2. Deficiência ♿

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  Logo amanheceu. Nem preguei os olhos essa noite pensando na minha entrevista. Ou será que o entrevistador não vai querer que eu faça uma, pois sou deficiente?
Meu pai me carrega da cadeira e me põe no banco do carro. O caminho foi em repleto silêncio, depois que minha sobrinha conversou com ele a respeito do meu psicológico, tinha vez que ele parava de me pressionar. Só que como não deixo barato, tenho prazer de esfregar em sua cara tudo aquilo que me fez passar.

Ao estacionar em frente ao enorme prédio, rapidamente os seguranças se prontificaram em me ajudar.
Subimos ao elevador e em seguida para a sala de espera, onde meu pai conversava com a secretária sobre minha entrevista. A ouvi dizer que meu horário é especial e isso já me deixou super nervoso.

Depois de alguns minutos entediantes, uma porta a nossa frente se abre, revelando um homem totalmente executivo. Ele era alto, cabelo grisalho e uma aparência simpática.

— Bom dia, sejam muito bem-vindos. — estende a mão para meu pai e depois para mim. — Estou muito feliz que aceitou a minha proposta.

— Obrigado por aceitar um deficiente. — sorri fraco e meu pai bufou, irritado.

— Deficiente seria eu se não o aceitasse. — me olha com compaixão. — Vamos? — pergunta e eu concordei. — O senhor aguarda aqui, enquanto eu faço a entrevista. — refere-se ao infeliz do meu pai.

O rapaz executivo me empurra até sua enorme sala. Sendo sincero: se a fisioterapia não me chamasse tanta atenção, escolheria ser um empresário de sucesso.

— Bom... — dá a volta pela mesa e senta em sua cadeira enorme e confortável. — Me desculpe por não ter me apresentado lá fora, meu nome é Patrick.

— Sem problemas. Joabe.

— Bom... — ajeita sua cadeira mais para frente. — Podemos começar? Quer uma água? Café?

— Disponha. Pode me dizer que não farei nenhuma entrevista. Sei muito bem que meu pai não acredita na minha capacidade e ele pode ter, sim, te subornado. — revirei os olhos.

— Eu percebi que ele não acredita em sua capacidade, mas não é por causa disso que não farei uma entrevista. Por que acha que seria diferente com você? — me olha sério. — Analisei seu currículo e gostei bastante dos cursos que fez quando era adolescente. Me surpreendi quando fiquei sabendo que trancou o curso de fisioterapia.

— Sim. Não tenho coragem de estudar algo que estou impossibilitado de viver. Não posso curar alguém sendo que estou machucado. — respondi, simples.

— Entendo, porém a sua capacidade não vem apenas de suas pernas. Me diga como foi sua experiência em seu antigo trabalho.

— Eu trabalhava como auxiliar de gerente de empresa telefônica. Fui efetivado depois de dois anos, fazendo estágio. Minha experiência foi muito incrível na área, pois minha mente foi aberta para pensar mais alto em relação ao mercado. Aprendi a ser ágil em solucionar problemas e não deixar as coisas para depois.

— Sei que essa pergunta não tem nada a ver com a entrevista, mas por que escolheu o curso de fisioterapia? — parecia muito interessado.

— Meu pai tem uma tese idiota de que todos os membros da família, homens, tem que seguir a carreira policial. Não queria matar ninguém, então me interessei por curar. Pensei em diversas áreas da medicina e fisioterapia foi a única que me abraçou. Há muitos anos atrás passei de frente a uma clínica de reabilitação... Sou louco por crianças e ver aquele garoto naquele estado, tentando recuperar o movimento das pernas... Ele me deu um "tchauzinho" e um sorriso. Parecendo que aquele sorriso queria dizer: "deficiência não é obstáculo para o sucesso". Nunca contei isso para ninguém.

O INCAPAZ - História de Joabe e NatalieOnde as histórias ganham vida. Descobre agora