Gillian

Uma Festa

Para aqueles que desejam saber como foi a final do torneio sugiro que leiam os manuscritos da trovadora Anne, que foi louca o suficiente para contar a história de Robert. Ou talvez o maldito arrogante tenha pago à ela! *

Porque devo confessar que eu, fascinado por Jack, não prestava atenção em mais nada. Enquanto o torneio prosseguia ambos havíamos sentados a sombra de uma árvore, e ele me contava sua história.

Ele era um órfão e havia sido criado no mosteiro de Ball, próximo ao castelo de Locksley. Gostaria de ter conhecido os pais dele, mas também não se importava muito com isso. Sua infância fora feliz entre os monges e os livros da biblioteca do local.

Depois, contou-me de como Robert viera passar alguns dias no mosteiro, após ter se perdido na floresta com Marion, sobrevivido a um ataque de lobos e sido expulso de seu castelo. Eu abanava a cabeça e o fazia repetir a história.

— Lobos? Tem certeza? — Franzi a testa sem poder acreditar naquilo.

Jack assentiu. A seguir disse que Robert resolvera fugir do mosteiro e cair na estrada sem rumo e nem mesmo uma moeda. E  ele o acompanhara.

Eu abria e fechava a boca achando aquilo incrível. Com certeza o Locksley era maluco, mas ainda assim parte de mim o admirava, pois sempre quisera fazer o mesmo e jamais tivera coragem.

Enfim Jack silenciou e encarou-me com um olhar curioso.

— Só eu falei até agora... — comentou, fingindo um suspiro exagerado. — Por Cristo! Corro o risco de me tornar chato. Conte-me sobre você.

O pedido me pegou de surpresa. Eu parei imóvel, mantendo o rosto impassível enquanto as imagens do acidente de minha mãe, do ódio que sempre me acompanhara, e por fim, de Thiago, me assaltavam.

— Não tenho muito o que contar... — Torci os lábios em um sorriso falso. — Até agora tive uma vida de caçadas e festas. Bem entediante...

— Ahh... — Jack exclamou, decepcionado.

— Mas também gosto de livros — acrescentei rapidamente, desejando agradá-lo.

Jack era uma pessoa alegre e o calor da presença dele irradiava-se, aquecendo-me. Eu tinha uma desagradável tendência a melancolia e estar perto dele era como estar próximo ao calor de uma fogueira amistosa, fazendo-me esquecer das sombras ocultas em minha alma.

Ele sorriu. Eu sorri.

Repentinamente Robert surgiu, embora se mantivesse afastado alguns passos.

— Vamos, Jack! — chamou, fazendo um sinal para o amigo. Ele parecia apressado.

— Será que ele ganhou? — eu indaguei, levantando-me e dando a mão a Jack para ajudá-lo a fazer o mesmo.

Jack deu de ombros, sorriu de canto e, acenando em despedida, afastou-se.

Eu fiquei ali parado, observando os dois caminharem juntos, com os arcos e os sacos de flechas e de viagem pendurados aos ombros, e sumirem em meio às pessoas que lotavam o campo.

Será que o verei novamente?, indagava-me, ansioso, já decidido a procurá-lo em breve. Pode alguém amar duas pessoas ao mesmo tempo?, recriminava-me. Meu coração batia rápido e animado, e eu sabia que era por causa de Jack.

***

Na noite após o torneio havia uma festa no castelo em honra aos vencedores.

Archotes e candelabros iluminavam o salão e tapeçarias compridas com cenas de caçadas enfeitavam as paredes. Um grupo de menestréis tocava em cima de um tablado de madeira em um dos cantos.