"Wicked Games" 38. Capítulo

47 6 0
                                    

TATE LANGDON

Subi até ao andar de cima e lá estava ele na sua pose prepotente a observar-me do fundo do corredor.

-Não tens escrúpulos Tate...

Não podia deixar de concordar com a veracidade daquilo que ele dissera.

-Quem diria, e logo tu, com essa moral toda de defensor da pátria e da tua querida Violet. Como é que és capaz de lhe esconder estas merdas?... Deixa-me adivinhar -sorriu sarcasticamente- tens medo Tate? Tens medo que ela descubra? O que é que será que ela iria pensar de alguém tão monstruoso como tu? Logo ela, aquele anjo doce e inocente. - Ele riu-se desviando o olhar caminhando na minha direcção enquanto eu permanecia imóvel junto ao vão das escadas. Ele não estava a mentir.

-Eu ainda estou aqui. -Soava mais sério desta vez, num tom ameaçador - os meus desejos ainda estão cá. Achas que já não senti o teu sangue ferver de raiva quando olhas para o pai dela? E essa sim, essa é aquela sensação da qual, nem que quisesses, poderias fugir. Porque eu estou aqui. E quanto a ela... Bem ela e aquelas ancas... - suspirou- as coisas que eu podia, aliás tu podias e queres fazer com ela. Não vai demorar Tate, eu estou aqui. 

  Pela primeira vez em muito tempo não fui nem capaz de responder ou enfrentar qualquer uma das suas provocações para comigo. Entrei no quarto, despi a roupa e sentei-me no chuveiro, com a água gelada a cair-me em cima. <o que é que eu estou aqui a fazer? Eu não posso magoa-la. Não posso tocar-lhe...> Várias imagens interrompiam o meu pensamento como uma espécie de flashback repetitivo. A pele dela, o cheiro, o som da madeira do piano ranger quando a deitei em cima, os arrepios, o revirar de olhos, o sabor da roupa interior molhada dela na minha boca, o sorriso...

Berrei com quanta força tive de ódio debaixo da água que continuava a correr. Como eu me odeio, como eu odeio estes desejos nojentos e tudo o que fiz no passado. E chorei incontrolavelmente, sentado no chão do duche agarrados aos joelhos flectidos. Nada fazia sentido e eu não podia mentir -lhe. Eu sabia que tinha de lhe dizer toda a verdade. 

(...)

Não sei quanto tempo chorei sufocado , perdido nos meus próprios pensamentos quando senti a água, inicialmente gelada tornar-se sucessivamente mais quente. Levantei o olhar e senti um arrepio que me percorreu a espinha, 

Alia estava ela, com o cabelo castanho escuro caído sobre o peito generoso. A sua cinta curvilínea rematada com uma anca maravilhosamente arredondada. A tatuagem sobressaía  na pele branca e ela pura e simplesmente olhava-me, bem mais calma do que seria espectável.

Levantei-me atrapalhado pela vergonha, ou quanto mais não fosse, pela surpresa de a ver ali.

-Pensei em fazer-te companhia... - A mão dela, gelada, contrastava com a minha pele que fervia de emoção, percorreu o meu peito e abdómen até tocar no meu membro agora bem mais duro. Colocou-se de joelhos à minha frente e sorriu, Não estava a sorrir com vergonha ou carinho, mas sim com maldade. Recuei e vi a imagem dela fundir-se com o chuveiro e desaparecer lentamente com aquele olhar malévolo e penetrante. A água tornou-se gelada em instantes... Já sabia que aquele momento iria eventualmente acontecer. As alucinações estavam a  voltar. Saí do chuveiro enraivecido coberto com uma toalha que tinha à mão e revirei a minha mala à procura daquela merda. Nada. Remexi tudo de novo, uma e outra vez louco de raiva e cego das lágrimas até encontrar a maldita caixinha de plástico branco translúcido que continha uma série de pílulas acastanhadas. Abri e engoli umas quantas sem sequer me dar so trabalho de preparar uma dose. Já deixara de tomar fazia um bom tempo. Estava convencido que me conseguiria curar sem elas. Achava-as um desperdício de saúde, morte vendida em gramas compactadas.

Deitei-me na cama dela , braços abertos à Cristo Rei, e deixei as lágrimas escorrer livres. Senti-me ficar mais e mais leve. Sorri. Naquele momento não existia qualquer dor, ou emoção. Apenas um alivio assustadoramente persistente. Senti um formigueiro cada vez mais intenso percorrer aos poucos e poucos o meu corpo. A visão estava turva, desfocada. Era como se os meus olhos estivessem a ser fechados. Permiti-me cerrar as pálpebras e apenas ver escuro. Saboreei o doce sabor da moca, com o céu da boca seco e os lábios ressequidos. Arrepios violentos percorriam o meu corpo e começava a perder a noção de espaço e tempo. É como se estivesse perdido num paraíso só meu. E flashes repetitivos de memórias iam passando na minha cabeça. O meu pai, a minha mãe, o meu irmãozinho a sorrir e a brincar, a Violet , todos os amigos que perdi, todas as vezes que cedi aos meus desejos sem me sentir culpado disso. Estava a apagar aos poucos e poucos. Apenas ouvia, ao longe como do fundo de um túnel. Uma voz tão calma e delicada. Eu vou mamã... não me deixes aqui.

VIOLET

-Tate? Tate? -Batia-lhe com força no peito desesperada mas não obtia qualquer reacção. - Tate acorda caralho! - Berrei a plenos pulmões mas nada o fazia acordar. Pensei em gritar pela minha mãe, mas tinham ido sair , visitar uma tia-avó, portanto estava sozinha. 

Gritei uma e outra vez por ele mas nada o fazia reagir nem um pouco. Levantei a pálpebra de um dos olhos fechados. Não reagia à luz. Tinha as pupilas dilatadas. Medi lhe a pulsação carimbando os meus dois dedos indicador e médio sobre a carótida. Sentia o batimento cardiaco muito alterado. Ora acelerava sem razão, ora baixava para um batimento assustador de tão calmo. 

Com muito esforço, puxei pelo seu corpo, em peso morto para cima de mim e encaixei os meus braços nos seus de forma a conseguir arrasta-lo. Não demorou até que conseguisse traze-lo a rasto até ao chuveiro . Liguei a água gelada, o mais fria possível e sentei-me no chão deitando-o entre as minhas pernas, com a cabeça encostada ao meu peito. Abanei-o pelos ombros com quanta força consegui arranjar enquanto berrava o seu nome. Tinha esperança que aquela água gelada o fosse acordar. E estava correta, graças a Deus. 

Senti a mão dele agarrar-me o tornozelo e levantar-se do meu peito como se tivesse acabado de acordar de um pesadelo mergulhado num esgar de dor profundo. Depois de se aperceber, ao fim de alguns segundos onde estava, abraçou-se a mim a chorar e deitou de novo a cabeça no meu peito. Não discuti com ele, não berrei. Não disse nada. Afaguei-lhe o cabelo com carinho e apertei-o para bem perto de mim. Não era, infelizmente a primeira vez que via alguém naquele estado. Sabia que fazer perguntas ia confundi-lo ainda mais e altera-lo. 

(...)

Levantou lentamente o peito de cima de mim e apoiou-se na laje fria do chuveiro olhando-me tão fundo nos olhos que senti por segundos que estava a analisar me, como se procurasse alguma coisa. 

-Eu não sou aquilo que tu pensas. Eu tenho mais problemas do que possas imaginar. Eu não presto e não digo isto para teres peninha de mim. Eu não presto de verdade Vi. -Desviou o olhar, segurando as lágrimas. - Violet... eu fiz coisas horríveis e imperdoáveis. Eu roubei, usei drogas e trafiquei. Abusei de mulheres só pelo puro prazer do sexo agressivo... Alinhava com prostituas a troco de poder praticar fantasias que tenho nojo. Sou demasiado agressivo. Violet eu... Eu matei para comer e por ódio. Porque é algo que não controlo. 

Fiquei em completo silêncio. Não sabia o que dizer... A água caía agressivamente sobre a pele dele. Mesmo me tendo dito tudo aquilo, nada me fazia vê-lo de outra perspectiva que não a de um menino desamparado e meigo. 

-Fala por favor Vi.

Não falei. Não havia nada que pudesse dizer. 

-Isto é um segredo entre nós os dois. Nada do que me disseste vai sair da minha boca. Mas se queres que confie em ti vais me explicar exactamente a que é que te referes. - Não disse mais nada, apenas me inclinei e beijei-o até o sentir perder a força e deitar-se sobre mim, perdidos entre beijos no meio de um chuveiro gelado. 












Wicked GamesWhere stories live. Discover now