na irmã dele e só poderia me pegar às dez, o que acarretaria no fato de eu ter que dormir na casa dele, para meu desespero. Não que eu não fosse maduro suficiente pra dormir na casa de um homem, mas há diversos níveis de intimidade pra eu ficar a vontade com esse evento.

Pensei bem e quase desisti, mas resolvi aceitar dormir lá.

Nos encontramos na estação e ele quase me arrastou para o Autorama, um estacionamento onde os gays ficam paquerando e se pegando a noite toda, mas eu (chato que só eu) falei que não queria ir. Então caminhamos pra casa dele mas antes passamos em uma pizzaria, onde ele comprou uma pizza e levou junto para comermos.

Na casa dele, conheci o gato que estava doente (típico, homem de 39, mora sozinho, tinha que ter um gato). O gato ficou me encarando, não pareceu gostar de mim. Me perguntei quantos outros garotos aquele gato não ficou encarando até hoje...

Após enchermos o bucho de pizza, ele colocou o gato na cozinha e começamos a nos beijar. Apagou a luz e acendeu outra, daquelas de balada que fazem o branco brilhar, e sua roupa era toda branca. Com aquele corpo monumental (o mais perfeito que eu já vi ao vivo) ele me envolveu e................

O que eu tenho a dizer é que essa foi minha mais plena experiência em vida... Antes dessa noite eu era menino, e então virei homem, rsrs. Foi inesquecível, incrível, estonteante.

Depois de tudo, tomamos banho, ele me mostrou seu álbum de fotografias, falou sobre seu emprego no laboratório de física, onde transformam materiais dentro de uma caixa, e fiquei fascinado com ele, com seu poder de persuasão e com seu jeito com rapazes mais novos (convenhamos que um 3.9 interessar um 2.4 não é fácil).

Dormimos na mesma cama, sem contato, e consegui dormir legal. De manhã, acordei primeiro e fiquei olhando-o dormir. E minha cabeça então começou a viajar.

Eu não me apaixonaria por um homem desse, mesmo com todos esses atributos. Desde o princípio eu determinei que ele seria apenas um rapaz com o qual eu faria sexo, e minha mente não permitiu nenhum tipo de aprofundamento, nenhuma centelha de pensamento de ter algo além daquela noite inesquecível. Eu não deixaria que nenhum sentimento me tomasse por que jamais confiaria em um homem com a vida que ele leva, com o perfil de onde o encontrei (o que não passa de um preconceito meu [?!?]).

O fato é que nem olhando-o dormir e achando-o lindo com aquele rosto sem nenhum sinal da idade, eu consegui imaginar um "e se" entre nós.

Pela manhã, não nos beijamos, parecíamos dois conhecidos que dividiram a cama e que acordaram de manhã e partiram, mas a conversa que tivemos foi legal e natural. Eu disse que curti muito a noite e ele me deixou na estação. Não marcamos mais nada, nem sabia se marcaríamos. Após dormir no trem, vim caminhando pra casa e pensando.

"Eu tive o cara mais bonito que podia ter, com o corpo mais perfeito e que me deu a noite mais perfeita que eu podia esperar... Isso pra mim é suficiente. Mas não quero ficar nesse jogo, quero alguém que não precisa ser perfeito, que não precisa ser o melhor de cama, mas que possa me aprofundar legal... Alguém que durma abraçadinho e que, ao acordar, continue gostando de mim..."

Sim, eu sou chato, podem falar. Mas.... que foi bom... ah, isso foi...

No domingo, decidi ir na Tunnel, pra variar. Não peguei ninguém, pra variar mais ainda, só fiquei encantado com um cara que sentou do meu lado após dar dois foras e com o qual não tive coragem de conversar, mesmo ele olhando disfarçadamente pra mim.

O destaque da noite foi o pós-balada. Na Sé, algumas pessoas perguntaram-me como chegar ao Anhangabaú e eu disse que era uma estação depois. Ai, quando entraram no trem, um rapaz e um senhor disseram que eles estavam indo pelo sentido contrário. Eu virei bravo e falei que não, que estavam certos, ai os dois reconheceram que erraram e eu fiquei feliz (super feliz, rsrs). O senhor rindo de sua (burrice) confusão sentou-se no banco à minha frente.

Na Barra funda, desci as escadas e na estação cruzei com o senhor novamente.

—Oh, nos encontramos de novo!!

Eu nem me lembrava mais dele. Mas ai ele me relembrou quem era.

—Prazer, Hamil.

— Arthur.

—Mora aonde, Arthur?

—Zona Oeste...

—E vem de onde?

—Da balada...

—Qual?

Dei uma risadinha sem jeito, e então falei.

—Tunnel...

—Ah, a Tunnel, faz tempo que não à frequento....

Ai que me toquei. O cara era gay. Achei aquele papo um saco (se fosse um cara bonito eu adoraria), e estava decidido a dormir quando entrássemos no trem. Mas ai ele perguntou:

—Namora?

E eu respondi:

—Terminei.

Comecei a contar toda a história, o por que de ele ter terminado comigo e tudo mais. E então, após falar um pouco que devia ter sido melhor assim, pois bissexuais são as pessoas mais confusas que existem, ele disse:

—Fui casado com um homem por 14 anos... eu desisti de tudo na minha vida por ele. Hoje não tenho apoio da família, e ele também não. Dividimos tudo juntos. Mas ele terminou. Hoje, se arrepende. Me liga, diz que me ama, mas me feriu muito. Não tem volta.

—Nossa, foi tão duro assim que não possa ser perdoado?

—Foi. Amor é complicado. Hoje tenho 45 anos... Vivo minha vida plenamente por mim. Esse é o segredo.

—Sabe que é isso que eu procuro? Amor. Esses dias tive a melhor noite da minha vida com um cara mais velho, foi ótimo... Mas não sentir o amor tem me incomodado.

—Não fala isso, é ruim demais. O amor só trás renúncia, só anula a você mesmo. O amor não trás nada de bom. Como diria Raul Seixas: "Quando lhe jurei meu amor, eu traí a mim mesmo..."

Depois de todo o discurso dele, eu disse, simplesmente:

—É? Mas você sentiu isso. Você amou, sofreu, sorriu e chorou. O ser humano sem isso não é nada... Me diz o que seria da sua vida sem esses 14 anos?!

Ele, depois de uma bomba dessa, não pôde retrucar. Eu ganhei, e novamente fiquei feliz. O amor é uma necessidade absoluta, afinal...

Se minha vida fosse uma série, com temas por capítulo, esse tema seria da idade, da velhice chegando, tempo de decisões. Conheci o Alehandro, 39 anos, que me fez ver estrelas e deixou claro que dividir a vida com alguém não é uma possibilidade. Conheci o Hamil, 45 anos, que talvez tenha deixado de acreditar no amor... e começo a me questionar novamente: Que raios a vida faz com as pessoas que acaba matando esse amor? Ir na Tunnel há 5 anos e ver seu público vagarosamente envelhecer... Me faz pensar se as possibilidades de ter um lugar não estão diminuindo ao invés de aumentar. O medo só aumenta junto às rodas dos ponteiros do relógio, no passar dos dias, dos meses, dos anos....

Diário de um ex-virgem gayWhere stories live. Discover now