"Clichê amedrontador"

838 72 3
                                    

Era como estar em uma comédia romântica. Mas decaindo rapidamente para um filme de terror à medida que as cenas avançam.

Ele tinha um problema que somente seria resolvido se se casasse, logo a secretária é a primeira e única escolha plausível. E tudo por que me dou bem com Arthur e Maxwell, os filhos gêmeos do meu chefe.

Umas gracinhas de quatro anos cada. Dotados de uma língua afiada, observadores, e belos corredores, mesmo com suas perninhas curtas. As fofuras que faziam das minhas manhãs as mais animadas e loucas também.

Quando o CEO me pede para sentar e escutar suas razões por cinco minutos, eu não me recuso, mas conhecedora de todas as telenovelas mexicanas e séries asiáticas da Netflix, já imagino que nada bom pode sair dessa história.

— Deixa eu ver se entendi. — Pedi um momento, processando a informação. — Ingrid, a tia materna das crianças, quer a guarda dos meninos?

— Sim.

— E já tentou um acordo para compartilhar a guarda dos gêmeos com ela?

— Ela não está interessada realmente na guarda dos meninos, mas sim no que ganhará com a custódia dos dois.

— Quer dizer que se ela ficar com os gêmeos, têm direito a parte da empresa?

— Exatamente. E não posso deixar que isso aconteça. Ingrid é casada com um de meus concorrentes, se ela participar das reuniões da empresa, com o ódio que ela tem de mim, com toda a certeza ela irá revelar muitas informações ao marido.

— Isso afundaria completamente a companhia. — Digo, imaginando minhas chances de crescimento profissional indo ralo a baixo junto às ações da empresa.

Ele passa a me contar um pouco mais sobre a proposta. Já tinha assistido em primeira pessoa meu chefe convencer seus fornecedores, e acionistas a contratos extremamente desiguais em ganhos, apenas para seu lucro. Maurício De La Torre com toda a sua lábia saberia convencer até mesmo um astronauta que já esteve no espaço, de que a terra é plana. Era impressionante vê-lo em ação.

— Teria de se mudar pra cá. Seu trabalho seria o mesmo, mas você estaria mais presente para os meninos do que para mim no escritório. Preciso que o juiz veja que podemos ser bons pais e que temos uma união estável. Que não é necessário conceder a custódia também para Ingrid. — Ele dizia dando uma pausa para olhar algo no celular e logo voltando a mim. — Além disso concederei o que quiser em troca, é só me dizer. Pense também que poderá alugar seu apartamento pelo tempo em que morar aqui, e que economizará em transporte, gastos de mantimentos e até mesmo em lazer. Tudo o que precisar será coberto por mim.

— Eu não sou boa com mentiras. — Disse assim que pude.

E eu não era mesmo. O último segredo que guardei me causou tanto mal que peguei um certo trauma.

— Senhor, não me leve a mal, mas por que eu? Há tantas que aceitariam este papel sorrindo.

— Confio em você por que sei que não guarda segredos, por que gosta dos gêmeos tanto quanto eu, e principalmente por que minha família parece acreditar que estamos juntos antes mesmo de eu ter tido esta ideia. Eu não tive outra escolha melhor.

Em termos claros, eu era a única louca capaz de estar vulnerável ao controle dele. Por que por mais que quisesse ser séria, desde meu primeiro dia, o filho da puta pareceu pressentir minha fraqueza.
Eu podia omitir, mas não mentir e a qualquer pergunta eu entregaria tudo de bandeja. Quem melhor para ter sob controle do que uma jovem recém-formada sem experiência, ou seja, eu já não arranjaria outro emprego tão facilmente se não passasse da experiência neste, e por cima do desastre, eu tinha minha língua solta que sempre terminava me entregando.

— Tem razão, pareço a escolha mais óbvia. — Digo ao terminar de refletir.

— Se aceitar se casar comigo, eu…

— Por favor, pode parar de usar esta palavra? — Pedi o interrompendo.

— Que palavra? — Ele me olhava confuso.

— Sabe, essa aí… C, A, S, A, R. — Soletrei.

Me dava arrepios.
Nas novelas e nos dramas asiáticos parecia ser um máximo, mas pessoalmente, quando se convivia com uma pessoa tão estrita como meu chefe, não tinha nenhuma outra emoção envolvida além de medo e a convicção de que algo de errado não estava certo.

𝐕𝐢𝐯𝐞𝐧𝐝𝐨 𝐮𝐦 𝐝𝐨𝐜𝐞 𝐜𝐥𝐢𝐜𝐡𝐞̂ 𝐜𝐨𝐦 𝐨 𝐦𝐞𝐮 𝐜𝐡𝐞𝐟𝐞 - IncomplOnde histórias criam vida. Descubra agora