Capítulo 14 - Nas Montanhas da Loucura

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— Quanto mais teremos que subir? — Bran veio ao meu encalço, arfando de cansaço. Pelo visto o garoto tinha garra. Eu estava errado sobre ele, talvez sobrevivesse mais do que eu imaginasse. Espero estar tão errado, quanto estive por subestimar Erwin.

Eu não o respondi, apenas continuei a subir. Não queria desanimá-lo e também não sabia o quão longe estávamos do topo da montanha. A neve ofuscava a minha visão, juntamente com a densa escuridão, fazia ser impossível enxergar dois palmos adiante.

Olhei para trás, e confesso que a visão não foi muito agradável. Todos estavam completamente derrotados pela escalada. E para piorar, o exército do rei cada vez mais perto de nós. Eles nos alcançariam se continuássemos no mesmo ritmo lento, mas isso era inevitável, visto que estavam descansados e bem alimentados, enquanto nós não.

— O garoto fez uma pergunta — Raed gritou de trás. Mal consegui ouvir a sua voz em meio ao barulho da nevasca. Eu continuei o ignorando. Acredito que ele não tenha gostado nadinha, mas também não tentaria retrucar. Estava sem fôlego até mesmo para implicar comigo. Eu não o julguei, afinal, todos estávamos no limite.

Alguns homens começaram a cair no meio da escalada. Eu apenas mandei que o deixassem, pois só iriam nos atrasar. Já eram homens mortos, se os levássemos estaríamos cavando nossa cova junto deles. Alguns foram relutantes em deixar seus companheiros para trás, já outros entendiam a gravidade da situação.

— C-c-o-m-mandante. — Bran batia o queixo e gaguejava de tanto frio. Seus lábios já roxos e pele totalmente sem cor. Mesmo assim, ele tomou força para continuar falando. — Não podemos deixar esses homens para trás. Já somos poucos, vamos morrer se nos alcançarem com um número tão pequeno de homens.

— Bran... — Parei de repente. Todos que vinham atrás de mim também pararam. Tomei fôlego para falar, embora já estivesse mais exausto do que todos esses homens. Não me leve a mal, não estou me vitimizando. Mas andar na neve, seguindo uma trilha feita por outros homens já é difícil, agora imagine abrir caminho por ela, fazendo a trilha para que outros sigam. Eu estava na frente guiando todos, por isso eu gastava o dobro de energia para andar em meio à neve que afundava a cada passo, congelando e encharcando meus pés. — Você ainda tem muito que aprender sobre a vida. Na verdade, sobre a morte — respondi.

Desci abrindo caminho entre meus homens, chegando até o moribundo que deixamos para trás. Estava caído na neve, totalmente entregue à exaustão, descansando como uma ovelha ao esperar ser sacrificada. Eu o segurei pela sua cota de couro e o olhei nos olhos. O homem parecia desvanecer, provavelmente já tinha desistido da própria vida.

— Se não levantar, certamente morrerá — disse a ele, mas o homem não tinha forças nem mesmo para me responder.

Eu o larguei na neve e continuei a subir. Bran correu para levantar o homem e o apoiou em seu ombro.

— Bran, largue ele! — ordenei ao garoto, que parecia relutante. Todos olhavam para a ação do garoto com um olhar de uma mistura de pena e empatia. — Ele só servirá para nos atrasar. Olhe para você mesmo. Não tem nem mesmo energia para se carregar, acha que pode carregá-lo até o topo? O próprio moribundo já desistiu de sua vida, não desperdice a sua com ele.

Bran me fitou com seu olhar lacrimejante por alguns segundos, em seguida largou o homem no chão. Ele se desculpou com o homem e seguiu subindo de cabeça baixa. Eu tinha dó do garoto, mas ele morreria por sua teimosia se eu não falasse nada.

— A partir de agora dobraremos o passo, ou não conseguiremos chegar ao topo antes de nos alcançarem — falei a todos, que me lançaram olhares desconfiados e sem esperanças. — Quem cair ficará para trás e servirá de obstáculo para o exército inimigo. Então lutem até o fim, ou suas sepulturas serão essas montanhas. — Me virei e continuei subindo rumo à escuridão daquele pico.

O Matador de Deuses - TenebrisWhere stories live. Discover now