Capítulo vinte e três

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Sim, ela estava dominada pela angustia e pelo desespero. Naquela manhã, sair da cama fora algo quase impossível. Seu cérebro ainda tentava processar tudo o que havia ouvido, mas não era algo realmente aceitável e ela não aceitou. Tentava ver tudo aquilo de uma forma clara, quem sabe positiva, mas até mesmo a pessoa mais organizada se perderia no meio de tanta bagunça que seus pensamentos acumulavam.

  Mas não importava como tudo aquilo parecia insano, cada palavra dita por Charles parecia preencher lacunas em branco que possuía em sua jornada na terra. Os pesadelos. As vozes. Visões. Sensações. Tudo pareceu fazer sentido após a narração do que parecia ser a história de um filme para adolescentes.

  Como era esperado, Anne não acreditava em uma única palavra dita por Charles. Ela, uma fada? Alguém que possuía outra vida e havia reencarnado? Era tão bizarro que chegava a soar engraçado. Mas tinha os novatos de sua cidade, sabia que estava conectada com eles e por bem ou por mal, somente a explicação de Charles parecia explicar muitas das coisas que estava acontecendo. Seu estado de negação era tanto que ela estava simplesmente tentando ignorar todos os sinais claros que o universo lhe dava.

  Depois de refletir e surtar mais vezes do que pretendia, resolveu continuar ignorando o assunto e o grande alerta vermelho bem diante de seu nariz. Ir na floresta após um sonho, já era prova o suficiente da presença do sobrenatural em sua vida, mas não estava pronta para aceitar que havia muito mais no mundo do que ela acreditou a vida toda. Mesmo que estivesse muito atordoada, continuava com medo de fuçar na história, ela não iria continuar ouvindo as vozes, iria simplesmente fingir que nada estava errado e que era absolutamente a mesma.

  Tirando forças sabe se lá de onde, conseguiu tocar sua vida, na manhã seguinte estava na escola como se nada de alarmante houvesse ocorrido. Estava desfilando pela cantina com a coluna ereta como sempre, tudo impecável não denunciando nada fora do lugar, seu dia estava razoavelmente tranquilo até que notou no centro da cantina sua melhor amiga sendo novamente motivo de chacota das garotas populares.

  - Aceitar ser traída é patético até mesmo para você. - Ela ouviu a voz forçada de Virgínia tentando atingir Zoe como sempre. - Eu não sei o quão desesperada você está para aceitar ficar ao lado de alguém como Daniel. Você é feinha e tudo o mais, mas... O cara da em cima da escola toda, acorda, esquisitona.

  - Você é uma mentirosa e está inventando isso tudo porque não pode ver ninguém feliz. - ela rebateu com o tom a altura mas sua amiga sabia o quanto estava se controlando para não chorar.

  - O que pensa que está fazendo? - Mesmo sempre prezando por sua paz e evitando ao máximo os conflitos, naquele Anne entraria com toda certeza e sem pensar duas vezes, mas antes dela sequer cogitar a ideia, uma garota alta, bonita e ousada tomou partido da situação, Zoe podia muito bem dar conta com sua língua afiada, mas a presença daquela menina era tão marcante que fez Virgínia e seu ninho de cobras recuar imediatamente. Cassandra era exatamente o tipo de garota que elas escolheriam para se aliar. Ela por sua vez não estava interessada em alianças.

  - Eu só estou dando um toque nela. De mulher para mulher, sabe? - Virgínia começou a mastigar de forma elegante um chiclete, ela era a figura feminina que a sociedade tanto gostava de enaltecer.

  - Não, eu não sei. - No inicio a patricinha começou a abrir um de seus sorrisos inocentes para Cassie, mas o fechou assim que percebeu que diferente da escola toda, ela não acreditava nela e não a idolatrava. - O que eu vejo aqui é exatamente o oposto. E eu vou lhe dar um "toque" de mulher para mulher, "seja o tipo de mulher que arruma a coroa da outra mulher sem mostrar ao mundo que estava torta" isso é ter empatia, o que você está fazendo é desumano e nojento. Se quer dizer algo para ZOE, existem milhões de palavras no dicionário que você pode usar para substituir esse seu vocabulário ofensivo. Você me faz sentir vergonha de ser mulher. Sinceramente? Em pleno século vinte um ainda pensa que apagar a luz da outra vai te fazer brilhar mais? É por isso que quando olho para garotas como você só consigo ver escuridão, sua lâmpada está queimada por conta de todo esse ódio que espalha no mundo, eu realmente tenho muito mais pena de você do que raiva.

(CONTINUAÇÃO) Encantada - O reino amaldiçoadoWhere stories live. Discover now