Somos todos pecadores

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— Até onde nós vamos assim? — reclamou Ronan. — Tínhamos combinado que cada um iria para o seu lado.

Ele estava amarrado pelos pulsos. Desirée puxava-o pela corda. Juntos, caminhavam por uma estrada de terra em direção à Paris. Não havia nada e nem ninguém, além deles dois, passando por ali.

— Mudei de ideia. Você será mais útil como escravo. Não acredito que seja capaz de seguir o que combinamos — menosprezou.

— Como tem coragem de escravizar o seu próprio sangue? — reclamou ele.

— A culpa é sua por ter se mostrado um péssimo assassino. Eu não confio na sua palavra e muito menos nas suas habilidades — disse ela, debochando. — Como escravo, ao menos me servirá de diversão. — Tateava o chão com uma bengala ao caminhar — Além do mais, o meu sangue não é como o seu.

— Olha, não que eu não tenha gostado daquela noite e não queira ficar com você outra vez, mas você não pode me arrastar para cima e para baixo assim. É muito humilhante. Além do mais, as pessoas vão desconfiar de você — ele explicou.

— Se eu te soltar, você vai fugir, sei disso. As suas chances acabaram — respondeu ela. — Além do mais, é difícil achar sexo por aqui. As pessoas desse lugar são muito covardes — desabafou.

— Eu definitivamente não acredito que isso esteja acontecendo comigo! — indignou-se Ronan.

— Ouça. Eu não me importo com o que você ou com o que as pessoas acham. Fique calado — afirmou categoricamente. — Você fala demais, eu não quero ter que cortar a sua língua.

— Ao menos me diga até onde vai me levar desse jeito — pediu Ronan.

— Como havia dito antes, eu morava por aqui. Estou procurando uma pessoa — comentou ela, um pouco antes de ouvir um barulho de carroça e pessoas caminhando na direção contrária.

Ronan puxou com força a corda para trás na intenção de arrastá-la para longe dali. Não queria ser visto daquela maneira pelos soldados do rei. Não queria ser motivo de chacota.

— Maldito! Então, você quer medir forças? — A mulher largou a bengala, deslizou os dedos pelo rosto por debaixo da faixa que cobria os olhos, manchando-os com sangue e então, desenhou um símbolo em forma de gancho no seu pulso direito, acompanhado de outras manchas espiraladas, uma linguagem deveras sinistra.

— Não me diga que você... — disse ele, um pouco antes de ser surpreendido com o tranco que ela deu ao puxá-lo com força para a estrada, jogando-o no esterco dos animais que passaram por ali minutos atrás.

Ronan se levantou rapidamente, limpando o rosto com as mangas da camisa.

— Me desculpe. Não foi a minha intenção — disse ela, rindo. — Mas a culpa foi sua, você dá trabalho demais.

Ela se voltou para estrada quando ouviu a respiração dos homens que estavam passando por ali observando parados para compreender o que tinha acabado de ver, curiosos. Desirée continuou a caminhar sem se importar.

— Eles são os médicos da praga — disse Ronan, sussurrando ao reconhecer o longo bico de suas máscaras e a roupa preta. — Provavelmente vieram para queimar o rastro de corpos que você deixou para trás.

— O que está acontecendo aqui? — perguntou um deles, com a voz abafada pela máscara metálica e roupas pretas. Uma voz assustadoramente mórbida.

— Vamos, Ronan — disse ela, sem se importar com a presença deles.

— Eu falei com vocês dois — repetiu o doutor.

Idílica MisantropiaOù les histoires vivent. Découvrez maintenant