A Carta

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Eu me distraía observando Jack, e quase dei um pulo de susto quando ouvi uma voz xingar em meu ouvido:

— Que merda! Era só o que faltava agora...

Era Thiago. De braços cruzados, ele me fuzilava com o olhar.

— Mas que modos são esses? —Arregalei os olhos, fingindo espanto. Acho que nunca ouvira Thiago falar um palavrão.

De braços cruzados, Thiago bufou e apontou com o queixo para Jack, entortando os lábios em sinal de desdém.

— Qual é o problema? — Suspirei com enfado e dei de ombros. — Não devemos ficar felizes por Jack?

— Sim... — Thiago grunhiu e resmungou. — Devo ficar feliz porque meu principal concorrente deixou de ser um órfão e virou o herdeiro de um dos feudos mais ricos da região...

— Você acha que isso faria alguma diferença para mim? — Cerrei o cenho, irritando-me com Thiago e seu maldito ciúmes. — Não iria gostar mais dele apenas por causa disso. Quem pensa que sou? Uma donzela em busca de um bom casamento?

A ideia pareceu diverti-lo. Ele sorriu de canto e coçou a cabeça com uma expressão pensativa.

— Será que você poderia exigir um dote numa situação dessas? Quer dizer, agora que foi deserdado, um dote poderia ser útil.

Isso me enfureceu. Eu sabia que ele me provocava como vingança por minha infidelidade. Coloquei a mão onde estaria o punho de minha espada se estivesse com uma e encarei Thiago de perto.

— Mais uma palavra e iremos duelar seriamente! — rugi.

Ele ergueu o queixo e me enfrentou.

De súbito, uma risada irônica cortou nossa discussão e meu capuz foi puxado violentamente para baixo.

— Essas fantasias de padre não me enganam... — Francis disse em tom irônico, olhando para mim e para Thiago. — Mas devem continuar a usá-las! Traidores como vocês não podem aparecer entre homens honrados.

Minha raiva se voltou para ele.

— Você pensa que ganhou, irmão... E que suas mentiras ficarão encobertas para sempre! — retruquei, estremecendo de tanto ódio. — Mas um dia...

— Um dia? — ele me interrompeu, erguendo uma sobrancelha com um olhar de sarcasmo. — Um dia, quando eu tomar posse dos dois condados, farei questão de que esteja assistindo. E você também deverá se ajoelhar diante de mim se não quiser ser morto.

Eu cerrei os punhos, preparando-me para pular em cima dele. No entanto, Thiago adivinhou minhas intenções e segurou-me pelo braço.

— Deixe-o! Não vale a pena! — pediu, puxando-me para trás.

O olhar de Francis desviou-se para Thiago. E depois, para mim de novo. Era um olhar perigoso e cruel, e parte de minha alma se entristeceu ao vê-lo no rosto de meu próprio irmão. Eu gostaria de amá-lo e realmente desejava que tivéssemos crescido como amigos. No fundo, achava que ele era desse jeito por minha culpa, porque se nossa mãe não houvesse morrido teríamos sido criados com amor. Então, Francis seria diferente.

— Não se esqueça da carta de perdão a Gawain — ele torceu os lábios em um sorriso ainda mais cruel do que o olhar. — Vou pedir a um mensageiro para levá-la amanhã cedo.

Depois, deu meia volta e se afastou rapidamente.

— Você não vai escrever essa carta! — Thiago protestou com veemência, apertando meu braço mais forte. — Seria humilhação demais!

GillianOnde histórias criam vida. Descubra agora